50 | chuva de sangue.

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Eu saí do hospital a passos largos, com a cabeça presa num turbilhão de dúvidas, empurrando as diversas pessoas que atravessavam o meu percurso. Eu andava com as mãos tremendo e pensando no que poderia ter acontecido com Gigi e Amy no tempo em que estive longe das duas, incapacitado de poder protegê-las. O medo gostava de me engolir nessas horas, como uma fera faminta em busca por tentação, alimentando ainda mais a angústia que eu sentia.

Não conseguia pensar direito. A minha mente estava cheia de imagens confusas e era tomada por preocupações a cada passo até o estacionamento. Elas são tudo o que eu tenho de mais certo na minha vida, as únicas certezas de que eu também posso ser digno de amor. Gigi, em especial, sempre foi o meu porto seguro, a pessoa que me acalmava quando tudo parecia caótico, porém agora tinha chances dela estar em perigo. A ideia de perdê-la, me deixava inconsolável.

O meu coração disparava no peito, enquanto meu corpo se movia em piloto automático. Eu estava determinado a encontrar o responsável por tornar o meu pior pesadelo em realidade num estalar de dedos e descobrir o que foi capaz de fazê-la cogitar ir embora, de repente, de Nova York. Pelo o que a Anne soube, se trata de uma proposta de trabalho em Miami, ou se eu ligar os pontos, veio diretamente do escritório de Eric. Aquele babaca sempre no nosso caminho.

Com a possibilidade de Gigi decidir deixar tudo o que construímos para trás, além de levar a minha filha para o outro lado do país, antes que nós dois pudéssemos acertar os poréns, pude sentir a raiva começando a borbulhar dentro de mim. Então, sem nem ao menos me importar com os olhares ou comentários que viriam, acertei um soco com força na janela do meu carro, o que fez o alarme soar estridente.

Alguns cacos de vidros se espalham pelo chão cimentado e uma senhora acompanhada pelos filhos, se encolhe ao ver a cena. Todos ficam parados me observando como se eu fosse transtornado, mas se soubesse a confusão enorme que estou sentindo, não me julgariam desse jeito. Eu olhei para os leves cortes que se formaram em meus dedos. O sangue escorria lentamente pelas aberturas das feridas ardentes.

Não sei quantos instantes se foram, mas ao ficar vendo os meus machucados externos trazerem cada vez mais dor, me fez lembrar de que Gigi ficaria puta por me ver levar tudo a ponta de faca. Às vezes, até mesmo eu, fico perplexo com os meus pensamentos violentos, por ainda considerar a ideia de enfrentar Eric Jones, mesmo tantos anos terem se passado e principalmente por ainda ter ressentimentos sobre o idiota.

Gigi sempre me disse para deixar o passado para trás, para não me deixar consumir pelo ódio, pois a mesma presenciou as coisas se desenrolarem dessa forma inúmeras vezes em seu relacionamento anterior até que se transformasse em um ciclo infernal de abusos. Ela queria um futuro melhor para a nossa família, uma vida em que pudéssemos enfim seguir em frente e criar a Amy longe de todos os nossos traumas.

Eu tentei respirar fundo, a fim de acalmar cada um dos meus ânimos enfurecidos. Não podia deixar a raiva tomar conta de mim, não podia me tornar aquilo que eu tanto abominava. Gigi merecia alguém melhor do que isso, alguém que não fosse tão instável e que fizesse merda por um playboyzinho metido a besta feito Eric. Eu preciso voltar inteiro para as duas e mostrar a ela que ainda haverá motivos para ficar.

Decidi buscar refúgio em um pub, na esperança de encontrar um pouco de paz entre os estranhos e um copo de uísque. A chuva começava a cair lá fora, o som dos pingos contra as vidraças criava uma melodia quase tranquilizadora. Era um pensamento muito brega, algo que eu odiaria se tivesse forças, mas é como se o mundo estivesse chorando comigo, compartilhando a dor e a incerteza que eu sentia corroendo.

Sentado no balcão, pedi uma bebida forte. Aquele gole de coragem parecia necessário para enfrentar tudo o que viria a seguir. Enquanto a bebida queimava minha garganta, eu refletia sobre as escolhas que teria que fazer. Eu precisava encontrar Gigi e Amy e faria tudo ao meu alcance para deixá-las em segurança, entretanto, primeiro eu iria saber quem estragou tudo antes que eu resolvesse a minha vida.

ᴍᴇ, ʏᴏᴜ ᴀɴᴅ ᴏᴜʀ ʟᴏᴠᴇʀs (3)Onde histórias criam vida. Descubra agora