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UMA PROPRIEDADE ABANDONADA NUMA ILHA DA COSTA DA ITÁLIA.

Um casebre perto de um pesqueiro no México.

Um apartamento alugado na península Olímpica.

Nomes diferentes para o mesmo lugar.

Quatro locais em sete meses foi demais para nós. Embora Minho tivesse sido o motivo da primeira mudança, dava para ver que meus irmãos haviam decidido que eu precisava de espaço, de um lugar onde podia falar sem me preocupar se outros estavam ouvindo. Deve ter sido Jisung quem incentivou as mudanças para paisagens pacíficas e isoladas. Meus irmãos esperavam que a mudança de ares acabasse com a minha depressão. E embora eu agradecesse o gesto, nada do que eles fizessem me ajudava.

Assim que eu fosse capaz, iria morar sozinho, não importava onde. Estava cansado de tentar ser alguém que eu não era, e cansado de me sentir um fardo para meus irmãos, além de todo o peso dos meus próprios sentimentos.

A nossa moradia da vez era um casarão numa encosta coberta de grama que dava para um caminho de pedras arredondadas e depois para a Água. Apenas uma estrada de terra bem gasta conduzia até a casa isolada. Se precisássemos chegar a algum lugar, levaríamos uns bons trinta minutos.

Meus irmãos escolheram bem. A possibilidade de falar ao ar livre me fez bem, embora não pudesse curar a saudade de Hyunjin ou a dor pela minha punição. A Água tentava falar comigo, mas eu A ignorava com a satisfação amarga de que Ela não me ouviria se eu permanecesse em terra. Em vez de conversar com Ela, passava horas vendo pássaros enormes mergulharem para buscar comida e ouvindo o som do vento que abria caminho pelas árvores.

Aquilo não me trazia nenhuma alegria. De fato, eu não tivera nenhum motivo para rir desde que saíra de perto de Hyunjin. A única coisa que me arrancou um riso baixo foi uma sensação extraordinária na minha perna.

Coceira.

Fiquei hipnotizado pelo calor irritante na batata da perna. Olhei bem para o lugar da coceira, levemente rosado, o que também era estranho — nossa pele geralmente era imutável e invulnerável como todo o resto do corpo —, mas agradeci.

Dentre todas as comidas exóticas e lugares belos que conheci, de todas as distrações e aventuras vividas, aquela novidade minúscula me fez pensar que parte de mim ainda era humano.

— Felix?

Olhei para trás e deparei com Jeongin me oferecendo uma xícara de chá. Permaneci sentado numa pedra, pensando em como estávamos separadas da Água e, ao mesmo tempo, cercadas por Ela. Já A tinha visto de tantos jeitos: impassível como uma rocha, impaciente como uma criança, animada como uma festa… Naquele momento, Ela só podia ser uma inimiga para mim.

— Quer ajuda para pensar? — Jeongin perguntou ao sentar ao meu lado.

— Se eu conseguisse organizar o que se passa na minha cabeça, te contaria.

Jeongin sorriu e tomou um gole de chá.

— O que acha daqui?

— É bom.

— Bom? Felix, a gente está fazendo o máximo para ajudar!

Lancei um olhar para aquele dia sem fim. Continuava esperando, como Jisung, a hora em que minha dor passaria. Até o momento, não tinha acontecido.

— Não sei o que te dizer. Talvez vocês devessem voltar para uma cidade e me deixar aqui. Acho que é só uma fase.

Jeongin esticou o pescoço em direção à Água.

— Ela está preocupada. Você deve ter reparado.

Assenti com a cabeça.

— Ela acha que estou sendo petulante, que vou superar. Posso sentir isso. — Fiz uma pausa. Apertei a xícara entre as mãos na tentativa de absorver aquele calor. — A verdade é que não sei como perdoar a Água — confessei.

A Sereia - hyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora