MALU (Parte#1)

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Depois de tanto tempo perdido com papo furado, o menino foi direto para a floresta. Toda região que antecedia o rio já estava conquistada, familiarizada e gravada por Gus. O garoto sonhava em cruzar aquelas águas cristalinas e conhecer o lado proibido. As plantas de lá o chamavam constantemente, sentiam sua presença e o exigiam por perto, Gus havia resistido bravamente...até agora.

Elas estavam desesperadas e o queriam ali, Gus tentou acalmá-las, tentou se comunicar à distância mas elas seguiam solicitando sua presença. A ansiedade que sentia do outro lado do rio era tão grande que sua curiosidade havia sido aguçada. Com passos hesitantes, Gus se dirigiu à parte proibida da floresta e cruzou o rio pulando por algumas pedras. Estava na zona proibida, mas não sentia medo, se sentia confortável e protegido. Começou a se enturmar, não podia estar mais feliz e completo. Uma plantinha vermelha lhe havia chamado a atenção, ele não podia vê-la, mas sentia que era especial, decidiu que iria encontrá-la, lhe parecia extremamente familiar. Gus a localizou indo em direção as enormes montanhas da esquerda e seu coração quase parou quando se aproximou mais. Antes que a pudesse ver já sabia por que lhe havia chamado tanto à atenção: tinha encontrado a família de sua querida planta, seu avô devia ter retirado dali a semente que lhe enviara de presente de aniversário. O menino estava radiante e pulava de alegria. A encontrou e a tocou com todo carinho e foi então que se deu conta: ele estava ali, mais feliz do que nunca e ela estava lá, sozinha, debaixo de sua cama, totalmente abandonada. Gus chorava forte. Ele sabia que havia sido egoísta em ficar, não tinha pensado o que passaria com sua querida amiga caso não retornasse. Se ele soubesse que teria a oportunidade de ficar, a teria levado consigo, mas nunca tinha passado pela sua cabeça que aquela maravilhosa reviravolta pudesse acontecer.

Ali em meio a tantas emoções, não percebeu quando as plantas começaram a avisar que algo estava mal. Foi só quando o perigo já estava muito perto que Gus sentiu o alerta. As plantas emitiam sinal de perigo por toda parte. O menino não sabia para onde ir, correu para a direita e o sinal ficou mais forte, decidiu dar meia volta e correr em direção ao rio, mas antes que o pudesse alcançar o alerta passou a vir das árvores e plantas de cima. Gus sentiu a sensação de perigo se intensificar e de tão forte o machucou. Sua cabeça latejava e o desespero começou a tomar conta da situação. De repente, de cima das árvores um enorme gorila caiu bem na sua frente. Gus não movia um músculo sequer e se congelou por completo. O gorila o encarava e respirava forte fazendo um barulho ameaçador com o nariz, estavam frente a frente. Sem saída, o garoto resolveu recorrer ás plantas, Gus emanava ameaça, tentava de todas as formas mostrar que não estava sozinho. As plantas responderam prontamente e se uniram a ele. O medo tomou conta do lugar, árvores, flores e plantas se tornaram mais densas e assustadoras, o gorila sentiu a mudança, ele cheirava a ameaça vinda das plantas, sentia na pele o ar mais pesado, ele podia ver o clima se fechando. A repentina alteração do ambiente fez o gigante hesitar, estava claramente assustado. Gus continuou enviando sinais de ameaça sem se mexer. Foram minutos em um duelo psicológico e quando Gus sentiu que já não aguentava mais, o grande gorila gritou de raiva e se afastou dali. Gus imediatamente disparou em direção ao rio e sentiu o alerta diminuir, porém foi apenas ao fechar a porta de casa que se lembrou de respirar.

Arthur levou um susto ao ver o neto ensopado se jogar no chão.

_Gus, o que aconteceu?

O menino não tinha condições de falar e, estendeu a mão pedindo paciência. O avô foi até a cozinha e lhe trouxe um copo de água, mas tampouco tinha fôlego para dar um gole. Aos poucos seus batimentos foram se normalizando e a respiração voltava a ser eficiente, já podia sentir o ar entrar e abastecer seu corpo. Virou o copo de água de uma só vez, agora já podia falar.

_Eu tava na floresta, as plantas me chamavam, eu fui, quando cheguei encontrei a família da planta que você me mandou, me lembrei dela, lembrei que a havia deixado e comecei a chorar, me sentia péssimo. Aquilo me doía tanto que não pude sentir quando ele se aproximou, elas me avisaram, mas quando dei ouvidos já era tarde.

_Do que está falando, menino?

_Um gorila, um enorme gorila pulou bem na minha frente.

_Que?! _O avô levou as mãos ao coração.

_Calma, vô, tá tudo bem, não aconteceu nada, elas me ajudaram.

_Elas quem?

_As plantas, juntos assustamos ele.

_Como, Gus?

_Parece que os animais podem sentir melhor as plantas do que vocês, eu fiz o ambiente se fechar, ele ficou com medo, sentiu a ameaça e foi embora com raiva.

_Não posso acreditar que o gorila cruzou o rio!

_Não foi ele quem cruzou..._falou Gus embaraçado.

_Gus!_gritou Arthur.

_Me desculpa, eu não imaginei que...

_Eu te avisei, você não sabe o perigo que correu...

_Na verdade, eu sei..._brincou o menino.

_Não seja insolente, eu deixei bem claro que não podia cruzar o rio!

_Eu sei, mas elas me chamavam e...

_Pois agora você prefere escutar às plantas ao seu avô? Você acha que elas sabem mais? Que elas sabem o que é melhor pra você?

_Claro que não, me desculpa, fica calmo.

_Seu pai me deixou responsável por você Gus, acho bom você começar a me fazer caso!

_Eu faço, vô.

_Não, eu te falei para não cruzar o rio e lá foi você. Eu falei: se enturma com o pessoal da tua idade e só te vejo falar com verde! Todos já comentam sobre o seu comportamento, dizem que você é estranho...

_Pois nós já estamos acostumados a isso, não é mesmo?

_Sim, Gus, mas precisamos nos relacionar com os outros, não é porque você pode falar com plantas que deve se restringir a isso, as pessoas também são interessantes.

_Eu não acho.

_Você nem ao menos tenta, como vai se interessar por alguém com tantos preconceitos na cabeça.

_Pois eu vi a maneira como eles te tratam, preconceito puro.

_Nem todos são assim e eu não quero que passe o mesmo com você, Gus.

_Que me importa, vô?

_Se não te importa o que os outros pensam, então pelo menos, leve em consideração o que eu penso. E eu acho que vai te fazer muito bem se relacionar com outras pessoas e não ser tão fechado assim. Além disso, você tem que me ajudar, Gus. A maioria das pessoas daqui me trata como retardado mental, mas você ainda pode se aproximar delas e conversar normalmente. Nós precisamos procurar os outros dons.

_Eu sei._concordou o menino com a parte dos dons.

_Você está tão encantado por essa floresta que se esqueceu da nossa missão. Enquanto você está lá se divertindo com as suas amiguinhas, se esquece que neste exato momento, a Floresta Real está morrendo. Com essa baixa, nos restam apenas quatro, temos que agir antes que seja tarde demais.

_Você tem razão, eu estou sendo egoísta, só estou pensando em mim e em como aumentar o meu dom, temos de nos concentrar na profecia. Me desculpa, vô.

_Isso é o que eu digo._Arthur seguia invocado.

_Assim que, só restam quatro florestas?

_Floresta Grande, Floresta Dourada, Floresta Viva e a nossa preciosa Floresta Alta.

_Eu vou tomar um banho, depois traçaremos uma estratégia. Eu vou te ajudar.

O Avô lhe sorriu por fora, mas por dentro era só preocupação, Gus estava por demais envolvido com a Alta.


A PROFECIA DOS TRÊSOnde histórias criam vida. Descubra agora