toc... toc... toc...
Bateram uma segunda vez na porta, meu coração esta muito acelerado, não é comum ouvir uma batida na porta nos dias de hoje.
Me viro em direção a porta da frente e começo a andar lentamente ate a escrivaninha na sala, pego de dentro da gaveta um revolver carregado e vou na ponta dos pés ate a porta. Eu não esperava por isso, mas eu ouço:
- Olá?...
Eu gelo de uma vez, uma voz tremida vem de trás da porta.
- Olha cara eu sei que a situação toda é estranha, mas eu estou morrendo de frio.
Ele parece esta calmo e acho que não fara mal a mim, afinal, estamos na mesma situação. Eu boto minha mão na maçaneta e a giro e puxo devagar, um homem com uma capa preta esta de pé na frente da minha porta, os raios iluminam sua silhueta,
- Posso entrar? - ele diz
Meio receoso eu digo "Sim".
Eu abro a porta totalmente e vou me afastando pra trás ainda apontando para o sujeito, ele vai entrando na casa com as mãos pra cima e dizendo
- Calma cara, não tem o porque disso, só somos eu e você aqui. Eu não quero fazer mal nenhum.
Com uma voz tremula eu digo
- Tira o capuz.
O sujeito vai direcionando as duas mãos para a cabeça, ele então puxa para traz o gorro negro e eu finalmente posso ver seu rosto com mais clareza.
- Esta tudo bem agora? Você já me viu. - ele disse enquanto fechava a porta e colocava a bolsa no chão.
Totalmente calado e me tremendo, eu coloco o revolver dentro do meu bolso, e eu continuei olhando atentamente para ele enquanto tirava a capa molhada e os sapatos encharcados.
- Bom, me desculpe por chegar do nada, mas eu vi as luzes aqui na casa e eu fiquei assustado em ver que poderia viver alguém aqui. E me perdoe pelos modos, meu nome é Tero. - Ele apontou a mão pra mim tentando me cumprimentar.
Eu estendo minha mão pra ele e o cumprimento de volta
- Meu nome é Sam.
Nós ficamos nos encarando por uns segundos, ainda estávamos sem acreditar na veracidade da situação. Tero é um homem alto e negro, ele aparenta ter quase a minha idade, seu rosto é muito bonito e especialmente marcante por causa dos pequenos cortes que ele tem na testa, como se ele tivesse batido a testa em arame farpado.
Deixando minha timidez de lado, eu acendi as luzes da casa e tentei puxar um assunto para poder quebrar esse clima
- Então, qual é a sua historia Tero?
Ele deu um suspiro breve e se sentou na poltrona
- Eu ia fazer a mesma pergunta pra você, mas como você é o anfitrião... Bom - ele deu umas tossidas para tirar algo da garganta- Como você deve ter reparado, todo mundo desapareceu e ate umas horas atrás eu pensei que eu era o ultimo homem na terra.
- É, sei como é essa sensação - eu disse enquanto caminhava ate a cozinha pra poder pegar uma garrafa de vinho. Tero continuou a historia
- Quando a tempestade chegou eu estava na igreja, era uma missa de semana e eu estava reunido com toda a família, foi muito estranho sabe, eu estava indo pra igreja pra poder agradar a minha esposa, nunca fui muito cristão. Mas em um momento enquanto nos orávamos, a energia do local caiu e quando eu abri os olhos todos tinham desaparecido.
Voltei da cozinha com duas taças em uma mão e a garrafa na outra, servi nós dois enquanto ele terminava de contar a historia
- No inicio eu me desesperei de verdade, minha esposa estava gravida e eu pensei que jesus havia voltado, eu me culpei muito pela semana seguinte, orei ate não aguentar mais e li a bíblia 13 vezes, ate que eu me dei conta que oque aconteceu naquela noite não tinha nada haver com o apocalipse.
- Não se encaixava com oque estava escrito na bíblia né? - eu disse enquanto tomava um gole do vinho
- Exatamente - Tero continuou - Não se encaixava, o céu não sangrou e o diabo não saiu do chão, e afinal, todo mundo teria sido arrebatado? Porra, eu não sou santo mas tem gente bem pior que eu.
Nós dois rimos e Tero continuou
- Só sei que depois que a minha ficha caiu, eu comecei a andar por ai e fiz tudo oque eu mais queria fazer, bebi muito e entrei nos lugares que eram reservados a classe alta, eu ate fui no zoológico, eu cheguei na cidade a uma semana atrás e por algum acaso eu nunca tinha visto rastros seu, mas ontem a noite eu vi uma luz vindo daqui, então resolvi passar por aqui hoje, e felizmente realmente tinha alguém aqui. Mas enfim, essa é minha historia Sam, qual é a sua?
Eu me sentei no banco que ficava encostado no balcão da cozinha e comecei a contar a minha historia, Tero fez caras e bocas enquanto eu falava da queda do avião e me elogiou quando eu disse que arrumei essa casa toda, ele se surpreendeu quando eu falei sobre o esgoto e a enchente, no final da historia concordamos de que éramos muito parecidos.
- Cara, eu tenho um quarto de hospedes aqui no chalé, eu quero que você more comigo se quiser - quando eu fiz essa proposta já estava ficando de manhã e nós estávamos muito bêbados.
- Eu não vou a lugar nenhum Sam, esse seu pedido iria parecer precoce a 15 anos atrás. Eu também não quero ir embora sabe, não converso com ninguém a muito tempo.
Eu concordei com a cabeça e depois peguei a mochila dele e levei para o quarto de hospedes, ele veio logo atrás de mim e eu disse
- A cama é de solteiro mas é confortavel, acho que voce vai gostar.
- É melhor do que os lugares que eu dormi nos últimos dia - ele falou dando uma gargalhada e eu com a risada frouxa ri também.
Ele se deitou na cama e caiu no sono, eu sai do quarto de hospedes e deixei ele dormir, eu ainda estava sem acreditar quando me deitei na minha cama, estou feliz por ter um amigo para me fazer companhia, mas um sentimento cresce no meu peito, um horror que me faz pensar em só uma coisa.
Porque o Tero não desapareceu? Existe outros além de nós, isso eu tenho que perguntar mais tarde para ele.
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Solum: Intempérie
Misterio / SuspensoSolum conta a história de Sam, um homem que caminha sozinho pela terra desde o dia da " Grande tempestade" que aconteceu em 2020. Essa história é narrada em primeira pessoa de forma intimista, os assuntos tratados aqui são parte da opinião popular.