capítulo 11

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Minha cabeça latejava quando eu finalmente alcancei a consciência de novo, meus olhos sensíveis pela luz irradiando do cômodo em que estava. Minhas pálpebras pesavam, necessitando de um tremendo esforço da minha parte para abri-las.

Em um primeiro momento, tudo que vi foi um clarão de luz quase cegando os meus olhos, me forçando a fecha-los novamente. Quando os abri de volta, consegui me acostumar parcialmente ao ambiente bem iluminado.

Olhei com atenção ao meu redor, tentando captar o máximo de elementos possíveis. O lugar era imenso, com um teto ridiculamente alto e piso de mármore branco. Um enorme lustre semelhante ao do quarto pendia no teto em toda a sua glória, pelo menos vinte vezes maior do que o vi anteriormente. Pedras preciosas dos mais variados tipos decoravam toda a sala, encrustadas em quase todos os móveis e nos papéis de parede, refletindo as luzes que vinham do lustre e dos candelabros em um show de cores e beleza. Era daí que vinha o excesso de luminosidade, constatei com irritação.

Eu estava em uma cama diferente dessa vez, mas não menos luxuosa que a anterior. O móvel no qual eu estava deitada era grande e confortável, com lençóis cor de creme macios e de altíssima qualidade.

Era enervante como acordar em lugares desconhecidos estava virando rotina na minha vida.

Meus olhos varreram o local em busca de mais informações, captando detalhes como os tons dos sofás que estavam espalhados pelo cômodo até os vários quadros ricamente decorados que estavam nas paredes. Tudo ali gritava luxo na forma mais excêntrica da palavra, fazendo Rosália e Lores parecerem simplesmente pobres demais se comparadas às maravilhas desse lugar.

- Vejo que finalmente acordou, Incendiária. - Uma voz masculina sussurrou próxima ao meu ouvido, fazendo todos os pelos do meu corpo se arrepiarem de uma só vez.

Dei um pulo pra trás com o susto, minhas costas colidindo com a superfície dura da cabeceira da cama. Um arquejo de espanto deixou meus lábios, completamente assustada e escandalizada.

Céus, de onde esse homem havia surgido?

Olhei pra trás assustada, temendo o que encontraria. Eu não havia visto nada se aproximando, e ele não estava ali quando abri os olhos. Seja o que for, provavelmente se trata de um demônio ou de alguma alucinação da minha mente perturbada.

Ele era um demônio, constatei assim que minha visão conseguiu enxerga-lo com clareza. Um maldito de um demônio sombrio e aterrorizante, um devorador de almas, o monstro mais bonito que já vi em toda a minha vida.

Em Lores, nós temiamos as criaturas noturnas, filhas da escuridão. Elas eram muito mais comum no nosso território gelado do que em Rosália, fazendo com que um grande pavor coletivo se espalhasse acerca dessas criaturas. Segundo o folklore, elas nasceram dos abismos do submundo, de uma das crateras mais profundas dos domínios do deus da morte, onde apenas as almas mais cruéis habitavam em seu castigo eterno. Nós a chamamos de demônios, criaturas vis e sem alma, que emergiram do próprio caos das lamúrias dos mortos e da escuridão primordial do abismo, com o único propósito de promover a destruição e o desequilíbrio.
Elas eram incrivelmente belas, místicas e perigosamente poderosas e atraentes, exatamente como o espécime à minha frente.

Os olhos mais escuros do que a própria escuridão do submundo estavam fixos nos meus, sua pele alva como a neve e tão pálida quanto a de um cadáver. Seu rosto era esplêndido, com traços únicos e marcantes. Seus lábios tinham o formato de um coração, se assemelhando a um delicado botão de rosa, tendo o contraste perfeito com seu queixo delineado e esguio.
Os cabelos tão escuros quanto as íris caiam sobre os seus olhos de forma desleixada em mechas grossas e brilhantes, adicionando um chame mortal à sua aparência.

Nem mesmo o mais talentoso dos poetas do mundo inteiro seria capaz de descrever com exatidão o quão belo esse homem era, o quanto sua forma era imponente e magnífica. Ele era um predador, astutamente bonito para atrair suas vítimas. Era a chama mortífera que atraia mariposas para a morte certa, um monstro com boa aparência que fazia suas vítimas se entregarem de bom grado à ele.

