Capítulo 16: Juju, você tá viva?

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Não consegui mais falar com Felipe depois daquilo. Uma nuvem negra pairou sobre minha cabeça, me lembrando de todos os motivos que me fizeram ser do jeito que era. De evitar esse tipo de conexão com as pessoas. Se eu não me apegar a ninguém, então essa pessoa não vai ter como me machucar, é muito simples. Não me importo de ser a babaca da situação se for preciso.

Ele foi embora quando o filme acabou, assim como eu me despedi de Melissa e peguei um Uber pra casa. Tinha certeza de que minha amiga notou o clima estranho, porque não falou sobre Felipe e nem sobre o fato de ele não ter me oferecido carona pra casa. Eu teria recusado dessa vez, porque não podia ficar perto dele depois da nossa última conversa.

Acho que todo adolescente já teve um momento na vida em que se arrependeu de alguma coisa, ou foi extremamente traumatizado por algum acontecimento. Eu não estou muito atrás nisso, porque mudaria muitas coisas da Júlia adolescente. Olhando pra trás, não sei como deixei certas coisas acontecerem comigo, porque a Júlia de hoje jamais se permitiria entrar em um relacionamento tóxico. Ao mesmo tempo que eu sei que sem aquilo, eu não seria a pessoa que eu sou hoje.

Manu não estava em casa quando cheguei, me fazendo lembrar que ela provavelmente ainda estava no bar com Bernardo. Eu esperava que ela tivesse mais sorte do que eu pelo menos, porque tinha certeza que se alguma coisa rolasse entre ela e Bernardo, seria o relacionamento mais saudável que alguém poderia ter, pela forma como ele a trata e a olha, como se o sol nascesse nos olhos de Manu. Era absolutamente fofo.

Me joguei na cama, pegando meu notebook para assistir o dorama mais fofo que encontrasse. Já que não conseguia ter um relacionamento na vida real, eu me contentava em ver personagens fictícios se apaixonando por uma tela. Era um pouco deprimente, mas também era o que eu normalmente fazia quando me sentia deprimida. Então peguei um saquinho de jujubas, me deitando na minha cama para fazer isso, quase gemendo de frustração quando meu celular vibrou.

—Que não seja nenhum dos dois. —Falei, soltando um suspiro pesado ao puxar o celular do bolso da minha calça, abrindo um sorriso aliviado quando vi que era Érika.

Érika — Juju, você tá viva?
Bernardo está levando uma Manu super bêbada pra casa.
Achei que deveria avisar, mesmo sabendo que o Bernardo não faria mal nem à uma mosca.
Eu odeio os homens, sabia?
Eles são uns idiotas.

Júlia — Obrigada por avisar sobre a Manu.
Você está bêbada também?
A parte do "idiotas" é seu irmão? Porque eu acho que vou concordar.

Érika — Infelizmente, eu não estou bêbada.
Mas eu queria (só pra deixar claro).
Não, meu irmão está ocupado se pegando com uma garota aleatória.
Apesar de ele ser mesmo um idiota, não estou falando dele.
Seu amigo é um idiota, na verdade.

Parei um segundo, me dando conta de que ela estava falando de Diogo, já que eu sabia que Manu havia o convidado para ir junto. Comecei a pensar em várias coisas diferentes e a maioria delas não era nem um pouco boa, mas por sorte Érika voltou a digitar.

Érika — Eu queria mesmo ficar com ele.
Por que eu tinha que ter uma porcaria de 16 anos ainda? Por que ele tinha que ser mais velho?
Ele passou um tempão olhando pra Manu com o Bernardo, com uma cara que deixava claro que queria estar no lugar do Bernardo.
E agora ele saiu daqui com uma garota.

Soltei um suspiro pesado, encostando minha cabeça no travesseiro ao encarar o teto. Adolescentes eram complicados e confusos e eu entendia bem isso, porque já passei dessa fase e era exatamente assim. Diogo pode ser o primeiro a dar uma desilusão pra ela, mas isso não significa que vai ser o último. Se eu voltasse pra minha época de 16 anos, ficaria longe dos homens.

Júlia — Sinto muito.
As vezes as coisas não acontecem como a gente quer e isso é um saco, Érika.
Um conselho não solicitado, que eu tenho quase certeza de que você vai ignorar.
Deixa o Diogo pra lá.
Você vai perceber uma hora, que não ter ficado com ele foi a melhor opção.

[...]

Não vi Felipe pelos três dias seguintes, o que foi um momento de alívio pra mim, ao mesmo tempo que eu me senti esquisita. Minha pequena insegurança deu um grito, se perguntando se Felipe já havia desistido apenas com as coisas que eu havia dito, provando que meu ex estava certo. Mas tentei parar de pensar nisso e focar em outras coisas.

Pelo menos minha melhor amiga tinha realmente tido mais sorte do que eu. Fiquei feliz em ver como Manu parecia mais alegre depois de saber que ela e Bernardo haviam finalmente ficado juntos. Os dois já agiam como se fossem namorados, mesmo que eles não notassem isso. Eu estava apostando todas as minhas fichas que Bernardo não ia demorar a oficializar, sabendo que iria ganhar essa.

Mas na terça à noite era dia de jogo da turma de química contra a de direito. Eu não queria ir e quebrar o ciclo de dias sem ver Felipe, mas Manu e Melissa praticamente me arrastaram. Eduardo estava nos esperando quando chegamos, nos levando até o lugar nas arquibancadas que ele havia guardado pra gente.

Não demorou para os dois times entrarem no campo, com meus olhos varrendo cada rosto dos jogadores, até encontrar Felipe entre eles, usando a faixa de capitão do time. A maioria dos caras de química eram lindos, mas Felipe conseguia ofuscar todos eles quando sorria e falava com os colegas, tomando pra si a responsabilidade de guiar eles dentro do campo.

Ele parou de andar quando olhou para as arquibancadas, assim que Bernardo passou por ali e piscou para Manu ao meu lado. Não deixei de notar a surpresa nos olhos de Felipe, como se ele esperasse que eu não fosse. Mas eu estava ali e iria torcer por ele, porque independente de qualquer coisa, eu não o odiava.


Continua...

Todas as verdades não ditas / Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora