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Amélia Lorenzi

1 ano depois

Tudo tinha corrido ao contrário daquilo que era previsto, era suposto eu ficar na África durante seis meses e depois voltar, mas acabei ficando mais seis meses para ajudar a estabelecer melhores condições nos hospitais. Por ser uma das enfermeiras mais bem sucedidas da missão, tive o prazer de puder ajudar e ensinar muitos outros estudantes de enfermagem aqui na África. 

Vou admitir que fiquei super contente quando disseram finalmente que eu podia voltar para casa, era um sonho. Claro que esta tinha sido de certeza a experiência da minha vida mas também me deixou completamente cansada mentalmente e exausta. 

Todos os dias agradeço por ter conseguido sobreviver ao surto e por ter ajudado a extingui-lo, por agora, desse país porém muitas outras vidas foram perdidas e isso é o lado mau de toda a bonança que chegou depois da tempestade. 

Se eu voltaria a fazer isso? Nunca. 

Tinha sofrido danos mentais que nunca mais iriam ser recuperados, tinha visto mais pessoas a morrer do que aquelas que eu pensei que algum dia veria. Vi todos os companheiros da minha primeira equipa morrer e apenas eu a sobreviver. 

Todos os dias me pergunto se foi justo, porquê eles e não eu? Porque eu tinha sido a única a sobreviver de uma equipa de 10 médicos e enfermeiros? Porque tinha que ser eu a única a ficar com saudades deles, a lembrar dos sorrisos deles ao lembrar das suas famílias e na possibilidade de voltar para casa, das histórias deles, dos momentos que compartilhamos, dos medos que eles próprios sentiam? Porque é que tinha que ser eu? 

Realmente à muita coisa que parece inexplicável, mas eu acho que há sempre uma razão para tudo. 

Estava chegando ao fim a cerimônia de agradecimento que a ONG preparou para todos os que vieram ajudar e meus olhos se enchiam de lágrimas ao ver os tributos feitos a todos aqueles que tinham falecido por simplesmente serem altruístas ao ponto de não se importar em morrer para poder salvar os outros. Eu não conseguia por em palavras tudo o que eu tinha sentido, era uma carga emocional muito grande. Tenho a certeza que como em muitas noites que já passaram eu irei sonhar com os episódios mais grotescos daquilo que se tinha passado.

No fim todos os organizadores nos entregaram os nossos pertences e nossos celulares, eu já nem sabia o que era mexer num e muito menos me fazia falta alguma. Mas eu estava ansiosa para voltar casa, mostrar para as pessoas que eu amo que ainda estou viva. 

Me odiava por ter que fazer passar pela incerteza aqueles que eu amo, mas se fosse de outra maneira eu não iria aguentar.  Sabia que meus pais iriam fazer de tudo para que eu voltasse e sei também que no momento em que Charles descobrisse onde eu estava ele pegaria um avião, sem pensar em nada, e viria até aqui para me levar com ele. Sei o quanto Charles consegue ser teimoso. 

Não houve um único dia nesse ano inteiro em que eu não pensei em Charles, para dizer a verdade muitas vezes as minhas memórias com ele, as nossas brigas quando ele tava bebâdo, por exemplo, foram aquelas que me fizeram continuar e não desistir.

E quanto às mágoas que e elas já passaram, apesar de eu ter demorado a esquecer, mas agora eu daria tudo para poder estar nos braços dele. Me pegava muitas às vezes à noite a perguntar se ele ainda esperava por mim ou se quando eu chegasse ele iria lutar por mim como disse no nosso último encontro. 

Por esta altura uma nova temporada iria começar e eu me perguntava quem terá sido o vencedor da última temporada. Talvez Max? Ficaria muito contente se fosse ele, mas algo me diz que o meu menino conseguiu aquilo que ele sempre quis, o maior sonho dele. Mesmo longe e com oceanos a nos separarem eu sempre estive do lado dele (nem que fosse no pensamento) e torcendo por ele. 

(...)

Sorrio e não contenho as lágrimas quando o avião pousa no aeroporto de Mónaco, não via a hora de poder colocar os meus pés no meu mundo e na minha realidade. Poder ver novamente todo o luxo de Mónaco, aquele que não é visto em lado nenhum da África. 

Queria apreciar a minha cidade, os prédios, os jardins bem cuidados, tomar um café e ficar horas a ler na cafetaria, sair à noite com os meus amigos. Tenho a certeza que depois de um ano inteiro sem tocar no álcool eu tenho a certeza que a minha resistência é nula, qualquer coisa vai fazer eu ficar bebinha. 

Quando saímos do avião, somos surpreendidos por uma imensidão de pessoas que nos aplaudem como se nós fossemos heroís. Nós estavamos longe de o ser, não salvámos a vida de ninguém por muito que o quisessemos. 

Depois de passarmos por tudo aquilo, procuro um uber para me levar a casa dos meus pais. Apesar de ter saudades imensas de Charles, as saudades que eu sentia dos meus pais faziam o meu coraçãozinho doer. Muitas vezes chorei sozinha no meu canto porque tudo o que eu queria era um abraço da minha mãe ou as palavras sábias do meu pai. 

Quando para na frente da residência dos meus pais, saio rapidamente do uber e quase corro até chegar à porta. Toco duas vezes e espero alguém abrir, eu estava ansiosa. 

-Pois não? -ouço a voz da minha mãe ao abrir a porta e automaticamente começo a chorar. -Não me acredito. 

Olho para minha mãe com os olhos embaciados, ela logo corre até mim e me abraça com força. Choro que nem uma criança, eu realmente tinha sentido falta daqueles abraços e daquele cheirinho de casa. 

-Minha menina. -diz enquanto passa a mão no meu rosto para verificar se eu estou intacta. -Que saudades que eu tive de ti. -diz e volta a me abraçar. 

Até agora eu só chorava, sim eu sou muito chorona. Quando já estava melhor pergunto pelo meu pai e minha mãe me diz que ele ainda estava no trabalho. Sinto alguém tocar nas minhas pernas e quando olho para baixo vejo a minha irmãzinha, de quatro anos.Ela sorria para mim e eu pego nela, agora já não chorava mas a vontade continuava cá, minha irmã tinha crescido tanto num ano. 

-Minha Nini. -digo e abraço ela com força. 

-Lia. -diz enquanto passa a mão no meu rosto. 

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Por hoje é isso. 

Uma pergunta nada a ver, qual é a vossa série preferida?

A minha é The Walking Dead. 

𝐓𝐡𝐞 𝐎𝐭𝐡𝐞𝐫 𝐖𝐨𝐦𝐚𝐧 ➤ 𝗖𝗵𝗮𝗿𝗹𝗲𝘀 𝗟𝗲𝗰𝗹𝗲𝗿𝗰Onde histórias criam vida. Descubra agora