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PEGUEI UMA COLHERADA GENEROSA do meu sorvete de menta com chocolate e fechei os olhos para saborear a doçura cremosa se espalhando pela minha língua.

— Eu avisei sobre o sorvete — Hyunjin disse. — Ouvi dizer que já fundaram religiões por causa disto aqui.

Além das lagostas, Hyunjin me dissera que a região também era famosa pelo sorvete. Logo vi por quê.

— Este sorvete era uma das coisas de que eu mais sentia saudade quando estava na faculdade. Assistir aos jogos com meu pai era outra. Quer dizer, eu podia assistir com qualquer um, mas era sempre mais divertido com ele. O cheiro da minha mãe… — Ele fez uma pausa e balançou a cabeça. — É estranho tudo o que está contido na sensação de estar em casa. E é estranho ter que mudar isso.

Quis gritar que sabia exatamente o que ele queria dizer. Que às vezes as coisas que nos davam a sensação de estar em casa nem eram coisas de que gostávamos. Que eu estava cansada da pele fria e do sal. Que tinha visto novos irmãos virem e irem embora ao longo das décadas, e isso tornava difícil prever como seria o futuro da nossa pequena família. Então era impossível ficar confortável por muito tempo em qualquer lugar.

— Como é a sua casa? — ele perguntou.

Revirei a memória, tentando encontrar um lugar onde eu realmente me sentisse em casa. Por mais tempo que tivéssemos passado numa região, por mais cidades que tivéssemos visitado, nenhum lugar fazia eu me sentir segura.

Dei de ombros e enfiei a colher no sorvete. Eu lembrava de muita coisa, mas lar não era algo que eu pudesse definir.

— Tudo bem se você não quiser falar sobre isso. Um dia você vai construir novas lembranças, um novo lar — ele disse de maneira triste, mas ao mesmo tempo reconfortante. — Nós dois vamos.

Não queria me deixar levar pela sinceridade na voz dele, pela generosidade do seu olhar que prometia que todos os cacos da minha vida seriam unidos novamente. Era difícil resistir, e acabei cedendo.

Eu observava aquele garoto despretensioso, sereno, e pensava que ele não fazia ideia do quanto era extraordinário. Você me passa tanta segurança, pensei.

— Então, há muitas outras lojas para visitarmos por aqui, ou podemos voltar para Port Clyde — Hyunjin disse, conferindo as horas no celular. — Ben deve estar quase terminando o trabalho, e Julie só tinha uma cliente.

Franzi a testa.

— Ela é cabeleireira e maquiadora. Não tem uma clientela gigantesca na cidade, mas está disposta a viajar e é boa no que faz. Quase sempre tem alguma cliente. Hoje era um casamento, e quando há outros eventos formais, tipo festas de boas-vindas e coisa assim, ela está sempre ocupada — Hyunjin explicou. Depois, mordeu a bochecha e fez uma careta. — Às vezes ela faz testes em Ben e em mim.

Sorri ao imaginar os dois de sombra e blush.

Hyunjin pegou o celular e passou o dedo na tela.

— Aqui era um tipo de máscara hidratante.

Ele me mostrou uma foto dele e de Ben com uma meleca verde espalhada no rosto. Ben estava com uma cerveja na mão, e Hyunjin com um copo de leite. Posaram brindando, fazendo careta.

Precisei tapar a boca para conter o riso.

— Considere isso um sinal do quanto confio em você. Ninguém nunca viu essa foto. Só guardei para o caso de precisar chantagear Ben algum dia.

Batuquei com os dedos na mesa; o tá-tá-tá era o mais perto que eu podia chegar de soltar uma gargalhada.

Ele riu do som, olhou a foto de novo e balançou a cabeça.

A Sereia - hyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora