XVII

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Ramiro engoliu em seco, precisando de alguns instantes em silêncio para encontrar uma resposta, que na verdade foi uma pergunta:

- Ocê não tem medo?

- Tenho. Mas confio no nosso amor e no respeito que você tem por mim - Kelvin respondeu com uma segurança que fez o grandão se desamar e retrucar de um jeito doce:

- E eu não preciso oiá pra mais ninguém pra sabê que ocê é o pequetito mais bonito do mundo todinho.

O mais novo sorriu e acarinhou aquela barba que gostava tanto, enquanto explicava:

- Você que é o grandão mais lindo do mundo... Mas as outras pessoas não ficaram feias por causa disso, né? Olha pro Rodrigo. Ele é um homem muito bonito. E eu reconhecer isso não é errado nem com você nem com a Lu.

O moreno ficou pensativo e depois de alguns instantes, balançou a cabeça afirmativamente:

- É, o dotor parece que foi desenhado por um artista, tem os traço muito bem feito. Qui nem ocê, só que escuro.

- Viu? Agora olha pro moço do pandeiro.

Ainda inseguro, Ramiro espichou o olhar na direção da roda e observou todos os músicos. Realmente o percussionista se destacava, embora todos fossem bonitos de alguma forma. E era agradável olhar para eles, dava um calor no peito. Ele sabia que já tinha sentido isso várias vezes, mas nunca tinha aceitado dessa forma. Entendendo que os rapazes atraíram seu olhar muito mais do que as moças. Assimilando uma verdade da qual fugiu a vida inteira, até Kelvin aparecer e tornar a resistência algo a cada dia mais difícil. Com um olhar meio atordoado, Ramiro encarou o marido de novo:

- Inté parece que ocê me conhece mais do que eu mesmo - murmurou, com um leve sorriso de quem estava encontrando uma paz nova dentro de si.

- Acho que eu vejo as coisas que você esconde de si mesmo, sempre vi. Mas você também me fez descobrir um novo Kelvin... que merece o amor - o baixinho soltou um suspiro.

- Claro que merece, pequetito! - o mais velho puxou o amado para mais junto de si, buscando os lábios dele para um beijo carinhoso, depois afastou um pouco o rosto de novo, o suficiente para olhar nos olhos - Nunca mais duvida disso. Ocê é o amor da minha vida.

- E você da minha - Kelvin mergulhou o rosto no peito grande do esposo, se esfregando como um gato, para em seguida virar-se e olhar para a roda, que começava uma música bem conhecida.


Os dias no Rio de Janeiro foram maravilhosos, mas eles precisavam voltar para casa. Ao abrirem a porta, foram recebidos com miados fortes e o gatinho esfregando-se nas pernas de ambos, alternando entre um e outro. Ramiro largou a mochila de qualquer jeito e levantou o bichinho, deixando que se aninhasse em seus braços

- Papai também tava com saudade, fiote - ele beijou a cabecinha peluda e esfregou o rosto, recebendo uma lambida áspera de Bob.

- Papaizinho aqui também, viu? - Kelvin deslizou a mão da cabeça para a coluna do bichano, que ronronou com força. Parecia até estar sorrindo.

O maior soltou um suspiro:

- Eu nem sabia que tava com tanta saudade desse piquititinho... Nunca que tive ninguém me esperando voltá pra casa, sabe? Quando chegava do serviço, era só eu e Deus. Daí conheci meu Kevinho - ele olhou para o marido com um sorriso emocionado, depois contemplou o gatinho em seu colo - E agora tem nosso fiote.

- Nossa família linda! - derreteu-se o mais novo, deixando as malas e os sapatos num canto e indo até a cozinha, onde foi abrindo os armários - Tô morrendo de fome, Rams... Vamos jantar, depois a gente descansa? Tem macarrão e molho de tomate - ele avisou, erguendo os pacotes.

Garradinho, garradinho...Onde histórias criam vida. Descubra agora