TZUYU
Revisto a mochila outra vez para me certificar de que não esqueci nada essencial. Lanterna, saco de dormir, uma muda de roupas e uma bolsa medíocre de primeiros socorros que seja capaz de me salvar com alguns curativos e muita sorte. Parece ideal.
Jeongyeon vai levar uma barraca grande e Mina reuniu algumas ferramentas que tinha em casa para que nada de suspeito fosse detectado na contagem da colônia. Não estou certa sobre Jeonghan, ele é mais adepto ao improviso, o que já nos significou dormir sobre folhagem úmida por várias noites.
Sei que a porção de carne desidratada e arroz em nossas mochilas será consumida em menos de dois dias com o ritmo que pretendo nos levar, então que a sorte decida estar ao nosso favor e nos mostre uma caça farta para ser espetada num galho seco.
Espero que não tenha ursos pelo caminho.
Antes de desligar o abajur, encaro a fotografia no mural da parede ao lado da minha cama, um canto onde todas as coisas importantes costumam ficar. A qualidade está uma merda, mas, ainda assim, consigo distinguir entre as nuances a feição de cada um dos meus amigos. É uma lembrança antiga, de quando estávamos em treinamento aprendendo a sobreviver de vez no fim do mundo, não muito mais que um vislumbre de humanidade.
Não faz sentido quando falo dessa forma, mas poucas coisas mantêm o significado nessa realidade. Li em algum lugar que tudo que é sólido se desmancha no ar e, se eu fosse mais inteligente, conseguiria explicar como o mundo inteiro virou de ponta cabeça com essa frase de gente sacana. Agora, vinte anos se passaram e entender não está mais fácil.
Droga, estou divagando. Tenho de me concentrar em algo: a foto.
Ali, estou no fundo com Mina e Jeongyeon, minhas amigas mais próximas. É um pouco depois de elas zombarem da minha vergonha por estar perto da garota que gosto, a especialidade delas. Dino fica no meio dividindo espaço com Yeonjun e Jihyo, acho que ela sempre foi meio apaixonada por ele. Na frente, com joelhos flexionados para que todos apareçam, Sana se inclina com Jeonghan, ela não precisa se abaixar muito.
Fico feliz que tenha sido Christopher a segurar a câmera, o que me poupa do desgosto de vê-lo; este é, inclusive, o motivo pela qual escolhi essa fotografia em específico. Como disse, perto da cama mantenho apenas o que me importa.
Fecho a mochila e jogo sobre o ombro, tateando minhas calças até sentir o canivete e o coldre. Acho que estou pronta, embora a ansiedade me faça pensar que não. Preciso controlar melhor isso.
Com a janela escancarada, tenho de me esgueirar até o telhado e equilibrar nas vigas expostas. Estou tão habituada a andar nesse tipo de estrutura que posso saltar entre uma saliência e outra enquanto me penduro nas hastes de madeira envernizada, tão robustas quanto o necessário para suportar meu peso. Desço pela varanda em silêncio, adaptando meus olhos ao brilho lunar, e chego ao jardim em segundos sacudindo a poeira da roupa.
Nos fundos, meu pai tem uma horta de tamanho modesto que escapa da colheita geral, é o seu passatempo favorito, talvez o único que respeite a limitação física dele sem o humilhar de alguma forma. Passo por ela, roubando um morango gordo e suculento, quando uma criatura agachada quase me faz ter um ataque cardíaco.
Criaturinha, para ser mais exata.
— Puta merda, garoto! — xingo, olhando os arredores para ter certeza de que ninguém mais está se esgueirando por aí.
— Olha a língua!
— Você não pode me dar sermão.
— É, mas posso chamar o titio! — Jongdae exclama, mais barulhento do que eu gostaria, e preciso tapar sua boca antes que ele proteste ainda mais alto.
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THE LAST OF TWICE
Hayran KurguEm um mundo pós-apocalíptico, parece que nenhum lugar consegue se manter intocado pelo mal por muito tempo. Criaturas, assassinos e contrabandistas estão sempre à espreita para espalhar o caos enquanto a fome e o desespero devastam comunidades intei...