05 - tudo volta

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Eu saí com Daryl e Michonne para ir atrás do leite em pó de Judith. Já falei com o antigo povo de Woodbery, e eles aceitaram o que aconteceu, sabiam que era para o bem deles, pelo menos de alguma forma, era. E então está resolvido, ou talvez resolvido entre aspas, já que minha consciência insiste em me dizer que eu sou uma pessoa ruim por tudo o que fiz em Woodbery pelas ordens de Philip.

Daryl está no volante, Michonne no banco do passageiro e eu atrás. Assim que chegamos, descemos do carro e caminhamos para dentro de uma cafeteria chamada Coffe Jon's, e por incrível que pareça, o letreiro em frente ao comércio ainda estava intacto, não parecia haver nem mesmo poeira. O mapa indicava três lugares possíveis de ter o que procurávamos, e essa cafeteria era a primeira. Lá dentro, procuramos entre as prateleiras da dispensa do lugar, a arma em minhas costas e Daryl no mesmo corredor que eu.
— eles aceitaram tranquilamente? — eu me surpreendo por Daryl ter puxado algum tipo de assunto comigo. Ele não parece um homem de muitas palavras, principalmente quando se trata de mim, e eu queria entender o porquê.

— sim, eles entenderam. — eu me viro, achando que encontraria olhos azuis virados para mim, mas ele continua mexendo nas prateleiras, de costas.
— isso é bom. — ele diz sem me encarar.
— sim... Eu acho. — eu dou de ombros, e depois me viro completamente para ele. — Daryl. — eu chamo, e ele se vira, me encarando por alguns segundos antes de voltar a olhar entre as prateleiras. Daryl parece sempre evitar meus olhos.

— o que? — ele pergunta, balançando uma lata de achocolatado para ver se está vazia, e está.
— deixe-me ver esse corte, você não vai querer uma infecção em um apocalipse. — eu insisto. Por um momento, me acho um pouco intrometida demais, aliás, a responsabilidade é dele, e não minha. Essa eterna mania de cuidar dos problemas dos outros. Minha mente murmura para mim dentro da minha cabeça, mas eu ignoro, ainda disposta a ajudar Daryl.

— não precisa. — ele finalmente se vira para mim, definitivamente.
— sim, precisa. — eu respondo. Uma vez, minha irmã, Sarah, me disse que às vezes, as pessoas duras só precisam de alguém que insista tanto em algo que amoleçam seu coração. Daryl é uma pessoa dura, e estou tentando descobrir se de algum jeito, ele pode amolecer um pouco, e se ao menos ele me desse um pouquinho de espaço para insistir, seria mais fácil. Pessoas duras não são fáceis, mas o segredo é que, as melhores pessoas são assim, porém escondem o quão boas e incríveis são, por debaixo de uma capa, entre muros que eles constroem em volta de si mesmos, para se proteger, até que alguma pessoa seja gentil o suficiente para pedir para entrar, ou louca demais para tentar pular os muros. As melhores pessoas são duras, as melhores pessoas se escondem.

Ele bufa, me encarando e depois muda o olhar para prateleira atrás de mim. — Quando voltarmos. — ele finalmente cede, caminhando para o outro corredor, e eu sorrio. Segui a profissão da minha mãe, que era uma cirurgiã de mãos cheias, porque realmente gosto de ajudar os outros, e poder ajudar Daryl seria algo para jogar na cara dele caso ele fosse um bacaca comigo algum dia, o que não seria impossível. Eu posso não ser uma cirurgiã, até porque não tive muito tempo para me tornar uma. O apocalipse começou a uns dois anos atrás, eu tinha vinte e três anos, tinha acabado de entrar em uma faculdade decente depois de conseguir uma bolsa em um vestibular, e aí, o mundo virou de cabeça para baixo, e eu perdi tudo.

Eu não tenho medo de palavras que machuquem ou de xingamentos quando se trata de amolecer alguém. Foi assim com a minha irmã, e pode ser assim com qualquer pessoa que eu acabe gostando, que eu acabe vendo em seus olhos quem realmente é. E eu acho que tenho algumas tendência de achar as pessoas duras e fechadas, um pouco mais legais.

— tudo bem. — eu respondo mais para mim mesma do que para Daryl quando eu passo na frente do corredor onde ele estava e vou para o seguinte, onde encontro Michonne.
— não tem nada aqui. — ela bufa, parecendo desanimada, talvez até frustrada, eu diria.
— vamos procurar até encontrar. Judith merece viver mais, ela precisa. Nós vamos encontrar. — eu digo, e Michonne me encara. Às vezes eu penso sobre o meu otimismo. Talvez eu não devesse ver tudo pelo lado bom, eu posso acabar me frustrando muito por tentar enxergar o mundo de um jeito que ele não é.
— eu penso sobre isso. — ela diz. — Não é justo. Todas as crianças, perdendo suas infâncias, tendo que ser fortes desde tão novas, tendo que perder a sua inocência sobre o mundo tão cedo, para não morrer. — ela diz, e eu a encaro, por um momento, me lembrando de tudo que ela fez em relação ao Governador e admirando a força daquela mulher, ela definitivamente é a mulher mais forte que eu já conheci.
— isso é muito terrível, mas é assim agora, infelizmente. — eu respondo.
— infelizmente. — ela concorda.

Blue Letter - Daryl Dixon Onde histórias criam vida. Descubra agora