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A PRIMEIRA COISA DE QUE TOMEI CONSCIÊNCIA foi a fome. A sensação era de que meu estômago iria digerir a si mesmo, e a falta de comida era dolorosa. Ao mesmo tempo, achava a dor estranha, como se fosse típica para os outros, mas não para mim.

Então senti meu corpo balançar. Me movia, mas estava escuro e não conseguia saber onde estava ou como estava sendo levado. Não usava as pernas. Minhas pernas pareciam detonadas; meu corpo inteiro, na verdade. Não conseguiria usá-las nem se precisasse.

— Oi? — falei com muito custo. Minha garganta queimava; parecia arranhada, como se tivesse engolido água salgada. Precisei de toda a minha energia para erguer a cabeça.

Foi então que consegui ver como estava me movendo. Três garotos me carregavam: dois apoiavam meu tronco e um segurava as pernas.

— Para onde estão me levando? — minha voz saiu fraca e trêmula.

Ao fazer a pergunta, percebi que eu ignorava questões ainda mais importantes. Não conseguia lembrar meu próprio nome. Lix? Lumus?

Nenhum deles soava certo na minha cabeça. Não sabia onde minha família estava; não sabia onde ela deveria estar. Não conseguia lembrar de nomes e rostos, mas sentia que tinha perdido algo ou alguém.

Minha respiração começou a acelerar à medida que o medo se apoderava de mim. Meu instinto era correr, mas eu mal conseguia manter a cabeça erguida.

— Por favor, não me machuquem.

Nenhuma resposta.

Quando nos aproximamos de uma casa, comecei a pensar se aquele seria meu destino final. Luzes brilhavam através das janelas. Embora a visão me passasse uma sensação reconfortante, não confiei naquele sentimento. Gemi quando eles começaram a subir a varanda, embora os três se movessem com suavidade e tentassem evitar me chacoalhar muito. O garoto à minha direita, um asiática belíssimo com o cabelo tão negro quanto as roupas que vestia, acenou três vezes com a cabeça e todos me baixaram em sincronia.

Me deixaram apoiado sobre os cotovelos, sem fôlego.

— Onde estamos? O que vocês querem? — balbuciei, rouco.

O garoto aos meus pés, outra deusa de rosto exótico, dirigiu um olhar triste para os outros e depois para mim, como se eu tivesse acabado de fracassar numa prova.

— Estou tão confuso — choraminguei. — Por favor, o que está acontecendo?

O último garoto, maravilhosa com seu cabelo cheio, apontou para a casa.

— É a minha casa?

Seu rosto assumiu uma expressão estranha, como se ele não soubesse o que responder. O asiático tocou meu braço para chamar a minha atenção e fez que sim com a cabeça.

Como se estivesse prestes a perder alguma coisa, ele tocou minha bochecha. A mão estava encharcada. O garoto aos meus pés juntou as mãos abertas, como numa oração, e fez uma reverência. O último acariciou meu cabelo e sorriu.

Sem palavras, eles levantaram e correram para o lado da casa.

— Esperem! — gritei o mais alto que pude. — Quem são vocês? Quem sou eu?

Comecei a chorar, aterrorizado. O que eu ia fazer?

O barulho deve ter chamado a atenção de alguém. A porta se escancarou, e a luz de dentro quase me cegou.

— Felix? — um homem perguntou. — Julie! Julie, venha cá! É o Felix!

— Me ajudem! — supliquei. — Por favor.

A Sereia - hyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora