Seis: pequenas descobertas

219 21 5
                                    

Felipe

Acordo com muita dor de cabeça. Convenço minha mãe a deixar eu faltar aula. Fico o dia inteiro deitado e jogando video-game. Estou me sentindo deprimente. Que saco.
Na hora do almoço, desço e como um pouco. Nem muita fome estava sentindo.
Mais tarde, já cansado de ficar deitado e jogar video-game, resolvo ir pra pista. Coloco uma bermuda, uma blusa simples e pego meu skate.

— Tchau, mãe. — digo abrindo a porta de casa.

— Tchau. Até mais tarde e divirta-se.

Vou de skate mesmo. Desde que cheguei aqui fiquei sabendo dessa pista. Comecei a ir semana passada.
Quando chego, encontro a última pessoa do mundo que imaginei que viria aqui.

— Ana? — chamo.

— Oi, Felipe. — diz sorrindo. Ela está usando um short jeans, uma blusa preta coma a palavra SWAG em dourado, uma blusa xadrez amarrada na cintura, All Star branco e seu gorro.

— Não sabia que você andava de skate.

— Eu gosto. Mas fazia um tempinho que não pegava no meu. Mas e você? Confesso que eu não te imaginava andando de skate.

— Sério? Por que não?

— Ah, sei lá. Achei que seu estilo fosse mais gibis, jogos e a sua câmera. — dou risada.

— É. Mas faz uns sete anos que eu ando.

— Ok, chega de papo... Vamos andar.

Começamos a andar pelas pistas. Fui direto nas grandes. Fiz várias manobras. Me soltei completamente. Olhei de relance pra Ana. Vi as manobras que ela fazia. Ela manda bem. Parei e sentei um pouco. Fiquei observando as pessoas. Ana se senta ao meu lado.

— Nossa. Você manda muito bem. — fala.

— Você também é boa.

— Tá a fim de um sorvete?

Para tudo. Ela está me chamando pra tomar sorvete?

— Er... Tudo bem.

— Ok. Quem perder a corrida paga.

— O que? Ei. Espera aí.

Ela pega o skate dela e sai correndo. Pego minha câmera que trouxe na bolsa e começo a filmá-la. Vou andando atrás dela. Faço uma manobra com meu skate e consigo alcança-lá. Vejo que ela está rindo. Desacelero um pouco e ela também. Quando ela para pra me olhar, acho que perde o equilíbrio. Não sei como, mas ela dá um escorregão e vem pra cima de mim, fazendo-nos cair na grama. Ela ri mais ainda.

— Desculpe. — diz rindo em cima de mim.

Nossos olhares se encontram. Ficamos nos olhando durante alguns segundos. Desço meu olhar involuntariamente para seus lábios.

— Então... Quem ganhou a corrida?— pergunto mudando o clima. Ela sai de cima de mim e se senta na grama ao meu lado.

— Eu. — diz sorrindo vitoriosa.

— Nada disso. Eu ia ganhar até você se jogar em cima de mim. — rebato.

— Iiiih. Me respeite, moleque. — dá um soquinho no meu braço.

— Sou cavalheiro. Faço essa honra.

Nos levantamos e fomos pra sorveteria. Conversamos sobre algumas bobagens.
Chegando lá, pegamos nossos sorvetes e nos sentamos em uma mesinha do lado de fora.

— Então, Felipe, como anda o filme? — pergunta.

— Estou fazendo umas edições aqui e ali. Mas está ficando interessante. — miro a câmera para seu rosto. — Diz aí, Ana, o que você está fazendo?

— Não tá vendo que eu to varrendo? — debocha. — Estou tomando sorvete, porque hoje foi uma tarde muito cansativa, sabe. — diz passando a mão na testa, o que me faz rir. Desligo e voltamos a conversar.

— Nossa. Olha a hora. Preciso ir. — diz se levantando. Não quero que ela vá. Mas não digo nada.

— Eu também vou indo. Até mais, Ana.

— Até, Fe. — me dá um beijo na bochecha e sai com seu skate.

Fico repassando nossa tarde de hoje. Ana está se tornando uma pessoa muito frequente em minha vida. Tão linda, engraçada, divertida... Balanço a cabeça e afasto esses pensamentos.

— Só posso estar ficando louco. — digo pra mim mesmo.

# # # # #

Chego em casa e vou tomar um banho. Desço pra cozinha e vejo minha mãe e Cris cozinhando juntas, rindo. Nem pareciam as mulheres tristes de uns meses atrás. Subo pro meu quarto e resolvo esperar pela janta. Estou passando pelo corredor, quando paro de frente pra sala. Giro a maçaneta e entro. Sento-me e encaro o piano. Respiro fundo algumas vezes. "Deixe o passado para trás".

Respiro fundo umas quatro vezes.

Começo a tocar.

Sinto meus ouvidos se enchendo com a música, a melodia. Toco como se nunca tivesse parado. Cada nota, cada som... Faz os pelos do meu corpo se arrepiarem. Deixo que uma lágrima caia. Sorrio, e continuo tocando.

Sei que é impossível, mas sinto como se meu pai estivesse aqui. Do meu lado. Tocando comigo.

Termino de tocar. Olho pra porta e vejo minha mãe e Cris ali paradas. Sorrindo e chorando. Cris vem até mim e se senta ao meu lado. Abraço-a.

— É um grande prazer ouvi-lo novamente. — diz sorrindo. — Nunca mais pare, Lipe. Por favor.

— Foi bom, peste. Como senti falta disso. — olho-a nos olhos. Sei que não devo e nem posso parar. — Eu te prometo. Não vou parar nem que me peça.

Nos levantamos e saímos da sala. Foi ótimo tocar novamente. Me senti vivo pela primeira vez em dois anos.
Jantamos e conversamos. Falei das filmagens com Ana, o que arrancou sorrisinhos do rosto das duas.
Terminamos de comer e fomos ver um filme. Preferi ir deitar.

Fito o teto. Ela me ajudou bastante de certa forma. Devo isso à ela.

— Obrigado, Ana. — sussurro.

Apaixonados Pelo AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora