52 | a última vez.

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Quando as algemas foram retiradas e a porta da sala de interrogação finalmente se abriu, senti um alívio imediato. Estava livre daquele lugar opressor, de todas aquelas questões insuportáveis sobre o mesmo assunto. A sensação do metal frio sendo retirado foi libertadora, mas eu sabia que, apesar da liberdade física, ainda carregava o peso de uma verdade dolorosa. As palavras de Gigi ecoavam em minha mente, como uma despedida amarga. Era difícil aceitar que aquilo poderia ser o começo do fim para nós.

Sabia que aqueles momentos poderiam ter sido os últimos em que a vi, e o pensamento me deixava com um nó no estômago. O fim iminente pairava no ar, assombrando-me a cada respiração. Enquanto eu caminhava pelo corredor da delegacia, tentando manter a compostura, após ter assinado os termos para que o meu carro fosse liberado do depósito, pude sentir o peso de tudo o que havia perdido. O amor de Gigi, o orgulho da minha filha e, acima de tudo, a minha própria paz de espírito. Aquelas palavras doeram como punhaladas, deixando cicatrizes invisíveis em minha alma.

No entanto, havia algo ecoando em minha mente. Ben ainda estava internado no hospital, lutando por sua vida devido aos agiotas que o perseguiram implacavelmente. Eu não tinha tido a coragem de contar a verdade para o Tom sobre o que aconteceu nos últimos dias ou que o irmão mais novo e problemático dele está em Nova York, nos trazendo cada vez mais problemas como tem feito por todos esses anos.

- É um alívio te ver fora daquela sala. - disse Tom seguindo os meus passos até a saída e eu sabia onde aquela conversa iria. - É uma boa hora para contar a verdade.

Eu me virei, segurando a porta de vidro com uma das mãos: - Tom, é uma situação complicada demais para ser contada em detalhes agora, entende? Tenho que buscar o meu carro e dar um jeito nos problemas que eu trouxe para minha vida.

Ele assentiu, olhando para os próprios pés.

- É claro, tudo bem. Pode contar comigo.

- Obrigado por toda a ajuda e por ter chamado a Gigi, mesmo que a visita dela não tenha mudado tanto as coisas. - encolhi os ombros, complementando o sarcasmo na minha voz. Ser sarcástico é uma das poucas estratégias que me sobraram. - E obrigado também por aquela grana, prometo que quando tudo se acertar, eu lhe devolvo tudo.

- Não se preocupe com o dinheiro, Oliver. Eu tinha dito que era para você, lembra? - sorriu de leve, marcando as leves rugas no rosto cansado. - Imagino que você deve estar achando que tudo foi prejudicado e está com medo de ter as perdido, mas ainda há tempo. Uma noite não é nada comparado aos anos que fiquei longe da nossa família.

Eu tinha sido derrotado há poucas horas, estava desolado e ele me diz uma coisa dessas justo agora? Somente consegui assentir, tentando demonstrar resiliência diante dele, a mesma que ele me fez conquistar depois de ter nos largado em Londres. São situações parecidas, devo admitir, pois o vazio que sinto é idêntico ao que suportei quando criança. Tudo que eu lutei e construí aparenta nem ter existido. Eu me transformei naquilo que eu sempre amaldiçoei; a figura imatura de Tom Scott na vida das pessoas que eu mais amo.

Enquanto eu seguia em direção ao estacionamento, sentia a ansiedade começar a se instalar dentro de mim. O meu coração batia freneticamente, quase como um lembrete constante das consequências de minhas ações, em uma sincronia tão bem feita quanto o som da viatura se aproximando do pub para me buscar. Eu me sentia culpado, impotente diante dessa situação que eu mesmo havia criado.

Ao entrar no carro, hesitei por um momento. Sabia que não poderia mais adiar a conversa com Tom. Ele merecia saber a verdade. Até porque se não fosse pela quantia ofertada por ele, Ben poderia estar morto e eu seria o segundo corpo a ser arrastado pelos criminosos, entretanto não serei eu a pessoa contar os fatos. Quanto mais rápido tudo isso acabar, toda essa situação de merda terminar, melhor será para todos.

ᴍᴇ, ʏᴏᴜ ᴀɴᴅ ᴏᴜʀ ʟᴏᴠᴇʀs (3)Onde histórias criam vida. Descubra agora