Capítulo 2

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    Depois do portão havia um mundo desconhecido para ela. Um carro a esperava para levá-la para longe da proteção dos muros e da mão firme, mas carinhosa das religiosas. — Esses meses longe daqui vão ajudá-la a se decidir sobre o futuro. — O portão alto rangeu ao ser aberto. — Você tem direito a escolher. Como você sabe, kira, não gosto de pressionar minhas meninas.
     O desejo de entrar para nossa ordem deve estar bem fundo no coração.
     Vá e descubra a resposta que a trará para nós ou que a fará seguir outro caminho.
    Kira despediu-se da madre superiora; o motorista do carro enorme pegou a mala e a colocou no porta-bagagem.
    Kira estremeceu no ar fresco da manhã; um menino estava espiando pelo vidro, enquanto ela entrava no carro.
      A porta fechou-se, depois foi a vez do portão do convento, e a criança continuou a examiná-la com olhos tão escuros quanto os do pai. — Você não é freira — disse ele, falando em inglês. — Pensei que você fosse usar um vestido comprido preto e uma touca na cabeça.
     Kira sorriu, nervosa. Estava usando um casaco azul-marinho simples e uma boina que mostrava apenas as pontas de seu cabelo. — Só vou usar o hábito quando fizer os votos — ela explicou. — Você está muito desapontado porque não estou com uma touca na cabeça? Ele pensou na pergunta, com os olhos escuros fixos no rosto dela, que era muito lindo emoldurado por cabelos pretos, os lábios sem pintura e muito vulneráveis, os ossos da face dando-lhe um ar ligeiramente vulnerável — Acho que com uma saia comprida você não ia poder brincar na praia — disse Aleko. — Gosto muito de jogar vôlei.
      Papai e eu jogamos juntos e ele me faz correr tanto que acabo sem fôlego. Kira  tentou imaginar o grego alto jogando bola e correndo na areia.
      Era difícil acreditar, mas assim ele parecia menos enervante. Ele devia gostar muito do menino, pois o criara sozinho e, com certeza, devia ser muito mais gentil com ele do que com as outras pessoas. — São muito rigorosos os votos que você tem que fazer para se tornar freira? — Aleko prendeu o lábio superior com os dentes enquanto a examinava. — Não são rigorosos — ela respondeu com um sorriso —, e sim sérios, por isso a pessoa tem que pensar muito antes de resolver. — Enquanto isso a pessoa pode sair do convento?
      Ela concordou, encostando-se no banco enquanto o automóvel se afastava do convento, deixando-o rodeado por seus muros altos na luz da manhã.
       Kira olhou pelo vidro de trás até perder de vista a torre com o sino. Foi então que quase ficou em pânico.
      Mas tratou de se acalmar, para enfrentar a tarefa que tinha pela frente.
      Era a primeira vez que ficava inteiramente sozinha, sem a companhia das outras moças e das freiras.
      Agora ela só podia contar com a sua iniciativa para provar à madre superiora que, se tinha tido coragem de enfrentar um mundo estranho, poderia muito bem entrar para a Congregação de Santa Clara.
     Enquanto não visse e não experimentasse a vida do mundo exterior, não saberia que sacrifícios teria que fazer caso entrasse para o convento.
     Tinha que conhecer outras pessoas fora dos muros do convento e descobrir se sua fé era suficiente para enfrentar uma vida em que a devoção mística substituía o amor físico por um homem.
     Kira examinou o menino ao lado, uma réplica menor do grego alto que mostrara tanta autoridade na saleta da madre superiora enquanto examinava detalhadamente a mocinha vestida com o uniforme austero.
     Lembrou-se vividamente do cabelo preto muito espesso, de uma pinta escura no maxilar esquerdo e da maneira como o sol da Grécia havia queimado sua pele.
     Quando ele falou, quando disse decididamente "A jovem serve, madre superiora", o timbre profundo de sua voz tocou os centros nervosos de  Kira e ela quis, naquele mesmo instante, pedir à madre superiora que não a colocasse nas mãos dele.
    Quando olhei suas mãos vi as duas alianças juntas. Ostentação, foi o que ela pensou, até que a madre superiora lhe disse que ele era viúvo e que provavelmente usava a aliança da mulher em sua memória. Uma mulher não podia ter um filho, a menos que se entregasse a um homem.
   Kira percebia que deviam ocorrer certas coisas e, em sua inocência, ficou horrorizada quando se imaginou entre os braços de alguém como o pai de Aleko, à mercê de seus lábios e de seu desejo.
    Sentiu um calor ao tentar afastar a imagem. Em toda a sua vida ela nunca tinha encontrado ninguém que a fizesse pensar nessas coisas e teve vontade de fazer o sinal da cruz, como ela e as outras moças sempre faziam quando passavam pelo pequeno cemitério atrás do convento.
    Lá havia uma estátua de pedra de um monge, com a cabeça coberta por um capuz e as mãos enfiadas nas mangas largas de seu hábito.
    Havia uma história a seu respeito, que ele tinha preferido morrer a ceder aos artifícios de uma mulher rica que queria que ele desrespeitasse seus votos.
     Ela tinha espalhado mentiras a seu respeito, por isso ele se retirou para sua cela, recusando-se a comer ou a beber enquanto ela não dissesse a verdade. Entretanto, ela saiu do país, deixando o pobre monge entregue a seu destino.
    Uma das garotas não acreditou muito na história, achando que era uma loucura morrer por causa de um princípio. — Ele morreu por sua fé — kira protestou. Colette riu dela e comentou que a fé não alimentava o corpo de ninguém, apenas a alma, e que ela preferia comer peixe cozido na manteiga, com molho de maionese. Kira achava Colette engraçada, mas um pouquinho levada demais, mas quando ela saiu do convento para morar com a mãe, que era divorciada, sentiu falta de suas discussões e daquela amizade um tanto despropositada.
   Pecadoras e santas, era assim que Colette as chamava. Ela tinha dito que a simples idéia de fazer voto de castidade já lhe dava horror. — Quero viver minha vida plenamente — ela declarou ...
    Isto não é possível se você excluir os homens. eles é que dão sabor à vida e eu quero me apaixonar por alguém, mesmo que isso me magoe.
    Seu problema, kira, é que você é basicamente insegura. Você veio tão pequena para o convento que não se lembra como é ser beijada e acariciada.
   Enquanto o carro enorme levava Íris e o menino para longe do convento, ela admitia consigo mesma que tinha muito que aprender sobre a vida e que alguns meses longe do convento lhe indicariam se devia ou não entrar para a Congregação. — Vamos levar várias horas para chegar ao hotel do papai — o menino disse de repente. — Temos que ir até Londres e passar pelo Parlamento antes de pegarmos a estrada. Você não acha divertido? E agora posso saber qual é seu nome? — Eu me chamo kira — Ela sentiu vontade de sorrir com a maneira como Aleko tinha escorregado no banco até ficar bem junto dela. — É o nome de uma guerreira. — Sei, mas aqui na Inglaterra às vezes as meninas recebem nomes de flores. — Você tem olhos muito bonitos. — Você acha? — Sim, são brilhantes! Nunca reparei nisso, Aleko.
    As garotas que estão no convento não podem ser vaidosas. — Elas rezam muito? — Várias vezes por dia. — Eu rezo quando vou para a cama.
    Papai fica ouvindo e depois eu beijo o retrato de mamãe que fica sempre no meu criado-mudo. Nunca estive antes na Inglaterra, mas no ano passado fui com papai para Paris. — Você deve ter-se divertido muito. — kira sorriu. — Enquanto esteve lá, você foi até o alto da Torre Eiffel? — Sim. — Os olhos castanhos brilharam. — Foi muito divertido ir subindo cada vez mais e, quando chegamos lá em cima, vimos Paris inteira. Você já esteve lá? Kira sacudiu a cabeça negativamente. — Uma garota que esteve no convento disse que a cidade é muito bonita. Ela é francesa e mora num apartamento, em Paris, com a mãe. Ela me convidou para passar alguns dias com ela, mas acho que não vai ser possível



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