Capítulo XI

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Como prometido, lá estava Kuina encarando todo o atendimento em que Akemi estava sendo obrigada a passar. As anotações diárias eram ditas como necessárias, mas estava claro que eles iriam usar tudo aquilo depois para algo próprio, no entanto, a de dreadlocks não fazia ideia do que.


A raposa encarava a amiga que fez recentemente como uma escapatória para não surtar enquanto era espetada pelas agulhas. O médico checou sua respiração usando um estetoscópio, a mão deslizando por sua coluna a irritando.


— Como está a dor? Acreditamos que se não fizer nenhuma estupidez logo poderemos começar as sessões de fisioterapia.


— Eu não sinto nada— Akemi suspirou em frustração, sentia que estava falando com as paredes— E não vejo a hora de poder sair do hospital.


— Bem, terminamos por aqui. Vou pedir para diminuirem a dosagem dos remédios para a dor, me avise caso comece a sentir algo— O senhor disse desviando o olhar da prancheta onde anotava tudo o que iria recomendar para a enfermeira— Por hoje é só.


Sem mais a acrescentar, começou a andar em direção da porta notando a silhueta parada ali, encostada enquanto ouvia todos os exames de rotina. Chishiya encarou o médico que o via com olhos arregalados, a figura do gato branco vezes poderia simbolizar algo negativo para os médicos menos influentes.


— Boa tarde senhor Chishiya— O homem disse— Não sabia que estava aqui, precisa de alguma coisa?


— Estava apenas esperando terminar para falar com Akemi— A voz soou sem humor, carregada pela monótona indiferença.


— Não sabia que eram amigos— Akemi não pode escutar ou ver o que estava se desenvolvendo fora da sala, mesmo as vozes da conversa entrando na sala, ela sequer pode entender o que Chishiya falou sobre a fala do médico— Tenha um bom dia.


— Igualmente, doutor.


E se virando, o loiro entrou no quarto puxando o capuz sentindo o ambiente um pouco mais quente que o restante do hospital. Ele encarou Akemi que devolvia o mesmo olhar desinteressado, no entanto, diferente de seu habito de costume de não se envolver nas decisões de outros profissionais, seu corpo automaticamente foi até a prancheta a puxando para olhar.


Seus olhos escuros passaram entre as linhas lendo com calma, analisava os diagnósticos, os medicamentos em altas dosagens e julgava tudo aquilo como loucura. Diferente de Kuina, Chishiya tinha noções do que o médico estava fazendo testando tantos medicamentos e fazendo tantas anotações, mas como ele iria usar todos os documentos para fazer um relato de caso e não ser processado no processo...


Algumas folhas depois e lá estava o que seria um registro médico antigo, exames de sangue contendo diversas amostras para teste de doenças sexualmente transmissiveis. Todas estavam negativadas, mas as datas próximas e a quantia tão exuberante de páginas poderia deixar qualquer um curioso.


— O que tem escrito ai? — Kuina questionou bisbilhotando a prancheta e mesmo que pudesse ler os resultados dos exames de sangue, sequer entenderia, porém, Chishiya apenas soltou as folhas as deixando cair novamente para a prancheta— EI!


— Isso é sigilo médico paciente — O loiro disse devolvendo os arquivos para seu lugar.


— Você também viu— Kuina o lembrou, mas o homem apenas deu um leve sorriso zombeteiro.


— Mas eu duvido que ele tenha entendido o que estava escrito ali— Akemi falou se movendo para dentro da conversa. Ela anotou em sua mente para questionar depois, mas Chishiya pareceu que não iria responder suas dúvidas tão facilmente.


♠ — ♠


Como as noites que a torturavam, Akemi se mantinha acordada encarando seu quarto com certa sensação angustiante. Era estranho que um lugar como aquele pudesse representar perigo, Akemi deveria se manter calma e com a sensação de estar segura nas mãos de profissionais, afinal, ela estava para se tornar uma enfermeira também, porém, algo a impedia de dormir.


— Senhorita Akemi? — Uma voz masculina a chamou pela porta escura de seu quarto. Os olhos opostos encarou a figura de um interno com certo receio enquanto ele apenas entrava no cômodo carregando um soro — Eu vim trocar seu soro.


— Pensei que fosse uma enfermeira que fizesse isso— Akemi disse com um mau humor de dias sem dormir. O homem pareceu não ter escutado, mas era óbvio que apenas ignorou— O que tem nesse soro?


— Remédios para dormir— Ele disse prontamente enquanto fechava o controlador de fluxo do soro para fazer a troca— O médico pediu para que possa dormir hoje. Vai ter alguns exames de imagem amanhã.


— Eu posso negar esse soro? — Questionou e com o silencio, suspirou— Pelo visto não...


— Tenha uma boa noite, senhorita Akemi— As gotas começaram a correr pelo equipo, o soro gelado entrava por sua veia com certa dor irritante. Olhando para a câmara de gotejamento, se sentiu hipnotizada pelas gotas que entravam e entravam em um ritmo acelerado.


— Eu acho que...— Akemi não sabia quais eram os medicamentos, mas sabia que não deveriam estar gotejando daquela forma, não quando se tratavam de drogas que poderiam ter algum efeito colateral— Está rápido...


Tentando mover seu corpo, sentiu o que parecia a clara drogagem causada por um fármaco mais potente. Ela encarou o gotejar e o controlador de fluxo, mas sua mente estava desconexa enquanto tentava cordenar sua mão para deslizar na pinça rolete...


O sono se misturava ao liquido, a calma de uma madrugada entrelaçava com sua fraqueza. Akemi era humana e seus olhos pesavam cada segundo mais, no entanto, mesmo que sua mente lhe fizesse alucinar com cenas que ela tinha certeza de não ter vivido — mesmo que parecessem tão reais— tudo o que ela pode fazer foi se permitir perder aquela luta.


Respirando profundamente, sua mão caiu enquanto seus olhos piscaram demoradamente olhando o gotejar. Seus dedos se contrairam como em um desejo inconciênte de que algo os tocasse, fosse o frio de uma lâmina ou o quente de outro alguém...


Ela estava se sentindo louca desde que acordou do acidente que mudou tantos destinos de uma só vez e agora, fechando os olhos, não mais o abriu. 

Raposa Negra, Gato Branco | Chishiya ShuntaroOnde histórias criam vida. Descubra agora