XII

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Kelvin conduziu a amiga para a sala, e indicou que colocasse a caixa na mesa de centro. Quando o rapaz abriu, eram roupas que ele já tinha deixado de usar antes de se tornar Kelvin Star. Os shorts mais curtos, os croppeds com recorte de coração. Nada disso ele tinha levado quando foi pro exterior. Já vinha usando roupas mais fechadas há tempo, evitando se expor como mercadoria à venda. Antes mesmo da carreira musical, o rapaz já sentia que estava encerrando um ciclo na vida. E quando voltou da turnê, veio com roupas todas novas, o antigo Kelvin tinha ficado no passado.

- Ah, Lu, pode doar tudo. O Kelvin que usava essas roupas não existe mais. E nem gosto de lembrar, na verdade - ele soltou um profundo e dolorido suspiro.

A amiga olhava para o rapaz com cumplicidade:

- Entendo bem. Quem chama de "vida fácil" não tem ideia do que a gente passa, né?

- Pois é. Como a gente conseguia se vender pra qualquer um que pagasse uma mixaria? - o loiro até fechou os olhos por um instante.

- Quando a fome e o medo de morar na rua estão junto da gente, nossos critérios ficam mais rasos do que um pires. - filosofou Luana com um olhar distante.

- Casou com um advogado e aprendeu a falar bonito, hein, amiga? - Kelvin conseguiu relaxar a expressão.

- O Rodrigo adora ler, e eu to pegando o hábito também - a mulher sorriu com orgulho.

- Fico feliz com isso - o cantor ficou pensativo - A sua frase também se aplica ao Rams, percebeu?

- É... De outra forma, ele também se vendia, por necessidade. Ainda bem que todos nós conseguimos liberdade - Luana suspirou de um jeito aliviado.

A conversa foi interrompida pela chegada de Ramiro, que entrou indo direto dar um beijo do marido, um daqueles selinhos estalados que eles adoravam.

- Meu pequetito, tá bão? - questionou ao ver uma sombra no olhar do mais novo.

- Tô sim, amorzinho. Conversando aqui com a Lu - garantiu Kelvin com um leve sorriso.

Só então o moreno olhou para a visita:

- Boa tarde, Luana. Bem vinda na nossa casa.

- Obrigada, Ramiro. Vim só trazer pro Kelvin umas coisas dele que ainda estavam no bar - ela explicou, enquanto admirava o quanto os dois rapazes eram lindos juntos.

O maior observou as roupas espalhadas pelo sofá, ficando com um olhar nostálgico:

- Ah, ocê ficava tão formoso com essas brusinha colorida. A cinturinha de fora, só esperando meus apertão - deu uma risadinha - E os shortinho quase mostrando o traseiro... esses eu não gostava muito, porque ficava todo mundo de olho na tua bundinha.

- Era essa a intenção, né? - embora o loiro tenha tentado retrucar com ironia, a frase saiu meio áspera - Mas eu fazia isso pra sobreviver, pra ganhar meu pão de cada dia. O Naitandei foi o único lugar que me acolheu, quando toda a cidade me tratava como aberração. Fazer a vida não foi uma opção, foi a única oportunidade que eu tive. E se eu precisava trabalhar nisso, tinha que ser bem feito. Teve épocas em que eu fiz um bom dinheiro, viu? Mesmo assim, não tinha um dia em que eu não pensasse que o que eu queria mesmo era casar e ter uma vida tranquila, com muito amor.

- Acho que você projetou tanto isso, que aconteceu - Luana sorriu, comovida.

- É... - o mais novo encarou o marido com olhar apaixonado, que foi retribuído.

O ex-peão acarinhou os cabelos do esposo:

- Eu sei a vida que ocê levava quando nóis se conheceu... E te amei do mesmo jeito, assim como você me amô apesar de tudo de ruim que eu fazia. Mas agora esse traseiro é só meu! - Ramiro deu um risinho sapeca.

Garradinho, garradinho...Onde histórias criam vida. Descubra agora