I

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Uma brisa morna agitava levemente os cabelos avermelhados de Kelvin, enquanto o baixinho andava pela beira daquele lago que estava marcado em sua vida para sempre. Com a cabeça cheia de pensamentos que o rondavam há dias, o rapaz sentiu necessidade de sair para caminhar um pouco, afastar-se da balbúrdia do Naitendei. Quase sem perceber, foi parar junto daquele lago que o trazia lembranças tão conflitantes... Ramiro não era mais o ogro que o jogara na água com agressividade meses atrás, isso era verdade. A cada dia, um homem doce e carinhoso emergia mais daquela casca de brutalidade que o peão fora obrigado a desenvolver no decorrer da vida. E esse lado delicado e amoroso do seu Rams era muito mais apaixonante do que todos aqueles músculos avantajados, do que seu sorriso largo, do que aquele jeito de menino inocente que aparecia principalmente quando estava com seu Kevinho.

Apesar de todos os avanços que tiveram, o cantor sentia-se cada vez mais sem paciência para aquela rotina de "bater na trave" a cada encontro. Estava ficando impossível resistir aos lábios carnudos e sensuais do moreno, e ao desejo que consumia seu corpo... na verdade, consumia aos dois, ele percebia. Kelvin queria respeitar o tempo de seu Rams, mas sentia que estava muito perto do seu limite. As palavras "macho" e "amigo" chegavam a agredir seus ouvidos. Será que valia a pena todo esse esforço? Era o que o loiro se perguntava, enquanto se ajeitava junto ao tronco de uma árvore. Esticou as pernas, e fechou os olhos, deixando escorrer uma lágrima, não de tristeza, mas de uma espécie de exaustão.

Quando abriu os olhos novamente, o rapaz percebeu uma sombra se aproximando. Levantou a cabeça e viu Ramiro, de testa franzida:

- Kevinho? Ocê tá passando mal? - perguntou o peão, já descendo um joelho no chão e levando sua mão grande ao rosto do pequetito.

- Não, só vim pensar na vida um pouco... - o cantor tentou desconversar.

- Eu fiz arguma coisa errada? - o moreno coçou a barba, tentando encontrar onde teria falhado dessa vez.

- Não, Rams, não fez... o problema é justamente o que você não faz... - o desabafo do mais novo saiu em um tom amargo.

- O que qui ocê qué qui eu faça, Kevinho? - Ramiro parecia um cachorrinho perdido numa procissão - Eu tô indo na psecológica, como ocê mandô, tô estudando, to deixando ocê ir no quartinho quando qué... Num tá bom?

- Ah, você não sabe? - Kelvin disparou com sarcasmo.

- Eeeeê - o peão ficou sério - Ocê tá falando de safadeza, né? Mas eu sô macho...

O cantor o interrompeu com raiva:

- Chega, Rams! Chega de repetir que é macho! Não aguento mais!

O moreno arregalou os olhos, assustado com aquele rompante:

- Por que ocê tá gritando assim?

As palavras saíram sem controle da boca de Kelvin:

- Porque eu tô cansado de você fugir do que sente se escondendo nessa ideia fixa de ser macho... Porque eu tô cansado de esperar que você esteja pronto, e me frustrar todo dia... Porque eu to cansado de saber que a gente se ama, e não ter nunca um beijo seu!

- Mas beijo não é coisa de... - Ramiro interrompeu a frase, antes mesmo de receber o olhar fuzilador do loirinho. Realmente, aquela defesa não cabia mais entre eles, e o peão sabia disso, só vinha desesperadamente fugindo da verdade - Não importa - ele murmurou, sentindo uma coragem inédita, e encarou o cantor - Eu amo meu Kevinho, amo muito - balbuciou enquanto se aproximava devagar, e finalmente tocou os lábios do outro com os seus, primeiro de um jeito inseguro, depois foi abrindo um pouco a boca e entregando-se ao momento.

Kelvin sentiu o corpo todo amolecer, e Ramiro trouxe o pequetito para mais junto de si, em seguida espalhou delicados beijos pelo rosto todo do loirinho, descendo pelo pescoço e voltando até os lábios, onde parou por um instante, como se quisesse gravar o sabor. Depois recuou um pouco, olhando bem nos olhos do amado:

Garradinho, garradinho...Onde histórias criam vida. Descubra agora