Visitante indesejado - Parte I

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ATO I (Void)

“Finoim, o limbo dos imortais. A vida, o juiz. A morte, o carrasco. O  Vazio surgindo para dialogar. Sua vinda, não sendo singular, porquanto voltará; embora na última regressão, não mais retornará.”

O ambiente feito da escuridão mais pura, tão densa engole o vestígio da luz. Flutuo perdido no eterno fim.

O cheiro que invade minhas narinas é estranho, mistura de terra molhada com algo metálico, quase como o cheiro de sangue. Esse aroma me deixa desconfortável, aumentando minha sensação de apreensão. O silêncio ao meu redor é quase ensurdecedor, mas, de vez em quando, penso ouvir sussurros, como se vozes estivessem tentando se comunicar comigo através do vento.

Tento dar um passo, mas o chão sob meus pés é pegajoso, como se caminhasse sobre areia movediça. Sint resistência a cada movimento, como se algo tentasse me puxar para as profundezas da escuridão.

De repente, dois olhos magenta emergem da escuridão, observando-me intensamente. Eles são tão vastos que preenchem todo meu horizonte. Sinto como se estivessem lendo minha essência, julgando cada parte de mim.

Profunda e ressonante voz ecoa ao meu redor: — Visitaste-me cedo demais! — Ela declara.

Tento encontrar minha voz, que sai trêmula e incerta. — Onde estou?

A voz responde, soando como se viesse das profundezas da terra: — Estás no limiar entre a vida e a morte, no abismo que separa o conhecido do desconhecido.

Engulo em seco, tentando reunir coragem. — Por que estou aqui?

A escuridão parece ponderar por um momento antes de responder. — Tua vinda a mim é benção de minha amada[CG1]  — sua voz soando antiga e cheia de conhecimento. — Conquanto, tens um destino a cumprir, um papel a desempenhar no grande teatro do cosmos.

— Não compreendo... — murmuro, sentindo-me como uma criança perdida enquanto os olhos magenta me observam com curiosidade.

— Em breve, tudo ficará claro. Mas agora, leva esta mensagem a Marum: meu filho nunca esteve, e nunca estará, sozinho nas vastidões do cosmos — decreta o ser com solenidade que faz o espaço ao redor vibrar.

E então, com uma força avassaladora, sou puxado para trás, como se sugado por um buraco negro. Tempestade de cores e sons me envolve, e a última coisa que vejo são os olhos magenta desaparecendo na distância.

ATO II

Ao despertar, sensação de desorientação profunda toma conta de mim. Meu corpo parece flutuar entre dois mundos, o do sonho e o da realidade. Há um peso em meu peito, como se uma âncora me puxasse para baixo; luto para respirar, cada inspiração sendo um esforço consciente.

Fisicamente, sinto formigamento que percorre todo o meu corpo, como se milhares de agulhas finas me picassem simultaneamente. Meus músculos tensos e doloridos, e há um gosto metálico em minha boca, remanescente do cheiro de sangue que senti em Finoim. Pisco várias vezes, tentando me ajustar à luz, e sinto uma pressão atrás dos olhos, quase como o início de uma cefaleia.

O encontro com a Escuridão deixou marcas não apenas físicas, mas também emocionais e psicológicas em mim. Sinto frio residual, mesmo em um ambiente quente, e calafrios ocasionais percorrem minha espinha, como se a escuridão ainda me tocasse de alguma forma. Meu coração bate de forma irregular, acelerando e desacelerando sem motivo aparente.

A Escuridão, com seus olhos magenta penetrantes, ainda assombra minha mente. Cada vez que fecho os olhos, a imagem daqueles olhos me observando retorna, e posso ouvir ecos daquela voz profunda e ressonante.

As Crônicas de Marum - O PrimordialOnde histórias criam vida. Descubra agora