🖤 XI 🖤

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GABRIEL


Mais uma tarde se passou sem êxito, e, desta vez, Bel não riu como prometera; apenas me fitava. Tinha certeza de que ele contava minhas tentativas, todas infrutíferas. Sabia que eles lograram êxito na primeira ou segunda tentativa; eu estava muito distante de alcançar tal proeza.

— Não se preocupe, Gabriel... — começou Aba, com cautela. — Da próxima vez...

— Da próxima vez, conseguirei? — adivinhei, meu tom soando mais irritado do que planejava.

— Sei que deve ser frustrante — continuou Sat, ainda mais cauteloso que o primeiro. — Mas um dia chegará lá.

— Talvez eu não seja um demônio; talvez a transformação tenha falhado. — Afirmei, e Bel riu escandalosamente.

— A transformação nunca falha, especialmente quando sou eu o responsável por ela. — Ele levantou uma sobrancelha. — Duvida das minhas habilidades?

— Não creio que isso seja possível, já que você é o ser mais perfeito de toda o mundo conhecido. — respondi, sarcasticamente. Ele sorriu.

— E também do desconhecido. — Ele conseguiu articular antes que Sat, que agora estava ao seu lado, lhe desferisse um tapa na nuca. — Ai, isso doeu.

— Era para doer. — respondeu o mais sério. — Vamos deixar isso para outro dia. Devemos retornar para dentro; os irmãos chegarão a qualquer momento, portanto, estejam prontos.

— Já? — perguntei, impressionado. Não fazia nem vinte e quatro horas que haviam sido convocados.

— Sim, são muito rápidos. Não há tráfego nos ares. — resmungou Bel.

— Nos ares? Demônios... Nos ares?

— Ah, não. — Aba riu. — Não são estes ares; os irmãos são metamorfos, costumam viajar na forma de corvos.

— Oh... — exclamei, sem muita convicção.

Adentramos a mansão gótica, onde fui instruído a seguir Aba, que se ofereceu a me ajudar a vestir-me adequadamente para encontrar os irmãos Abduxuel. Perguntava-me se realmente existia uma forma apropriada de se vestir para encontrar dois irmãos demônios com nomes estranhos que se transformavam em corvos.

— Isso é para você. — afirmou Aba, exibindo um terno laranja.

— Isso é... para mim? — perguntei hesitante, sem conseguir imaginar-me usando aquilo. Era um terno estranho, com uma manga mais curta que a outra, parecendo deformado e malfeito.

— Não gosta?

— É estranho... Não aprecio muito. — confessei. Aba levantou a mão e outro terno saiu do guarda-roupa, caindo em suas mãos. Desta vez, era cinza, possuía um ar elegante e parecia confortável.

— É perfeito. — Sorriu. — É confortável e durável, e suas mangas são fáceis de enrolar se precisares usar seu poder.

— O poder que ainda não possuo? — enfatizei, quase como uma lâmina cruel.

— Um dia terá, não se preocupe. — Ele tranquilizou, juntando as mãos atrás do corpo e sorrindo. Estiquei a coluna, fitando seus olhos e lembrando-me novamente de quão belo ele era. Não tive muitos momentos com Aba após as boas-vindas e o tour interrompido; um arrepio percorreu minha espinha ao recordar o que Sat me dissera. Um nó se formava em minha garganta.

— Aba... — iniciei, e ele voltou-se para mim, preocupado. — Gostaria de te perguntar algo.

— Claro, avança. — Sentei-me na cama atrás de nós, e ele imitou o movimento.

— Você... devorou um demônio? — As palavras saíram fracas, mas sua expressão sombria confirmou que ele ouvira.

— Gabriel. — Ele soltou um leve suspiro. — Cometi um grande erro que não deveria ter cometido. Era jovem e não sabia como me controlar. Foi um acidente.

— Então... é realmente possível que um demônio devore outro demônio? — perguntei, esforçando-me para não parecer desconfortável com a confirmação de seu ato.

— Sim, é possível, mas... não é comum, pois os humanos são mais saborosos; os demônios, não. — Ele explicou. — Quando me transformei, estava acompanhado de um jovem. Minha transformação foi mais rápida que a dele, e minha fome incontrolável me levou a cometer tal erro... Não o devorei propriamente, o que fiz foi abrir seu peito, e Satanael chegou para o resgatar. Ele o levou, e, em seguida, trouxe a notícia de sua morte.

— Eram amigos? — questionei, arrastando as palavras, imaginar aquela cena drástica me causava náusea.

— Éramos amantes.

Meus olhos se arregalaram; não esperava tal resposta. Olhei para Aba com mais atenção; sua expressão era de dor. Imaginei que já seria terrível ter devorado alguém, mas sendo seu amante... A pergunta surgiu em minha mente.

— Seu amor é por homens? — indaguei, soando completamente tolo.

— Isso é um problema? — indagou ele, de maneira gentil.

— Não, não. — Apressei-me em negar, percebendo minha má escolha de palavras. — Acho que todo ser tem o direito de amar quem desejar; não vejo nada de errado nisso.

— E você?

— Eu? — repeti, sem perceber a pergunta.

— Gosta de mulheres? — perguntou, com expressão neutra.

— É... Não posso afirmar, pois não recordo de ter tido romance algum. — Respondi honestamente, e Aba sorriu.

— Ainda é muito jovem; não se precipite.

Sorri, com a impressão de que poderia superar isso. Aba parecia ser um homem de bem; cometera erros e se arrependia deles. Deduzi que ele também percebera que estávamos superando o problema, e sorriu de volta.

— Vista-se, deve estar na hora. — disse ele. — Eu também irei me aprontar.

— Certo, até mais tarde. — respondi, e Aba saiu com um último aceno, fechando a porta.






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