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JÁ FAZIA UM ANO E MEIO desde a nossa última vez na Flórida, e fiquei feliz de verdade quando entramos no estado. Não por saber o que estava por vir — na verdade, lamentava a viagem para a Índia —, mas porque tinha sido na Flórida que conheci Hyunjin. Era como se eu fechasse um ciclo, como se voltasse ao começo. Talvez estar ali sarasse a ferida que eu temia ser incurável.

— É aqui — disse ao estacionar na casa alugada. — Não é maravilhosa, mas não vamos ficar muito tempo.

— Não, está ótima — Minho disse ao contemplar a pequena casa e respirar o ar úmido, uma mudança abençoada depois de meses de neve. Estávamos no interior da cidade; não queríamos chegar perto demais da praia. Para o plano funcionar, precisávamos garantir que não haveria chance de nenhuma de nós sequer molhar o dedinho do pé na Água. Só tínhamos aproximadamente um mês até Ela precisar se alimentar de novo. Não aconteceram muitos naufrágios ao longo do ano e, a não ser que um grande acidente ocorresse logo, teríamos que cantar um pouco mais cedo do que o normal. A Água estava cada vez mais faminta, e eu não queria abusar da paciência dEla.

Tínhamos poucas horas livres na casa. O voo partia de manhã. Guardamos a bagagem e nos reunimos na sala de estar, onde dei as instruções finais aos meus irmãos.

— Aqui estão as passagens — disse ao entregar os papéis com nomes e identidades falsas. — Foi o melhor que consegui, Jisung.

Ele encarou o rosto no passaporte.

— Mas o nariz desse garoto é horrível!

— E é por isso que você pode escrever que fez plástica no nariz caso alguém pergunte — expliquei. Corria os dedos pelo cabelo, exasperado, sem saber ao certo se devia me odiar naquele momento ou não. — Muito bem, tudo o que vocês precisam fazer é serem discretos. Jisung, lembre que é crucial não falar com ninguém em nenhum momento — continuei, encarando-o bem nos olhos. — Você é muito novo na vida de sereia, é difícil ficar em silêncio no começo, mas se quer mesmo se vingar, precisa ficar quieto.

— Entendi — ele disse ao enfiar o passaporte na pasta com as passagens.

— Já arrumei um transporte para quando vocês chegarem lá. Jisung, conto com você como guia. Circulei os hotéis em que vocês podem ficar se precisarem — falei ao entregar o mapa impresso para Jeongin. — Talvez seja melhor viajar à noite, mas vocês que sabem.

— Espera aí. Você não vai com a gente?

— Não posso — respondi, mordendo o lábio e esfregando as mãos de ansiedade. — Mas fiz todos os preparativos para vocês. Não está bom?

Minho pôs a mão no meu joelho.

— Está mais do que bom.

Soltei um suspiro.

— Escutem, acho que nunca é demais enfatizar o seguinte: para qualquer coisa que precisarem, usem água tratada e engarrafada. Nada de ligações com Ela, ou estamos acabados. E enterrem os corpos. Não os deixem em contato com a Água. Se Ela descobrir…

Jeongin me tomou pela mão.

— Somos espertos. Vamos cuidar de Jisung e nos manter a salvo.

Engoli em seco. Era estranho sentir a garganta seca.

— Vou esperar vocês aqui. Por favor, tomem cuidado.

Eles reorganizaram a bagagem para o voo enquanto desfiz minha mala em silêncio, tentando me sentir confortável naquele purgatório.

Meu instinto natural era ir à biblioteca. Ele não tinha comentado nada sobre voltar à faculdade, mas depois de todo o tempo que tinha passado, eu imaginava que Hyunjin estaria de volta às calças cáqui e aos carrinhos de livros que empurrava pelo corredor, talvez de cabelo curto de novo ou com um coque. Me comportei por tanto tempo que, se havia uma chance de vê-lo mais uma vez, ainda que precisasse me esconder, tinha que aproveitar.

A Sereia - hyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora