O Cemitério de Armaduras

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Satine estivera calada desde que chegara a Jamiel no final daquela manhã. Mu não revelara o conteúdo da carta, mas ela sempre soubera do que se tratava. Esperou que o mestre tocasse no assunto, mas ele se perdera em pensamentos por longas horas. Então a Amazona foi até os Rozan encontrar o Mestre Ancião, que a esperava em frente a cachoeira.

    - Quanto tempo, menina Satine! Vamos sente-se e faça um pouco de companhia pra esse velho - Satine se aproximou e sentou ao seu lado.

    - Olá, Mestre Ancião! Como tem passado?

    - Não acontece muita coisa por aqui. Ah, Shunrei! - chamou a garota que estava escondida atrás de uma pedra - Venha aqui cumprimentar uma velha amiga.

    A garota se aproximou, soltando risinhos de felicidade.

    - Shunrei, essa é Satine, a Amazona de Taça. Ela conheceu você quando ainda era um bebezinho gorducho.

    - Olá, Shunrei! - cumprimentou Satine, com um sorriso sincero - Só agora percebo quanto tempo faz desde que vim aqui aquela última vez.

    - Ah, sim, muitos anos. Veja... - o Mestre Ancião apontou em direção a água, que se acumulava embaixo da queda - Aqueles são Ohko e Shiryu, meus novos aprendizes. Estão se esforçando bastante ao que parece, mais ainda têm um longo caminho pela frente se quiserem se tornar Cavaleiros de Atena.

    - E você, Shunrei, também está treinando?

    - Não, senhorita, não nasci sob a estrela dos Cavaleiros - explicou ela.

    - Vá brincar, Shunrei - pediu o mestre - E peça aos garotos que venham dizer um oi a nossa convidada. Você ficará para o jantar, não ficará, Satine?

    - Ah, mestre, não havia planejado me estender...

    - Satine, não vou deixar que parta antes de me explicar porque seu coração está tão pesado.

    - Estou apenas preocupada, Mestre Ancião - ela tentou disfarçar. O Grande Mestre pediu para avisar que você e o Mestre Mu serão considerados traidores se não acatarem as ordens dele.

    - Como esperado e você também sabe do que se tratam essas cartas, mesmo sem precisar lê-las - Dohko segurou o queixo dela e a fez olhar para ele - Agora, fale a verdade. O que a preocupa desse jeito?

    - Mestre... eu... Não sei por onde começar.

    - É sempre bom começar pelo começo, você não acha? - provocou ele.

    - Ainda assim... - Satine levou as mãos ao rosto, escondendo-o - É difícil falar sobre isso e as coisas acabaram de se complicar ainda mais antes de eu vir para cá.

    - Ah! Não se preocupe. Entendo que você pretendia conversar com Mu sobre o assunto, mas ele acabou de me dizer que já sabe - o Mestre Ancião sorriu para ela - Ele já havia me avisado sobre a carta e que você viria para cá. Também disse que você que você estava a ponto de explodir, mas por algum motivo se fechara ao invés de conversar com ele.

    - Vocês dois...

    - Não me olhe assim, você também está conectada a Mu que, a propósito, está acompanhando a nossa conversa - ele deu um tapinha na mão dela - Agora, vamos lá, crie coragem e nos conte sobre Aioria. Ele finalmente tomou coragem de dizer que te ama?

    - Acho que ele finalmente tomou coragem de demonstrar o que sente - falou ela meio sem graça - E graças aos nossos Cosmos, todo o Santuário parece estar sabendo também.

    - Ah, minha menina. Não fique assim. Todo o Santuário sempre soube que vocês estavam destinados um ao outro desde que se conheceram.

    - É verdade, Satine - Mu resolveu participar da conversa - E mesmo a distância pude sentir que tinha acontecido alguma coisa entre vocês.

    - O Cosmo nunca mente, doce Satine - complementou o Mestre Ancião - Vocês estão ligados de uma maneira que jamais conseguiriam fugir um do outro mesmo que quisessem.

    - Mas, Mestre... o Grande Mestre praticamente me expulsou do Santuário por causa disso e não preciso da minha intuição para saber que terei muitas missões pela frente a partir de agora.

    - O caminho nunca é fácil, Satine, mas não desanime - disse Mu - A vida de um Cavaleiro de Atena nunca é. Você sabe que são poucos os Cavaleiros que tem uma família. Não é proibido, mas como guerreiros, essa não deve ser nossa prioridade. No entanto, conheço o seu coração há muitos anos para saber que você fará a coisa certa quando preciso, então tenha coragem. Se for para você e Aioria ficarem juntos, tenho certeza que nada irá impedi-los.

    - Mestre... Eu... Eu não o estou decepcionando?

    - Você nunca me decepcionou, Satine - continuou Mu - Volte para Jamiel quando estiver pronta e conversaremos melhor.

    - Obrigada, Mestre!

    - Shiryu, Ohko! Ah, aí estão vocês! Venham conhecer uma amiga - os garotos saltaram até o platô rochoso em frente a queda da água.

    - Mestre! - fizeram uma reverência e estenderam a mão para cumprimentá-la e seus olhos se desviaram para a urna que carregava nas costas.       

    - Bons meninos. Agora vocês conhecem Satine de Taça.

    Depois de passar a noite na China e conhecer os aspirantes a Cavaleiro de Dragão, Satine retornou a Jamiel e resolveu pegar o caminho mais longo pelas montanhas. Ela gostava do ar rarefeito das cordilheiras que se estendiam por boa parte de seu trajeto até a casa de Mu, escondida entre as montanhas do Tibet. Já anoitecera há muito tempo quando se aproximou de Jamiel. A noite estava fria e tinha a luz das estrelas como guia e companhia. Ela estava próxima ao templo agora, mas faltava ultrapassar um último obstáculo antes de chegar ao seu destino, um lugar que lhe causava arrepios.

    Ao chegar perto da ponte, ela teve a impressão de escutar o lamento dos Cavaleiros que jaziam no precipício lá embaixo. Mesmo a noite, as armaduras mortas refletiam um parco brilho e, ainda que ela não os pudesse ver, era capaz de sentir a presença dos Cavaleiros mortos no Cemitério de Armaduras. Nem todas elas haviam acompanhado seus donos para a queda. Muitas haviam perecido com seus mestres mais de dois séculos antes, na última Guerra Santa e, sem vida, como seus donos, foram levadas até ali. Era tantas delas, que os Cavaleiros responsáveis por consertá-las, talvez levassem uma eternidade para fazê-lo. Ela se lembrava da infância, quando chegara Jamiel e observava seu mestre passar quase todo tempo, que não estava com ela, consertando as armaduras. Ela aprendera um pouco do ofício com ele, mas esse não era o seu destino. Com sua armadura viera também a responsabilidade. Ela tinha não apenas a intuição e capacidade de prever o futuro, como também o dom da cura. Duas capacidades que dependiam diretamente do seu Cosmo.

    Satine, estremeceu ao cruzar a ponte e tentou evitar os lamentos que clamavam por ela. De olhos fechados, pelo menos se furtava dos fantasmas dos Cavaleiros do passado, que velavam nas sombras do abismo.

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As Chamas do Cosmo Nunca se ApagamOnde histórias criam vida. Descubra agora