- Esplêndido... - Eu sussurrei sem me dar conta, perdida em um transe poderoso, minha consciência enfiada em um lugar distante e inalcançável.

Um sorriso de canto se formou nos lábios avermelhados do desconhecido, seus olhos sedutores brilhantes como uma estrela iluminando a noite. Sua mão se estendeu com delicadeza até o meu queixo, tocando a pele ali com cuidado e um estranho toque de reverência. Fechei os olhos diante do contato, respirando com dificuldade conforme ele se aproximava cada vez mais.

- Tão facilmente manipulável... Garota tola. - O desconhecido disse contra o meu ouvido, um riso debochado de escárnio escapando dos seus lábios em seguida.

O transe se perdeu imediatamente, minha consciência voltando a assumir o controle conforme a fúria preenchia minhas veias.

- Demônio! - Eu consegui encontrar forças para dizer, meus braços cansados se esforçando para empurrar a criatura para longe.

Me levantei de súbito da cama, fazendo uma onda de tontura me atingindo logo em seguida. Me apoiei de forma desesperada na cabeceira, meu corpo lutando para permanecer de pé.

Eu estava terrivelmente cansada, ainda muito fraca para fazer esforço, mas ainda sim, eu continue tentando me afastar dele o mais rápido possível.

Ao olhar para a criatura com nítido pavor estampado nos meus olhos, ele pareceu apenas achar graça, me olhando de volta com um olhar contemplativo e sádico, como se estivesse assistindo a uma peça no teatro, complemente imóvel e entretido.

Um suspiro de dor saiu do fundo da minha garganta com o esforço para me apoiar, meus pés quase me traindo e me deixando cair. Minha respiração ofegante estava falhando, o incômodo enviando pontos estrelados direto para minha visão.

Ele continuou me olhando sem mecher um músculo, divertido com a minha reação.

Minutos intermináveis depois, ele finalmente fez alguma coisa. Ainda com o divertimento cintilando nas íris, ele se aproximou de mim novamente. Tentei resistir e correr, mas meus músculos traidores estavam muito exaustos para se moverem. O desconhecido me pegou no colo sem esforço algum, me colocando deitada na cama novamente.

- Se afaste de mim, criatura da noite! - Eu disse num suspiro assombrado, meus músculos tremendo inconscientemente enquanto eu tentava o afastar de mim.

- É realmente cômica a estupidez humana, minha cara. Apenas fique quieta e pare de agir como uma criança ignorante. Eu não sou um demônio, coisinha Incendiária. Mas acredite, depois da confusão que você me arrumou vai desejar que eu seja. - Ele respondeu com impaciência, suas sobrancelhas se arqueando de maneira desafiadora, os olhos pretos reduzidos a fendas profundas e letais.

- Q-quem é você, demônio? - Eu perguntei aterrorizada, meu coração palpitando incessantemente no meu peito, minha atenção fixa na sua figura arrebatadora.

- Eu sou o Deus da morte, aquele que domina as sombras e a escuridão, minha querida Incendiária. E é melhor você tomar mais cuidado com essa língua se quiser preservar a sua vida.

Meus olhos se arregalaram de imediato ao assimilar suas palavras, meu coração parando por um momento.

Foi como se o mundo todo tivesse parado e só esse momento existisse, como se só isso importasse. Era como estar diante do seu fim, sua mente temendo os seus momentos finais com fervor.

Durante toda a minha vida eu escutei sobre a mitologia do meu povo, estudei o nosso panteão de deuses e passei toda a minha vida seguindo as regras e ensinamentos dessas divindades. Elas eram seres inalcançáveis, vistos como símbolos e poder, intocáveis. Mas agora um desses deuses estava diante de mim, uma mortal.

Um deus. O deus da morte, o arrebatador de almas, aquele que impera sobre o caos, bem diante dos meus olhos. Me segurando como se estivesse carregando um saco de batatas.

Parecia inacreditável demais até mesmo para alguém que havia passado por tudo que eu enfrentei nos últimos dias. Absolutamente inacreditável.

herdeira de fogoOnde histórias criam vida. Descubra agora