Capítulo 4 - Confrontos pretéritos

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CONCLUÍ A LEITURA POR ENTRE as páginas amareladas daquele diário enojada e encimei o volume ao lado dos demais no tampo em ranhuras da escrivaninha de Costel. A maneira como Dumitri descrevia os seus, na época, recém-adquiridos dons vampirescos e a forma como ele estava aprendendo a desenvolver o seu poder de indução psíquica me incomodava particularmente.

No início de tudo, eu mesma tinha sido vítima daquela habilidade hipnótica. Presa em seu castelo, jazia faminta e desesperada, enquanto ele me alimentava noite após noite. Me fortalecendo. Me engordando. Tudo para que, no fim das contas, eu me tornasse uma presa mais vistosa e vigorosa a seus anseios sádicos.

O velho vampiro, em sua aparência decrépita, me paralisou com os seus dons hipnóticos e, em seguida, me violentou, pouco antes de me transformar em sua semelhante. Uma moroi, impregnada do seu poderoso e amaldiçoado sangue.

Costel percebeu o meu desconforto ainda sentado em sua poltrona atrás da mesa de carvalho. Interrompeu a leitura que fazia de um tomo antigo que falava sobre misticismo celta, depois, me convidou para acompanhá-lo ao hall que antecedia o escritório.

Caminhamos juntos em direção a uma das várias sacadas que circundavam o castelo e, segura pelo peitoril marmorizado, pude vislumbrar a paisagem noturna da cidade. Uma vegetação muito densa circundava o território onde o castelo havia sido erguido, mas dali, era possível enxergar boa parte do território da Transilvânia, bem como as luzes pululantes do seu centro comercial.

— Você não me contou como foi o passeio com a Alex até Timisoara ontem. Correu tudo bem?

Eu não precisei verbalizar para que ele percebesse a minha profunda irritação.

— O Jean-Paul me contou que ela se trancou em seu aposento desde que retornou da rua. Tem ouvido na vitrola os discos novos que lhe comprei desse barulho que chamam de "Rock And Roll" quase sem parar. Parece bastante chateada!

Me virei para encará-lo mais de perto.

— A minha filha tem demonstrado um profundo ressentimento a meu respeito desde que nos reencontramos, Costel. Seja lá o que tenha botado em sua cabeça nesse período em que estivemos afastadas, funcionou perfeitamente. A Alex me odeia!

Ele se inclinou em direção ao peitoril e apoiou os cotovelos. Manteve a sua postura curvada conforme observava a paisagem à nossa frente.

— Ela não a odeia, minha irmã — disse, com o tom de voz calmo. — A Alex sabe muito bem que você não pretendia se manter afastada por todos esses anos. Eu contei à menina tudo que lhe aconteceu desde o seu rapto em Vaucluse. Me certifiquei que ela não guardasse rancor da mãe apesar da sua distância. Expliquei que você estava ocupada caçando bruxos, salvando o mundo. Ela só não entende porque demorou tanto para nos visitar.

— Ora, seu manipulador sujo! — Tinha conseguido me manter calma até ali, mas o ressentimento explodiu repentinamente em uma só frase. — Foi você quem me convenceu de que nada mais podia ser feito por Alex, quando a encontrei no interior daquele caixão, diante da figura nefasta de Dumitri. Eu não conseguia captar nenhum sinal de vida em seu corpo. Ela estava fria, paralisada. No momento em que vi a marca de mordida em seu pescoço, eu soube imediatamente que ela tinha sido vítima da ira de nosso mentor. Ele queria me punir, e eu não era tola de acreditar que o desgraçado não seria capaz de me arrancar aquilo que eu mais prezava na vida... a minha filha!

— E você estava certa — respondeu ele, desviando seus olhos gélidos na minha direção. — A Alex estava realmente morta quando você a encontrou naquela sala do castelo de Dumitri. O que te falei pouco antes do nosso entrevero físico não foi nenhuma mentira. Nem mesmo o sangue do nosso velho mestre seria capaz de ressuscitá-la àquela altura dos fatos. Ele quis mesmo te punir matando a sua filha e conseguiu.

Alina e o Concílio de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora