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Alexandre a tirou do carro às pressas, mesmo quando os enfermeiros apareceram com maca e cadeira de rodas. Gritavam por ele quando entrou na emergência, mas não conseguia ouvir nada. Giovanna estava desmaiada e o seu medo era que algo pior tivesse acontecido no caminho para o hospital. Durante todo o trajeto, ele segurou a mão dela, ele tocou. Precisava sentir ela ali, com ele, em sua cabeça tinha certeza que segurando sua mão, poderia fazer ela ficar ali com ele, nessa vida.
Ele nunca sentiu tanto medo na vida.
Nunca.
— Senhor, senhora, deixa a gente levar ela. — o enfermeiro falou, tentando guiar Alexandre até uma maca.
— Ela... ela tava com muita febre, muita... sonolenta. — Alexandre apertou o corpo dela. — Eu trouxe ela para cá, mas ela desmaiou, ela...
— Senhor, deixa a gente levar agora!
Quando ele colocou Giovanna na maca a última coisa que percebeu era que ela estava muito pálida. Ele deu os dados para os enfermeiros, ao menos tudo o que ele sabia, e foi só quando um deles perguntou se ela usava algum medicamente que ele se tocou.
— Antidepressivo! Ela... ela estava usando, ela está em desmame, eu não sei... não sei o nome. — ele falou nervoso, ofegante.
O homem sumiu para a área restrita onde tinham levado Giovanna. Alexandre passou a mão pelo cabelo, pelo rosto, tentava se acalmar de alguma forma. Sentiu o olho arder e não fez nada para impedir quando a lágrima escorreu. Pegou o telefone e ligou para a única pessoa que podia acalmá-lo naquele momento.
— Mãe... — ele falou em tom choroso. — Mãe, a Giovanna...
Marta acariciava o cabelo do filho, que tinha a cabeça deitada em seu colo. Tinham pedido tanto por informações nas últimas horas que simplesmente desistiram e resolveram esperar, orar.
— Eu não sabia... ela aceitou o vinho tão bem, eu não fazia ideia. — ela ouviu o homem sussurrar de novo.
— Acho que nem ela imaginava, meu bem... Calma, vai ficar tudo bem...
— Por que tá demorando tanto? — ele falou agitado e Marta tratou de acalmá-lo de novo.
Alexandre sentou novamente, colocando a cabeça entre as mãos, apoiando os cotovelos nas pernas. Marta apoiou a cabeça no ombro do filho, continuando o carinho em seus cabelos. O silêncio entre eles fazia o coração dele ecoar, o desespero das últimas horas.
— Mãe, eu... nós... a gente estava começando a se dar bem, sabe? — Alexandre começou a falar de novo, dessa vez olhando para o nada. — É claro que ela ainda me detesta, mas... eu sentia no olhar dela... ela ia me dar outra chance, eu sei disso. Quando eu vi ela passando mal daquele jeito, com Benjamin chorando atrás de mim... mãe, eu imaginei uma vida sem ela, e foi insuportável.
Marta se surpreendeu pela declaração do filho. Ela já sabia de tudo isso, mas por que ele passou anos fugindo desse sentimento? Por que eles tinham que quase perder um ao outro para finalmente entenderem o que estava ali o tempo todo?
— Familiares de Giovanna Antonelli? — um médico chamou atenção da recepção.
Alexandre levantou as pressas, puxando a mãe logo em direção ao médico. Ansiosos, seguiram o doutor até a sala dele. O empresário colocou a mãe sentada na cadeira, mas preferiu ficar em pé, ou iria explodir.
— Como ela está? — Marta perguntou tentando manter a calma.
— Bem, estável. — o médico falou sorrindo. — Eu quero agradecer por terem informado que ela fazia uso de antidepressivos assim que lembravam, isso salvou a vida dela.
Alexandre sentiu o coração acelerar e o corpo gelar. Talvez ele precisasse de um remédio agora, já que parecia que ia cair a qualquer momento pelo alívio que sentia.
— Vocês a trouxeram rápido, assim que perceberam os sintomas e isso evitou que ela entrasse em coma.
— Foi tão sério assim? — Marta perguntou assustada.
— Eu conversei com a psiquiatra dela, a que está responsável pelo desmame, e ela me mandou uma cópia do esquema, ao que tudo indica, Giovanna confundiu os dias e acabou tomando a medicação ontem e hoje, ao invés de só tomar ontem, com isso, o uso do álcool hoje acabou fazendo esse grave efeito adverso que é o rebaixamento do nível de consciência, palidez...
— Ela teve febre. — Alexandre falou atento, não querendo que o médico deixasse qualquer coisa passar.
— Isso me deixou curioso, ela estava com alguma gripe ou resfriado?
— Não. — ele respondeu logo, puxando a memória dos últimos dias. — Não tinha nada.
— Algo que a deixasse com a imunidade baixa? Algum estresse?
Na hora, Marta se lembrou do acidente do filho e de como Giovanna tinha ficado transtornada. Isso, juntando com as prováveis conversas que a moça vinha tendo com seu filho...
— Meu filho sofreu um acidente há alguns dias, doutor. — Marta respondeu. — Giovanna ficou muito abalada, e tem cuidado dele também.
— Bom, talvez o corpo dela só esteja cansado e isso pode se manifestar de diversas formas. De qualquer formas, pedimos alguns exames para ver se achamos algum foco infeccioso.
Marta olhou para Alexandre e sorriu, tranquilizando. Ele limpou uma lágrima e sorriu para a mãe.
— Posso vê-la?
— Claro, ela está na observação, assim que acordar e estiver melhor, nós a liberamos.
Marta se despediu do filho e disse que iria ver o neto, acalmar o coração do menino. Alexandre seguiu o doutor até o box da observação. Quando entrou e a viu deitada, teve que parar por um instante. A realização de que esteve a um fio de perde-la o fez voltar a chorar. Se aproximou devagar da cama, arrumou o cabelo dela do jeito que sabia que ela gostava de tanto que a observou nos últimos dias.
— Que susto você me deu. — ele sussurrou como se ela pudesse ouvir.
Segurou a mão dela na sua.
Há quantos sentia falta daquele calor,
Apertou os olhos com força, sentiu algumas lágrimas escaparem.
— Meu Deus, Giovanna... que susto... eu pensei que...
Levou a mão dela até sua boca, beijou cada dedo, sentiu o cheiro dela. Estava tão distraído em senti-la que não percebeu quando ela acordou, só notou quando sentiu a mão dela fazendo força para sair do aperto dele. Olhou para ela e a viu confusa. Ele riu, limpando as lágrimas que ainda restavam. Não ligava que ela visse ele chorando, independente se ela ia achar ruim ou não.
— O que aconteceu? — ela perguntou ainda um pouco tonta.
— Você tomou o antidepressivo no dia errado... e eu te dei vinho. — deixou que ela raciocinasse sozinha.
Ela levou a mão ao rosto como se entendesse tudo.
— Merda... eu... droga, eu imagino o susto...
— O susto? Eu quase morri... Como você está se sentindo? — ele perguntou, tentando encostar nela de novo, mas vendo como ela tirou a mão quase sem perceber.
Giovanna o encarou por um tempo antes de responder.
— Como se um caminhão tivesse batido em mim. — ela repetiu a frase que ele lhe disse quando acordou do acidente.
Estava ali o olhar que Alexandre tinha dito para sua mãe, o olhar de quem estava para lhe dar uma segunda chance. Mas de novo, a sensação de quase perde-la era irreparável.
— Você quase morreu hoje, Giovanna. Por uma coisa besta, por minha causa. — ele falou sério.
— Eu que tomo remédio, Alexandre. — ela falou, rebatendo irritada. — Eu deveria ter me atentado.
