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Gabriel

Sinto meu peito apertar cada vez mais forte dificultando a respiração. Procuro o ar que falta nos meus pulmões a todo custo, lágrimas insistem em cair no meu rosto mesmo que eu tente impedir.
Coloco o travesseiro no rosto abafando um grito sufocante. Hoje faz dez malditos anos do acidente e a culpa me corrói mais e mais.

Minhas pernas parecem não querer obedecer mas as forço a sairem da cama, viro o rosto pro lado e Lia dormia tranquilamente, ela apenas decidiu ficar no meu quarto. Diferente dela eu não consegui dormir direito.

Caminho até o banheiro e tranco a porta fecho os olhos com força sentindo as lágrimas quentes, encaro meu reflexo no espelho enxergando o quão horrível estou. As pálpebras inchadas de tanto que eu chorei nessa madrugada, sorte da Lia ter sono pesado assim pude ficar com a minha dor calado.

Minha respiração ficando cada vez mais escassa com meus pensamentos no dia do pior momento da minha vida.

"você a matou." É o que se repete na minha mente enquanto continuo me olhando pelo espelho. Com uma ansiedade e angustia tomando conta de mim levei a mão ao vidro o quebrando, sangue começou a escorrer pela minha mão.

Quando finalmente me acalmo, entro no box e tomo um banho demorado a água geleada tirando metade da tensão dos meus músculos. Inspiro pelo nariz e expiro pela boca. Termino o banho e vou até o closet vestindo uma roupa confortável. Já se passava das sete e obviamente eu não iria acordar Lia, ela precisava descansar depois do que aconteceu com o pai- embora ele esteja bem.

Fiz um curativo péssimo na mão mas bom o bastante pra acabar com aquele sangue.

Relutando dou um beijo na testa de Lia afastando uns fios de cabelo, ela se remexe e eu sinto um frio na barriga por pensar que iria acordar, porém só virou pro outro lado.

-Que eu saiba ainda é sexta feira e você tem faculdade.-A voz grave do meu pai ecoa atrás de mim me fazendo paralisar.

Suspiro pesadamente me virando pra ele.

Tudo que eu preciso hoje é de paz e não será em uma sala com um tanto de pessoas de mau humor que irá me deixar feliz.

Ficamos em um silêncio absurdamente horrível. Meu pai me encarando profundamente por saber exatamente que dia é hoje.

-Nós vamos ficar nessa conversa silenciosa ou eu já posso seguir meu caminho?- Tento ao máximo usar um tom sarcastico.

-Vai você nunca tem nada de responsável pra fazer mesmo-dá de ombros.

Balanço a cabeça.

-Você ao menos vai se interessar pra saber aonde eu estou indo e o que vou fazer?- Tento o que posso não deixar minha voz vacilar.

Meu pai rir, uma risada irônica. Engulo em seco sabendo a resposta.

-Sempre ocupado, não tem tempo pra saber o que o filho faz- digo por fim dando as costas.

Entro no carro e saio cantando pneu em menos de cinco minutos já estava no meu destino. Como em todos os anos faço fico apenas em silêncio diante da lápide, me martilizando cada vez mais pelo ocorrido.

Muitas pessoas só reconhecem o valor do outro e dizem que amam apenas quando o perdem. Não vou me glorificar por dizer que sempre fiz isso quando minha mãe ainda era viva. Contudo, a dor é pior do que ter perdido ela sem ao menos ter tido um "eu te amo", dor que eu mesmo causei.

-Se... Se você ainda estivesse aqui sentiria algum orgulho de mim?-Engulo com dificuldade o nó que se formava na minha garganta.- Obviamente não, já que sempre dei motivos pra esse sentimento nunca ocorrer- olho pro céu piscando afastando as lágrimas.

O Filho Do Meu PadrastoOnde histórias criam vida. Descubra agora