Eu estava conversando calmamente com Céline naquela noite. Como sempre, ela trajava aquele vestido verde ridículo que era muito grande para ela e falava sobre a beleza de Henri Blanchard, o marido de Betty. Nunca entendi o que ela via naquele homem. Parecia um mendigo.
— Madame, gostaria de alguma refeição? — indagou Carolline.
— Um caldo de cebola.
— Sopa! — intervi.
— É, sopa de cebola.
— Muito bem, madame Pascal. Vou preparar. E a senhora, Suzanne?
— Nada.
— Certo — E saiu.
— Ah, Suzanne, você tem que ser mais gentil com a Carolline.
— Nunca!
— Às vezes, ela pode ser importante para você.
Ri compulsivamente.
— Nunca, Céline! Nunca!
De repente, ouvi um titubear pelas escadas. Com seus cabelos curtos e face desgastada, Betty se revela.
— Cadê a Tina?
— No...
— Eu estou aqui, Bethany — Christina impôs, com sua voz rija.
— Tina! Essa mulher, essa monstra de cabelos negros que nós chamamos de irmã... Ela é uma assassina! Uma assassina fria e impiedosa que foi capaz de matar nosso próprio pai!
— Bethany, já é a quarta vez nessa semana que você diz essas atrocidades contra a Suzanne!
— Mas é verdade! Eu a vi no quarto do papai, quando acordei de madrugada! Ele estava gemendo! Foi ela quem o matou!
— Nossa irmã jamais faria isso! Você deve estar louca!
— É verdade! É verdade! Eu nunca faria isso — disse, intrometendo-me.
Quase convulsionando, Beth se agarrou a mim e fez um verdadeiro escândalo, tentando arrancar meus cabelos e me estapeando constantemente enquanto chorava de ódio. Tentei impedí-la, empurrar sua face avermelhada para longe, mas sua força era descomunal. Logo, as pontas de alguns tufos se desgrudaram, e eu consegui sentir uma dor absurda perpassar meu couro cabeludo. Gritei. Céline, Carolline e Christina rapidamente agarram a agressora, enquanto eu permaneci ali, estirada no sofá com os cabelos todos bagunçados.
— Bosta! — murmurei, com os dentes rangendo de ódio. Mas logo, a raiva foi substituída por uma sensação súbita de triunfo. Afinal, eu percebi que aquele ataque poderia ser a minha grande chance.
. . .
Eu já estava melhor a esse ponto. Céline havia saído, mas não antes de ter devorado aquela sopa de cebola. Não a julgo nisso, Carolline realmente sabia fazer uma ótima sopa.
Christina estava em seu quarto. Eu bati com calma e ela me deixou entrar. Estava muito cabisbaixa, a mão pendente na cabeça enquanto sua face se corroía de preocupações. Logo, com uma postura mansa e carinhosa, me aproximei de minha irmã, pondo minha mão sobre seu ombro como símbolo de receio.
— Ah, Suzanne, a situação de Bethany me preocupa muito — Levantou-se, talvez para aparentar uma certa superioridade.
— É, Tina, eu sei. Veja bem, a Betty está muito mal. Acho que ficou louca depois da morte do papai. Eu achei que isso ia passar depois de um tempo, mas está tão grave a situação que talvez...
— Talvez o quê?
— Talvez ela precisasse de avaliação médica, não sei! Ah, só uma ideia boba.
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Sem Testemunhas
Misteri / ThrillerNo ano de 1900, em Londres, uma série de assassinatos contra a poderosa família Dartmoor ocorrem, praticados por uma mulher fria e longe de suspeitas - com exceção de um pequeno jornal de crimes. A trama se desenrola pela visão da curiosa jornalista...