— E eu sei que você toma remédio, eu deveria ter prestado atenção. Eu deveria ter prestado atenção em você. — ele sentiu o olho arder de novo.
Ela percebeu, mas não queria... Não estava pronto para vê-lo vulnerável, para vê-lo agir como se sempre tivesse se importando com ela. Era doloroso demais, e ainda tinha a sensação de que ele ia acordar um dia e voltar a ser o que era.
— Para. — ela pediu.
— Giovanna, eu...
— Para de falar, Alexandre. — ela repetiu.
Então ele fez o que ela não esperava. Ele implorou. Alexandre se inclinou, abaixou a cabeça até que encostasse na barriga dela. Giovanna olhou aquilo estática. Viu como o ombro dele se mexia, o movimento respiratório de uma pessoa que chorava. Alexandre estava chorando em seu colo. Ela fechou os olhos, tentando afastar as próprias lágrimas.
— Sai... — ela pediu.
— Me deixa... me deixa tocar você. — ele pediu.
Ele olhou para ela com os olhos vermelhos e implorou.
— Me deixa tocar você... para eu saber que você está aqui, viva, comigo...
Alexandre encostou as mãos nas pernas dela, apertando. Giovanna desconhecia esse toque, na verdade, não o reconhecia. Ela engoliu o próprio choro, pois não daria esse gosto. Esperou alguns segundos antes de se recompor.
— Vai... levanta... vai chamar um médico, eu quero ir para casa. — ele a olhou de novo e ela repetiu. — Agora, Alexandre.
O médico custou a libera-la. Queria esperar que o resultado dos exames estivesse pronto, mas Giovanna estava irredutível, Alexandre preferiu se manter em silêncio, não achava que estava no direito de falar nada depois do que aconteceu na observação. Quando finalmente Giovanna recebeu alta, a volta para casa foi feita em completo silêncio.
Da parte de Alexandre, esse silêncio vinha da vergonha e da dor absurdo que sentia no braço. Sabia que se abrisse a boca, ela saberia que tinha desobedecido ordens médicas. Da parte dela, o silêncio era pela sonolência que ainda ficaria pelo resto da noite.
Ao chegarem em casa, Benjamin veio correndo. Ele já estava de banho tomado e pijama, mas pela cara de Bethânia, deve ser feito o inferno para ficar acordado e esperar os adultos.
Giovanna o pegou nos braços e o abraçou com força. Ele ainda estava choroso e ela imagina o susto que ele levou.
— Mamãe está aqui... Desculpa pelo susto, meu bem. — ela beijou o rosto dele com carinho.
— Quero dormir com você. — ele disse contra o pescoço dela.
— Também quero dormir com você, bem agarradinha... Vai, pode subir que eu já vou.
Bethânia veio até ela e a abraçou. Alexandre se afastou nesse momento, indo até o aparador da sala, pegando alguma coisa entre os objetivos que costumavam largar ali.
— Que susto que você deu na gente, Giovanna.
— Desculpa, realmente foi um descuido meu, estava tão acostumada a tomar todo dia... e a Dra Ana tinha dito que nos dias que eu não tomasse o remédio poderia beber... enfim, acabei confundindo.
A atenção de Giovanna estava sobre Alexandre, que tinha pegado um comprimido para dor e ido para cozinha. Ela se lembrou do braço dele e de novo ele provavelmente tinha forçado nessas últimas horas.
— Quando Alexandre saiu com a senhora nos braços eu quase infartei. — Bethânia confirmou a teoria de Giovanna.
Quando a mulher se retirou para descansar, ela olhou para Alexandre. Ele tinha os olhos fixos em algum ponto do jardim. A porta que dava para a área externa estava aberta, e o lado de fora parecia bem interessante para ele.
— Não deveria ter forçado seu braço, devia ter pedido para um segurança me carregar.
Ele abafou uma risada e balançou a cabeça.
— Você não entende... eu quebraria todos os meus ossos por você.

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