FLORESTA ALTA (Parte#3)

110 22 3
                                    

Gus engoliu em seco, toda água de seu corpo se concentrava em suas mãos frias. Todos estavam concentrados na sua pessoa, Gus era o único que olhava para a janela.

_Meu nome é Gustavo Bernardes, eu venho de Donário e estou aqui para cuidar do meu avô.

Depois de vomitar as palavras Gus correu para seu assento e dali não se levantou mais. Ele podia escutar os outros sussurrando e sabia muito bem que era a seu respeito. Passou o recreio na sala fingindo ler um livro, não queria ser perturbado. Foi só quando tocou o sinal que resolveu se mexer, arrumou suas coisas e saiu em disparada para a casa do avô.

_Como foi?

_Bem._Gus respondeu, deixou a mochila cair e foi direto para o quarto.

_Gus?

_Está tudo bem, só quero descansar um pouco.

De verdade estava muito cansado, era muito estressante estar rodeado por tantas pessoas. 15 minutos em seu quarto e seu nível de tensão já estava zerado novamente. Abriu a porta e foi até o avô.

_Queria ir na floresta, você me acompanha?

_Gus, por que não chama algum amigo pra ir com você?

_Vô, que amigo?

_Você não fez nenhum amigo na escola hoje?

_Claro que não. Se em 16 anos de escola em Donário eu não fiz amigos, você acha que em um dia aqui faria algum?

_Bom, com esse pensamento, claro que não.

_Você quer ir comigo?

_Não, Gus. Eu tenho que ajudar o Vikingo com a sua plantação, você não quer me acompanhar? Ele tem duas filhas da sua idade, Malu e Samara._ Arthur deu um pequeno tapinha na testa ao se lembrar_Mas que cabeça a minha, você já as conhece, elas são da sua sala.

_Eu passo.

_Mas Gus, é uma ótima oportunidade pra você se enturmar.

_Vô, justamente isso que eu quero fazer, me enturmar, por isso vou pra floresta. Nos vemos mais tarde.

Gus passou pelo caminho estreito, entrou na floresta e respirou aliviado. Essa era a sua família, seus amigos, sua casa. Ali se sentia livre e relaxado. Queria conhecer cada planta, cada flor e cada árvore do lugar, mas para isso tinha que aprender a se controlar, não podia se deixar levar, tinha que arrumar um jeito de bloquear os estímulos como um todo e se concentrar apenas no que desejava. Já havia conseguido no dia anterior, mas necessitava aprimorar sua técnica: queria poder se conectar mais facilmente com qualquer indivíduo sem ter que perder tanto tempo, buscava o contato imediato. Além disso, precisava encontrar uma maneira de se concentrar mais rapidamente e acima de tudo, tinha que vencer a desconfiança que elas emanavam por ele ser um humano. Estavam tão acostumadas a serem arrancadas, pisadas e mal tratadas que era difícil uma entrega total á solicitude de Gus.

As plantas eram magnificas e Gus as amava mais do que tudo, ele sabia que seu dom aumentaria cada vez mais com a prática e se determinou a ir todos os dias depois da escola para a floresta, mas sempre voltava antes do anoitecer.

E assim foram as semanas seguintes, das horas na escola mal podia se lembrar, mas seu tempo na floresta era precioso e memorável. Se lembrava de cada segundo passado ali, contava cada detalhe para o avô, já conhecia cada planta, folha, flor e árvore daquele lugar. 

 Gus mergulhava cada vez mais fundo no mundo em que se sentia confortável e se fechava cada vez mais para o mundo dos demais. Começava a poder sentir sensações diferentes, sensações que só um vegetal sentiria: sentia em sua pele o delicioso contato com o sol, ou a água fluindo por todo seu corpo, podia sentir as trocas gasosas, sentia a perda de uma flor, ou o germinar de uma semente, sentia o crescimento em seus próprios ossos e a dor de um arrancar nos seus músculos. Gus se comunicava cada vez mais fácil e já dominava a linguagem delas: os vegetais se manifestavam através de sensações, emanavam medo, ansiedade, felicidade, perigo e Gus ia captando cada um desses sinais. Também descobriu que cada flor possuía um aroma, uma rosa não era igual a outra e Gus as podia diferenciar, podia distinguir cada folha de uma árvore pelo olfato.

A PROFECIA DOS TRÊSOnde histórias criam vida. Descubra agora