Manhã tempestuosa

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A aurora esclarecia seu quarto, pois, ainda imóvel, Sae tinha esquecido de fechar as cortinas no tardar da noite. Estava com fome, se sentia suja. Mais uma vez, se arrependia de sua teimosia chata.

Passara a noite trancada, sozinha. Foi por escolha própria, então se sentia uma idiota por recusar o jantar que Kenta veio lhe oferecer. Em larga escala, seu problema parecia bobo para incluir aquela criança nisso. Mas, ainda assim, tinha o total direito de se zangar.

Os passos preguiçosos lhe arrancavam da cama, quando, de uma vez por todas, decidia tirar o uniforme do dia anterior e ir tomar um banho. Sua cara já não era de tanto sofrimento, uma vez que as muitas horas de sono lhe renovaram o rubor e saúde de sua aparência. Talvez a falta do treino diário também tivesse envolvimento, apesar de não contar com ela.

Seu cabelo, por outro lado, precisava de uma boa atenção. Parecia ressecado, com ondas que não se formavam... deprimente.

Ligou o chuveiro gelado e esperou a coragem lhe motivar a enfrentar a tão baixa temperatura. Só de encostar o pé, para testar as águas, já se sentia muito mais acordada. Foi se lavar no temor de congelar. Com tempo sobrando, não viu problema em tomar cinco minutos de seu dia para uma hidratação profunda. Agradeceria a si mesma mais tarde, então continuava confiante.

Enrolou-se na toalha e caçou por roupas íntimas e seu uniforme no armário, uma das únicas coisas em todo o cômodo que estava organizado. Escovou os dentes e secou o cabelo, depois de fazer a cama, para ter certeza que tudo estivesse no lugar antes de sair de casa. A ideia da mudança de turma ainda não caía bem, mas preferia estar triste e arrumada do que apenas desengonçada, pois, assim, não teria que se preocupar com a impressão das pessoas sobre si.

Quando tinha seu telefone em mãos, três notificações estampavam a tela. Não as responderia. Pelo menos, não naquele momento. Prezava primeiro deixar seu quarto para conseguir resolver qualquer coisa pelo resto do seu dia, então desligava o aparelho e o jogava dentro da mochila da escola, se apressando para chegar à mesa do café da manhã.

O longo corredor se encontrava mudo e a cozinha, mesmo cheia, se preenchia de silêncio quando todos notavam sua presença. Abriam espaço para se sentar com a companhia da família, mas, recusavam-se encarar seus olhos, de um jeito medroso. Bem... todos exceto Yusei, que, convenhamos, seria o primeiro a morrer em um apocalipse zumbi.

— Tenta não matar ninguém na aula hoje... — Ele suspira.

— Yuseei! — Alerta o mais novo de todos os filhos.

— Que foi? — O menino da uma abocanhada no arroz embrulhado em ovo cozido. — Ah... e tenta não morrer também... seria bom. — Diz com boca cheia.

— Eca! — Reclama o terceiro irmão, o mais velho de todos, murmura. — Tenha modos!

Sae não podia fazer nada a não ser conter a risada. Se, um dia, algo fosse capaz de mudar esses três, não sabia o que faria de si mesma a não ser viver numa imensidão moribunda. Era orgulhosa de ter conseguido uma família tão boa para si.

— Que esses aspirantes à alguém sejam capazes de me aguentar... — Ela sorria, imaginando algo que o Kumori diria, e tem a aprovação do moreno.

Enchia o bucho com as refeições que deixou de comer no dia anterior e colocava as louças da família na pia. Com tempo de sobra para refletir, só então era parada pelo medo do continuar de sua jornada.

Não queria mais colocar os sapatos. Não queria mais se mover. As mensagens que leu antes de dormir, agora ocupavam um apartamento em sua cabeça.

Aquele nunca foi o plano.

Mas, sem outra escolha, sentada no batente da porta, terminava de se arrumar, calçando o tênis que lhe cabia tão bem nos pés. Conferia seu cabelo uma última vez no espelho da entrada e destemidamente segurava a maçaneta da porta.

Hero's Legacy - Boku No HeroOnde histórias criam vida. Descubra agora