CAPÍTULO 13 - DAGURASU

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Luzes azuis, vermelhas e verdes se alternam num espetáculo espacial. Queria estar realmente viajando nessa imensidão, mas estou deitado numa maca em uma tenda do grande e camuflado acampamento da resistência Paiker da Província Oeste.

Eles se locomovem em intervalos curtos de tempo, mas, quando param, fazem questão de exibir o grande aparato tecnológico espalhado entre vários guerrilheiros que circulam pela área.

Estamos num úmido abrigo subterrâneo, entre estruturas rochosas e grutas da selva. A construção aproveita grande parte do material rochoso. Peças móveis foram fixadas para formarem um aglomerado de salas, dormitórios e outros compartimentos. As aeronaves estão escondidas alguns metros abaixo da superfície de um rio.

Não me lembro do nome de todos os lugares e pessoas que conheci desde a saída da Província Leste. Yudi deve estar vinte e quatro horas ao lado de papai, a fim de consolá-lo. Queria tanto falar com ele e dizer que estou bem e sendo bem tratado, mais ou menos, a julgar por esse escalpe penetrando meu braço, levando um alucinógeno para dentro do meu cérebro.

— Quando esse negócio vai fazer efeito? — Bill interrompe meus pensamentos na maca ao lado. — Queria perder o ponteiro de uma vez.

Estou tão ansioso e preocupado que nem faço questão de saber o que significa "perder o ponteiro", mas o jeito engraçado de Bill me distrai um pouco.

— Quando você fechar a boca — fala Niara. — Eu estava pegando no sono.

— Esquece! — diz Alex. — A gente nunca mais vai dormir.

— Ainda não entendi como isso vai ajudar — comenta Niara.

— É um composto formado por um tipo de metal raro. Dizem que é um dos poucos remanescentes da época da descoberta do Eldorado. Vai provocar impulsos nos neurônios e intensificar o efeito da doença.

— É uma droga barata comprada na esquina — afirma Bill.

— Está falando do Oeste ou do beco de onde você veio? — zomba Niara.

— Garota, você não sabe nada sobre mim.

— Logo vamos estar doidões — interrompe Alex. — É melhor se segurarem.

Isso me deixa com muito medo. Efeito colateral ou não, meu coração acelera. Tenho a sensação de sufocamento. Esforço-me para não chamar atenção para mim. Fecho os olhos na tentativa de manter a calma.

— Tá tudo bem, cara? — pergunta Bill.

Tarde demais para se preocupar.

Levanto num pulo e arranco o escalpe. Dois guardas aparecem no recinto e seguram meus braços.

— Eu não posso fazer isso! — exclamo.

Denis entra em seguida.

— Está tudo bem, Daug.

— Não me chame assim!

O suor corre gelado pelo meu rosto. Veias se destacam nos dois braços. Tudo gira. A escuridão chega. Ouço vozes.

O efeito.

* * * * *

Estou com várias escolhas nas mãos. Formado em Engenharia Genética aos quatorze anos, dou pouca importância, neste momento, para as propostas de multinacionais.

Quero criar algo único, especial e útil para o mundo. Aliviar o sofrimento dos menos favorecidos é um alvo que não me foi oferecido. A perda entrou de forma brusca na minha família.

Eu mergulho de cabeça nas peças de todos os tamanhos espalhadas no quarto que divido com Yudi. Mente ocupada para suprimir dores. A timidez teve sua origem em forma de cicatriz.

Muitas coisas ao meu alcance, menos a felicidade que parece iluminar as vidas mais singelas.

De repente, a mudança.

Lembranças raras de um lugar chamado Kanagawa. Todos caminham, ainda sem preocupação, para um lugar alto. A situação não parece tão desesperadora, a julgar pelo olhar despreocupado de Yudi com seus fones. Papai está mais tenso. Lembra-se de sua perda. Antes pudesse ter chegado a tempo para salvar mamãe. Estamos subindo e subindo cada vez mais. Onde vamos parar? Prédio acima até chegar ao topo. Um monumento à salvação.

A bola vermelha no fundo branco numa sala escolar.

— Não esquenta — diz Yudi. — Você tem ainda quatro vidas, garoto.

Quase não existe céu, apenas uma camada de nuvem vermelha em movimento. Guerras territoriais já não fazem sentido numa terra que vai se deteriorando pedaço por pedaço.

Vai ficar pior por causa da megalofobia: meu diagnóstico.

Mamãe se foi num desses momentos de caos, quando ainda ocorriam com frequência moderada. Quantos vou perder agora em que, a cada dia, o alerta é soado?

Lembranças de cortes, hospitais e destruição. Vivi o calor do momento e a adrenalina pulsando loucamente dentro de mim por três vezes.

Um funil destroçando tudo.

Desespero dentro do carro afundando.

Sirenes em alerta.

Tudo desabando.

— Eu não estou bem — digo ao meu pai. — Esse lugar é muito alto.

— Você não tem escolha, frango — diz Yudi.

Uma muralha aquática atrás do meu irmão o faz engolir as palavras.

Todos caindo.

Não consigo respirar. Gritos; papai chama; água preenchendo os pulmões e o sufocando lentamente.

Yudi deitado com olhos arregalados. Apenas choro. Ele responde.

— Restam três, franguinho.

No lugar chamado Amazônia, um raio de esperança surge. Um segredo revelado. Egoísmo, ganância — nada disso diante de uma nova chance.

Se o homem não está preparado ainda, então que comece o treinamento. A utopia se abrirá apenas quando as mais puras intenções o dominarem. É correr contra o tempo antes que tudo acabe. Ela tomará conta da preparação.

Sim, ela:

A Fúria.

Tudo vai acontecer mais e mais... São os tempos. Uma tragédia anunciada? Não se fala mais nisso.

É o mundo sendo devastado. Um pontinho tomado pela escuridão no vasto universo.

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