ATO II (Réslar)
Máterum, o ser que outrora conheci como pai, agora se revela diante de mim, transformado pelo peso das décadas. Sua outrora barba amarronzada agora é um mosaico grisalho, fios prateados se misturando aos poucos vestígios de sua cor original. Essas mechas prateadas não apenas adornam seu rosto, mas também fluem em seu cabelo, lembrando a neve inexplorada dos picos mais altos, uma brancura pura e imaculada. Sua estatura parece ter crescido, um reflexo de sua presença ainda mais dominante.
Máterum veste-se com simplicidade, uma túnica bege que flutua ao seu redor, não necessitando de ornamentos para afirmar sua grandiosidade. Sua postura é a de um monarca sem coroa, cuja a verdadeira realeza reside em sua presença, não em símbolos materiais. Máterum é a encarnação do todo; poderoso, indomável e eternamente enigmático.
- Como você nos encontrou? - Questiono, com minha voz trêmula traída pelo medo crescente. Recuo, tropeçando nas pedras irregulares, enquanto tento manter a distância de Máterum. A incerteza me envolve como uma névoa densa, e minha mente gira com perguntas sobre como ele poderia ter descoberto nosso esconderijo.
Máterum, imponente e tranquilo, desce a pedra arenosa com lentidão, cada passo é medido. Ele ignora minha pergunta, sua expressão inescrutável como se estivesse além de meras preocupações terrenas, enquanto se aproxima de mim.
- Onde está tua irmã? - Ele pergunta, sua voz tranquila como uma brisa suave, mas com uma autoridade que não admite desobediência.
Eu o encaro, um turbilhão de emoções agitando meu interior. O medo por Lésnar, a preocupação com sua segurança, a frustração por não ter uma resposta satisfatória para ele. Sinto-me como uma presa acuada, cada opção se desvanecendo diante do olhar penetrante de Máterum.
Suas palavras, embora suaves, ressoam com um peso que me prende no lugar. Sinto um impulso de proteger minha irmã, de desviar a atenção de Máterum dela, mas ao mesmo tempo, sou consumida pela incerteza e pelo temor do que ele pode fazer. Minha respiração se torna irregular, e um nó se forma em minha garganta.
Máterum espera, paciente, a resposta que ele sabe que virá. Seu olhar não se desvia do meu, e cada segundo sob seu escrutínio parece uma eternidade.
Sob o olhar de Máterum, repleto de uma seriedade imponente, percebo um vislumbre de algo mais profundo, algo que ele tenta esconder. Seus olhos cinzentos, testemunhas de inúmeras eras, brilham com reflexos de lembranças antigas. Uma melancolia sutil se destaca em seu olhar, um indício de emoções que ele luta para manter ocultas.
Enquanto encaro esses olhos, uma chuva de sentimentos me assola. Amor e ódio se entrelaçam em meu coração, um conflito interno refletido no meu olhar.
- Ela está a salvo, longe daqui! - Afirmo com uma voz firme, mas internamente vacilo, ciente da minha dualidade presente naquele momento.
Máterum parece ignorar a dureza nas minhas palavras. Ele estende a mão em minha direção, os dedos quase tocando meus cabelos. Nesse gesto, vejo um vislumbre do pai amoroso que ele costumava ser, uma ternura que há muito não vejo.
Eu encaro a mão dele, lutando com os sentimentos conflitantes que agitam meu coração. Uma parte de mim anseia por ceder àquela ternura paternal, deseja sentir o amor e a proteção que apenas Máterum poderia oferecer. No entanto, o rancor e a mágoa que carrego formam uma barreira invisível. Eles me mantêm alerta, relembrando as feridas que ele causou ao longo dos anos.
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As Crônicas de Marum - O Primordial
FantasíaNeste fascinante épico mitológico, mergulhamos no início dos tempos, onde o Universo nasce de uma união transcendente, emergindo como uma entidade de poder e consciência absolutos. Em meio à vastidão do nada, ele enfrenta a solidão primordial, dando...