Capítulo 26 - Cerceada

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AS FOTOGRAFIAS DE COSTEL e Yuliya permaneciam espalhadas sobre o tampo de carvalho enquanto eu era interpelada por três das quatro figuras a circundarem a mesa da sala de reuniões. Cassandra era uma mulher extremamente linda e asseada, mas tal qual um bibelô de rara beleza, permaneceu a maior parte do tempo muda, sentada ao lado do marido.

Enquanto isso, Lucien, Mael e Adela me faziam uma pergunta atrás da outra a respeito do paradeiro de meu irmão, e os detalhes sobre a última vez que eu havia me encontrado com ele.

— Fui atraída a Montbéliard para conseguir respostas, e tudo que têm feito desde que cheguei aqui é me encher com ainda mais perguntas. Há mais de um ano que eu procuro pelo paradeiro de Costel. Eu também não sei onde encontrá-lo. Afinal, o que vocês querem com ele?

Durante a sabatina, eu havia ocultado o fato de que meu irmão agora era um demônio, e que os seus dons vampíricos estavam sendo usados no intuito de que os portões do inferno fossem abertos e uma legião de criaturas malignas invadissem o plano terreno. Eu não queria revelar àqueles estranhos a minha recente parceria com um anjo, nem tampouco dar a eles informações que eu mesma ainda não tinha digerido muito bem. Entreguei apenas a parte superficial de toda a história, e o restante mantive guardado no fundo da minha mente, torcendo para que nenhum daqueles desgraçados fosse um telepata.

— O seu irmão é um vampiro e, como tal, ele precisa ser responsabilizado por seus atos junto aos demais da sua espécie — Mael D'Aramitz era um sujeito magro e de aparência frágil, mas o seu tom de voz soava mordaz sempre que o elevava. Era francês como Lucien, mas descendia de outro ponto do país, da cidade de Strasbourg.

— A que atos você se refere? O que Costel fez e por que querem responsabilizá-lo?

Nenhum deles respondeu à pergunta. Em vez disso, Adela observou:

— Do final da Crise de 1929 até o início da Segunda Guerra Mundial, nós ouvimos inúmeros relatos de uma célula de contra-ocultistas que estava agindo em vários pontos da Europa e América Central. Até certo ponto, nós ignoramos a sua existência, até que as suas ações começaram a envolver diretamente os nossos clãs.

Adela possuía uma voz anasalada e seu sotaque irlandês era bastante carregado. Por vezes, era difícil até mesmo compreender a sua pronúncia. Porém, mesmo sem meu entendimento completo às suas palavras, eu sabia ao que ela estava se referindo.

— Começou com a morte de um dos nossos em Eindhoven, em 1934, depois foi um ataque a um dos ninhos em Budapeste em 1935 e, finalmente, a liberação de um menino-vampiro em Madri, em 1937. Todas essas ações foram praticadas por um referido grupo de pessoas denominado "A Teia". Atingindo diretamente o nosso povo, afetando o Concílio de Sangue.

Os olhos castanhos claros da moça ruiva cintilavam em minha direção de maneira acusatória, mas foi de Mael a conclusão:

— Nós não sabíamos na época, mas os boatos que corriam pelos becos de todas as cidades que haviam hospedado a Teia eram de que havia uma vampira muito habilidosa em meio a esses contra-ocultistas, e que ela estava ajudando os amigos humanos a exterminar seus semelhantes vampiros. — Mael me fitava tal qual Adela, me incriminando. — A descrição da vampira bate em tudo com a sua, senhorita Alina. Cabelos longos e negros. Olhos azuis brilhantes. Corpo esguio. Ágil.

Eu não podia negar o que tinha feito no passado ao lado da Teia, e não me envergonhava de meus atos. Expliquei isso a eles:

— Na época, estávamos enfrentando uma seita que usava de magia negra para dominar a vontade de outros seres. Essa Ordo Ignis Veni, ou Ordem do Portal de Fogo, estava fazendo experimentos para controlar a mente de vampiros e torná-los escravos. Para muitos deles não havia salvação. Uma vez controlados, a hipnose não podia ser revertida. Nós tínhamos que destruí-los.

Fez-se silêncio no recinto. Os quatro me observavam como que avaliando a minha resposta e decidindo secretamente se acreditavam ou não nas minhas palavras.

