- Vai dormir, Lu, já tá tarde - olhei o celular e já eram quase três horas da manhã. Eu teria que acordar às 7h para ir à aula.
- Não quero deixar você sozinha - reclamei antes que ela dissesse mais alguma coisa.
- Você tem aula já já, eu vou ficar bem. Tenho que levar meu avô amanhã cedo na clínica também.
- Tá com sono?
- Tô quase ficando - ela me disse enquanto bocejava.
- Vai me ligar amanhã?
- Se eu já não viajar, sim, no mesmo horário - deixei escapar um sorriso. Ela já estava há uma semana em São Luís, e todas as noites ela me ligava por volta das 22 horas. Eu não cheguei a dizer a ela, mas no dia que conversamos até as 5 da manhã, não consegui acordar para ir para o hospital e acabei faltando. Se eu falasse, era possível que ela desligasse antes mesmo das 23 horas - Tô com saudade de você.
Era a primeira vez que eu dizia aquilo, e com certeza, o mais estranho era que eu falava normalmente, com naturalidade.
- Logo eu volto.
- Boa noite, Valen.
- Beijo, princesa.
E então a ligação foi encerrada. Olhei pela janela e a rua estava completamente deserta, as folhas das árvores eram arrastadas com tranquilidade pelo vento da madrugada. Era estranha a forma como eu sentia saudade dela. O celular vibrou iluminando a cama com o toque de trovão nas configurações, fiquei torcendo para que não fosse Bruno dizendo que tinha acordado pensando em mim. Ele não entendia que eu não queria, por mais que eu falasse.
"Sempre que tenho essas horas conversando contigo, consigo me sentir melhor pelo dia todo. Obrigada pela companhia. Hoje foi estranho, quando me deitei na cama pra te ligar consegui sentir o cheiro que vem dos teus cabelos e foi como me sentir na segurança da minha casa, ou como da vez que dançamos juntas (deveríamos repetir). Obrigada pelas madrugadas. Queria tanto um abraço seu agora. Boa noite, Lu, logo eu volto. <3"
Respirei fundo. As palavras dela sempre tinham um efeito imediato de paz que eu sinto quando vou dançar, a paz que somente a bachata me trazia, que não era frequente. Era a sensação mais gostosa do mundo, reli por vezes seguidas até adormecer com a sensação de ouvir a voz dela me dizendo boa noite.
"Vem cá, amor"
Ela se aproximava de mim ao ponto de eu sentir a respiração dela no meu rosto. Puxei Valentina pela nuca e alcancei sua boca, puxando seus lábios para mim, e a vendo sorrir.
"Mais..."
Ela dizia antes de tomar meus lábios para ela, enquanto sua mão deslizava em meus cabelos e meu corpo se aproximava do dela cada vez mais.Minha respiração estava acelerada. Abri e fechei os olhos seguidas vezes até ter certeza de que era apenas um sonho. Olhei pela janela e podia ver os rastros de luz passando pela brecha que a cortina deixava. O celular ainda estava em minha mão e joguei-o de uma vez enquanto passava a mão pelo rosto. Nada disso fazia sentido algum. Será que esse meu carinho por ela era somente amizade? Ou meu subconsciente estava me avisando que lá no fundo eu queria aquilo? Eu estava ficando louca. Queria me livrar de tantos pensamentos errados. O celular não demorou a despertar e eu me arrumei para ir para a aula. Meu pai estranhou quando me viu tão cedo preparando o café da manhã.
Como de costume, nesse dia eu tive apenas fechamento da tutoria que se iniciou em conjunto com a semana. Era básico e muito eficiente, apesar de cansativo. No intervalo, Duda resolveu almoçar comigo. Poderíamos conversar. Ela estava vestindo um de seus vestidos estampados como de costume.
- Duda, faz quanto tempo que você tá se relacionando com esse cara?
- 6 meses - ela disse com cara de paisagem.
- Como foi o primeiro beijo de vocês?
- Não me lembro, eu tava morta de bêbada.
- Você gosta dele?
- É, até que eu gosto sim, mas não acho que seja algo sério assim.
- E como você soube que gostava dele?
- Ele sempre me dava coxinha e refrigerante. No dia que ele não foi me ver, eu chorei, nunca soube se era por causa dele ou por causa do lanche mesmo, mas não quis descobrir - ela sorriu fraco e eu ri junto. Fiquei calada pensando nas respostas dela, até que ela quebrou o silêncio - tá com saudade da namoradinha?
- Eu tenho sonhado com a Valen com muita frequência.
- Amiga, só vai. Se rolar, deixa acontecer, vive o momento, a sensação. Não fica neurada com o que vem depois. Tá estampado na tua cara que tu gosta dela.
- Eu não sei o que eu tô sentindo.
- O melhor jeito de descobrir é vivendo o que você tiver pra viver. Você já se viu olhando pra Valentina? Você já viu como ela te olha e te trata? Você tem que se permitir de uma vez, Luiza, e não se prender em preceitos de uma realidade que só te faz sofrer. Sendo sincera, acho que você tá perdendo uma história incrível por besteira. Você não tá satisfeita com o rumo que as coisas tomaram porque você quer a Valentina, você quer ser dela. Então, por que essa sua demora?

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A Harmonia
ФанфикVocê acredita em akai ito? A premissa do fio vermelho que conecta duas almas, fora dos limites que o senso comum acredita que a vida possui. Acreditar nisso é a base para essa história. Luiza Campos e Valentina Albuquerque são estudantes de medicin...