Os estímulos bilaterais são componentes essenciais do EMDR (Eye Movement Desensitization and Reprocessing), mas eles precisam da estimulação alternada dos dois hemisférios cerebrais para ajudar no reprocessamento adaptativo de memórias perturbadoras. Eles podem ser visuais, como movimentos oculares de um lado para o outro, táteis, construídos por toques alternados nas mãos, ou auditivos; uso de tons diferentes nos fones de ouvido.
Os estímulos bilaterais são geralmente realizados enquanto você está focado no pensamento ou na memória que deseja processar. Durante uma sessão de EMDR, eles são usados para acessar e reprocessar a memória traumática, facilitando a integração de informações e emoções associadas a ela e promovendo a resolução do problema.
— Identifique o alvo — pediu Giulia, — e foque na memória traumática.
— Certo — respondeu Vinícius.
— Concentre-se na memória e nas sensações físicas. Quero que você preste bastante atenção nas sensações bilaterais.
— Sim.
Após a morte do pai, o quadro de ansiedade de Vinícius disparou e ele começou a ter insônia. Durante a consulta, Giulia pensou no que poderia fazer para ajudá-lo. Nesse processo, ela precisou recorrer à terapia EMDR.
— O medo de não conseguir dormir é um dos que mais mantém a insônia. — disse Giulia. — Então prepare-se mentalmente. Crie um ambiente seguro e confortável em sua cabeça.
— Estou criando... — respondeu Vinícius.
— Recorde situações em que esse medo esteve presente e concentre-se nas emoções e sensações físicas associadas a ele. Depois reconheça os pensamentos negativos que surgem quando você está enfrentando a ansiedade. Quais são eles?
— Pássaros cantando, nascer do sol, luz entrando no quarto...
Giulia pediu que Vinícius se expusesse ao medo de não conseguir dormir, enquanto direcionava sua atenção para os estímulos bilaterais; movimentos oculares e áudios. Enquanto fez isso, ela permitiu que os pensamentos e emoções dele fluíssem.
— Cultive pensamentos positivos sobre sua capacidade de lidar com as dificuldades relacionadas ao sono. — Giulia lhe incentivou. — Visualize-se dormindo tranquilamente e acordando revigorado no dia seguinte.
— A ansiedade está vindo. Não consigo controlar...
— Não tem problema. Relaxe, se houver qualquer tensão física. Respire e solte os músculos.
Giulia encerrou a sessão de forma adequada, retornando o paciente ao seu estado de equilíbrio. Dias depois, ela o treinou para que realizasse os mesmos passos em si mesmo.
É recomendável que a terapia EMDR seja instruída por um profissional capacitado, que possua certificado para atuar neste campo. Porém, se não houver outra opção, sim, é possível fazer autoterapia.
Primeiro, deite-se confortavelmente em um lugar tranquilo, onde você não será interrompido. Estenda os braços na sua frente, mantendo-os relaxados. Use os dedos de uma mão para bater levemente e alternadamente na palma da outra mão. Toque a palma direita com os dedos da mão esquerda e faça com a outra. Fixe na sensação do toque e mantenha uma respiração calma e regular. Enquanto alterna os toques, mantenha sua atenção na memória ou no pensamento que está trabalhando. Continue até que a emoção associada à memória diminua ou se torne mais fraca.
Os áudios devem ser uma maneira conveniente de aplicar os estímulos bilaterais durante uma sessão de EMDR. Geralmente, eles proporcionam a estimulação bilateral necessária para o processamento adaptativo da memória. É possível encontrá-los de forma online, alguns são criados por profissionais de saúde mental qualificados no assunto. Durante a sessão, ouvi-los enquanto foca na memória é importante para maximizar os benefícios da terapia.
Durante uma sessão de EMDR, o movimento dos olhos pode ser realizado tanto com os olhos abertos e fechados, dependendo da preferência do paciente e da prática do terapeuta. Ambas as abordagens são comuns e eficazes. Alguns preferem manter os olhos fechados para se concentrar nas sensações internas. Outros preferem manter os olhos abertos, almejando uma conexão maior com o ambiente ao seu redor e as memórias.
Eu cunhei o termo "Resistência para Felicidade", após um dos pacientes de Giulia descrever como estava se sentindo ao tentar evocar lembranças positivas. Esse paciente disse o seguinte, em sua consulta:
Estou tentando pensar em um lugar calmo e tranquilo, mas não consigo. Sinto que nenhum lugar pode me acalmar por completo, pois sempre me sinto insegura e sozinha. Sempre penso que algo ruim possa acontecer, enquanto estou idealizando uma vida perfeita.
Não é só o medo de não conseguir dormir que tira o meu sono. A solidão, ansiedade, sentimento de impotência e medo de perder algum familiar também. No entanto, diferentemente do medo de não conseguir dormir, esses outros medos são controláveis. Significa que eu consigo ressignificá-los. Porém, quando o medo de não conseguir dormir bate na porta com força, é quase insustentável e me leva a ter pensamentos intrusivos.
Então eu me pergunto qual memória traumática do medo de não dormir é a pior. Um dia, eu estava desconfortável por acordar no meio da noite achando que já tinha dormido o bastante e só dormi duas horas. Foi frustrante demais.
Até a sequência das minhas lembranças estão meio confusas. Na noite anterior à minha crise de pânico, eu já vinha acordando de madrugada. Nos dias seguintes, tentei dormir mais cedo e não consegui pegar no sono. Ele simplesmente não veio. Fiquei preocupada, já que isso nunca aconteceu. Não sei qual é a pior lembrança. Se foi eu vendo o canto dos pássaros e o dia amanhecendo, ou se foi a minha mãe preocupada... é difícil eleger a pior. A perturbação é intensa, cerca de 9/10. Eu me sinto fraca, como se não pudesse bater em ninguém, dar soco em ninguém.
Essa paciente fez o estímulo bilateral junto com as imagens perturbadoras. As memórias que vieram foram dela atravessando a cozinha para olhar seus olhos no espelho, conversando com os gatos, assistindo televisão, indo na cozinha, vestida de preto, e tirando fotos. Algumas fotos. Nesse momento, já estava melhor, pois queria postar algo nas redes sociais. Por último surgiu sua imagem dormindo melhor do que antes.
Ela seguiu todos os passos da EMDR e obteve resultados positivos. Ainda havia resíduos, mas quando pensava nas piores noites de sono, também pensava nas melhores noites.
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Psicologia em Jogo
Ficção CientíficaNeste livro, os problemas do mundo moderno são abordados de uma forma leve e criativa. Os autores sugerem quais as melhores estratégias para conseguir superar os desafios, gerir o tempo e a saúde mental, e como ser emocionalmente inteligente. Ser fe...