— Essa seita capturava especificamente os de nossa espécie para tais experimentos? — indagou Lucien, sentado à cadeira mais ao centro da sala. Anuí à sua pergunta.

— O menino em Madri tinha sido afetado mentalmente em um grau menos elevado, por isso, um de nossos professores em artes arcanas conseguiu libertá-lo do controle. Todos os outros estavam além dessa salvação. Pareciam mais feras do que vampiros. Não raciocinavam ou mesmo articulavam palavras. Eram um perigo não só para os de sua própria espécie, mas para todas as demais.

— Quando soube que uma de nós estava agindo ao lado de humanos com o intuito de caçar vampiros, eu despendi esforços para encontrá-la e contatá-la, mas o início da Segunda Guerra acabou atrapalhando os meus planos — Mael tinha assumido uma postura menos agressiva em seu assento, e seu tom agora era mais polido. — Naquela época nós ainda não sabíamos quem você era ou o que pretendia, mas sabíamos que seria um membro valoroso a nosso clã por conta de suas habilidades singulares.

Deixei escapar um riso carregado de ironia. Adela demonstrou irritação.

— Você não parece acreditar no papel que o Concílio desempenha junto à comunidade vampira, Alina. Ainda acha que pode viver sozinha, sendo caçada e perseguida por todos que a enxergam como um monstro? — Lucien estava tentando me convencer a fazer parte do seu conselho deliberativo, mas tudo em que eu conseguia pensar era em pegar Alex e tirar a minha filha de perto daquela gente o mais depressa possível.

— Nós vivemos em um mundo que nos odeia e que nos oprime. O vampiro que optar pela solidão acabará morto com uma estaca no coração ou desfeito em água benta. Há um espaço em meu Concílio para você, Alina. Nos ajude a encontrar o seu irmão e nós também podemos fazer dele um membro do nosso clã.

Lucien não tinha feito qualquer menção à Alex ou a um lugar para ela em seu clube. Foi naquele momento que o meu sexto sentido se atinou e eu comecei a procurar sinais psíquicos de minha filha pela casa desesperadamente.

Eles sabem o que aconteceu em West Ham. Lucien e seu bando sabem que Alex não é totalmente vampira. Eles não pretendem deixá-la sair viva dessa maldita mansão. Eles me atraíram aqui para capturá-la!

Naquele instante, eu me levantei abruptamente da cadeira e os quatro se sobressaltaram.

— Vocês querem a Alex. Foi por isso que me trouxeram até aqui. Não foi por causa do Costel ou de mim, mas pela minha filha.

Nenhum deles negou a minha suspeita. Lucien, Mael e Adela se levantaram de seus assentos sem me perder de vista, mas foi de Cassandra a sugestão:

— Sua filha vai ficar bem, Alina, tente se acalmar. Por que não vamos até a sala de estar e tentamos arejar melhor as nossas ideias?

A mulher de cabelos claros tentou tocar o meu ombro, mas, instintivamente, eu a evitei. Corri até a maçaneta da porta e a abri com tudo, arrancando seu ferrolho. Tinha memorizado o caminho feito até a sala de reuniões e retornei para o hall de entrada. Quando cheguei, eles já estavam me esperando, em alerta. De um lado da sala, Arnaud e Randolph, enfileirados com mais cinco vampiros de seu bando; do outro, Reece Grealish com Alex desacordada em seus braços.

— Alex! O que você fez com a minha filha?

Eu retesei os músculos das pernas para saltar em direção ao grandalhão loiro, mas o meu impulso foi detido por algo firme que se prendeu em meu tornozelo e me atirou contra o chão. Quando me voltei para a direção em que estava antes, enxerguei Lucien a me observar. Logo atrás dele vinham Mael, Adela e Cassandra. Todos contra mim.

— O que significa tudo isso? O que vocês querem com a minha filha?

Lucien fez um gesto de cabeça em direção a Arnaud e os outros. Fui colocada novamente de pé por três deles, e tive meus braços presos para trás do corpo. Gritei mais uma vez em direção à Alex, mas ela não respondia. Parecia desmaiada. Talvez morta.

Não, de novo não! De novo não, por favor!

Alina e o Concílio de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora