O que seria dessa história sem um algoz?

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Ao chegarem na sala, todos já estavam lá e ele se sentou novamente na frente, agora, cercado pelas duas novas amigas e Hugo, que ele percebeu que estava procurando com o olhar mesmo que involuntariamente, estava na carteira atrás da sua.

Obvio, sua chegada chamou atenção, mas ele não sabe por qual motivo.

Como sempre, ele não conseguiu ficar cinco segundos sozinho, antes de ser perturbado por alguém:

-oi menino novo – ele levantou o olhar e ficou surpreso.

Havia umas cinco pessoas ao seu redor, impedindo que ele visse qualquer coisa além deles. Rapazes altos, fortes, alguns medíocres e duas garotas bonitas, com maquiagem leve e cabelos lisos e perfeitos.

Todos ali pareciam estudantes de odontologia.

Quem falava com ele era o que parecia o líder do grupo. Rosto perfeito, cabelo perfeito, sorriso perfeito... tão bonito que Welleson sentiu seu coração bater mais forte, ao mesmo tempo que um instinto de autopreservação apitava em sua cabeça.

Ninguém tão bonito assim falava com alguém como ele.

-percebemos que ninguém tinha te dado as boas-vindas... – o sorriso encantador dele era charmoso demais, isso Wel tinha que admitir – e viemos fazer a sala – isso com certeza era um discurso decorado – sou Thiago. Tenho sido representante da turma pelos últimos dois anos – convencido, claro que sim.

Ele apresentou os demais, mas os nomes e os rostos eram tão genéricos que Welleson não se deu nem o trabalho de tentar decorar.

-ficamos surpresos com uma nova adição à turma, digo, mais uma, mas a sua é totalmente nova e não vemos muito isso acontecendo por aqui. Meu primo mesmo, estava tentando entrar para o segundo ano e não conseguiu – definitivamente não gostava daquele garoto.

Por mais gostoso que ele parecesse ser.

-tenho certeza que já foi apresentado algumas regras, mas como representante...

-já teve eleições para representante? – Wel deixou escapar interrompendo.

Havia um pequeno barulho de conversação ao redor da sala, mas no exato momento que o som da voz do rapaz de cabelos ruivos ecoou, tudo ficou silencio.

O olhar de Thiago foi de surpreso para divertido.

-ainda não – soltou uma risada desconfortável – mas é a força do hábito. Então, as regras de conduta da escola são bem especificas e apesar de achar teu cabelo legal, sério, tá irado, mas isso realmente não está dentre os conformes, mas não se preocupe. Estamos aqui pra ajudar, é claro. Inclusive, se quiser sentar lá atrás com a gente, podemos conversar e até almoçar juntos se quiser.

O discurso finalmente acabou e Welleson continuou parado, em silencio, encarando Thiago como se não soubesse o que dizer, ou melhor, como se soubesse, mas estivesse se contendo para falar.

As palavras de Medeiros e Almeida ecoavam em sua mente e ele queria mostrar que era confiável.

-hum... você é surdo, ou o quê? – Thiago perguntou e alguns dos seus colegas riram.

-não, não sou – disse friamente.

-então...

-então, o quê?

-o que me diz?

-bom, a única coisa que posso te dizer é que se quer ficar parecido com a Rosa, terá ficar mais velho e baixo. Eu diria feio, mas isso você já conseguiu.

Tentou se segurar, mas não foi forte o suficiente.

Por cinco segundos, o grupo à sua frente apenas ficou parado mirando Welleson, provavelmente sem entender o que fora dito, mas sabiam que não era legal, devido a palavra feio ter sido usada.

Antes que Thiago pudesse enfim raciocinar e responder, um professor nada atlético e estranho entrou logo pedindo que todos se sentassem e por vários minutos, continuou explicando o plano de aula e falando sobre a divisão de aulas práticas e teóricas.

Surpreendentemente, ainda deu tempo de falar sobre os possíveis campeonatos do ano letivo e Welleson viu mais uma vez uma oportunidade de brilhar sem causar confusão.

Em alguma coisa ele poderia ser bom.

Na última aula da manhã, pouco depois da professora de geografia entrar, sentiu tocarem levemente em seu cotovelo e quando olhou para trás, Hugo estava inclinado em sua direção, com um pedaço de papel dobrado na mão, lhe oferecendo.

Num impulso, ele pegou o objeto apenas por medo de ser chamado atenção, mas não sabia se queria ou não ter contato com o rapaz.

Ainda estava meio chateado pelo que ocorrera no dia anterior, mas algo dentro dele queria conversar com o rapaz, mesmo que sem saber o porquê.

O que aconteceu de manhã?

Apenas isso.

Não havia um pedido de desculpa ou um bom dia, ou qualquer outra coisa.

Na verdade, até gostou que nada fosse dito, porque assim, poderia tentar esquecer e dar mais uma chance ao garoto, caso ele realmente quisesse manter uma amizade.

Ao que parecia, ele queria.

Rosa + cabelo laranja + Medeiros = preciso andar na linha

Esperou a professora se virar para repassar o papel e por uns bons segundos, apreciou a sensação de perigo que aquilo proporcionava, apesar de achar aquilo completamente imbecil hoje em dia.

E eu que só queria andar com você pelos problemas...

Não conseguiu evitar um sorriso e já que o outro estava sendo ousado, ele decidiu ser também.

Pois é, soube que você gosta de arranjar confusão

Soube, é?

É que essa escola não protege segredos

Nunca achei que protegesse. E o que foi? Andou perguntando sobre mim por aí? 😉

Antes que pudesse responder, Wel parou por um segundo para tentar entender o rumo que a conversa levava. Não queria, na verdade, não podia deixar entender ou ele mesmo compreender errado.

Não consegue nem raciocinar quão errado isso era.

Minhas novas amigas decidiram me atualizar sobre tudo que aconteceu nos últimos cinquenta anos nessa escola...

Ele escreveu e riu olhando para os lados, suas supostas novas amigas que estavam atentas copiando o assunto já ministrado pela professora.

Durante as outras aulas, elas comentaram que ele tinha sido corajoso por ter enfrentado Thiago, que de vez em quando o lançava um sorriso falso, com uma balançada de cabeça mais teatral ainda.

Soube por elas que ele e sua turma eram os favoritos de Rosa – óbvio – porque além de grandes puxa-sacos, eram muito inteligentes, quase sempre tirando as maiores notas da série, além de serem bons em todos os esportes que cada um praticam.

No último ano, Thiago conseguiu com seu time o ouro para a escola, além do reconhecimento por terem se dado bem nos campeonatos.

-não é uma boa pessoa para se ter como inimigo – Cristal dissera preocupada.

Não que ele estivesse, até porque nem queria considerar ninguém ali daquele jeito. Era só um ano escolar para tentar se encontrar e viver o que nunca viveu.

Não está a fim e nem tem saco para enfrentar dilemas triviais entre adolescentes.

Mesmo que agora seja um.

Elas parecem legais.

Foi só o que respondeu.

Por algum motivo, Wel decidiu não continuar.

Hugo não deu nenhuma resposta que lhe desse espaço para responder e ele mesmo – agora que tinha feito amizade com duas mulheres – não queria ter que ficar perto de um rapaz tão bonito e que ele nem deveria achar bonito.

Ainda tem a mentalidade de um homem de vinte e sete anos e achar um adolescente de dezessete ou, por Deus, menos, já é errado o suficiente.

Tudo Que For Possível Fazer (Trilogia dos Desejos #2)Onde histórias criam vida. Descubra agora