Cedro

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Cedro : O cedro é o símbolo da força e da fidelidade. Acreditava-se também que o cedro tinha o poder de revelar os mistérios dos Céus e apresentava poderes mágicos de afastar as malignidades.




22 de novembro de 2021, Lathi - Finlândia
Centro de Treinamentos do Pelicans



– Não há sobre o que chorar agora, temos que recuperar o resultado desastroso desse jogo e aprender com ele, para que nunca mais se repita. – O treinador finalizou sua bronca, enquanto o time assentia envergonhado.

Os pelicanos haviam levado uma virada monstruosa, quatro a dois. Petri estava soltando fumaça pelas orelhas e o time parecia ter sido atropelado por um ônibus, todos cabisbaixos e frustrados. O único som audível era o dos passos dos atletas e as conversas de outros funcionários em outros andares. Aos poucos, no final, os atletas deixaram a sala de reuniões, alguns sorriam fechado para Ava, outros pareciam tão absortos em seu próprio caos que era impossível nota-la.

– Oi, Otto. – Ava apertou os lábios em um sorriso.
– Segunda-feira. – Otto fez careta, mal-humorado. – Segunda-feira.
– Ava. – Jasper ergueu o punho fechado, cumprimentando a terapeuta com um soquinho.
– Oi, como você está? – Bekker sorriu e o jogador maneou a cabeça, torcendo os lábios.
– Bekker. – Petri se aproximou da terapeuta.
– Sim, eu. – Ava sorriu, colocando as mãos nos bolsos da calça e levantando os ombros, enquanto sorria.
– Queria falar com você antes de ir. – Disse ele e a inglesa assentiu. – Mäkelä. – Petri chamou o central, que deixava a sala em silêncio, de cabeça baixa. – Por favor. – Chamou o mais velho, flexionando os dedos da mão e Brad se arrastou até os dois, trocando olhares com Ava assim que se aproximou da inglesa.
– Petri, eu...eu posso esperar lá fora. – Ava apontou para trás de si com o polegar, sem jeito.
– Não, fique aí. – Petri sentenciou. – Mäkelä, o que achou do jogo? – Petri quis saber, pegando o central de surpresa, mas Brad manteve a expressão inabalável de sempre, estreitou o olhar e repuxou os lábios antes de responder, adotando a postura sexy e desprezível de sempre, de quem não dá a mínima.
– Estávamos bem no primeiro período, foram boas chances, mas poucas, principalmente porque o goleiro deles é muito bom. No segundo e terceiro as coisas saíram do lugar, não sei o que aconteceu com o time, não estava no gelo. – Brad deu de ombros e Ava o encarava de olhos estreitos, chocada com a forma esperta com que Bradley havia escapado daquela.

Mäkelä sempre parecia se manter num modo defensivo nas conversas com o treinador, Ava aos poucos notava isso. Os ombros não estavam relaxados e a mandíbula também não, apesar de não estar totalmente tensionada. As mãos paralelas ao corpo, o pescoço alongado e o queixo erguido, isso, junto à altura do central, fazia com que qualquer pessoa que falasse com ele se sentisse sendo olhada de cima.
Além disso, o olhar estreito, crítico e analítico, passava a ideia de que independente de quem quer que fosse você, Brad Mäkelä não te respeitaria a não ser que merecesse. Talvez, de algum modo, aquilo despertasse nas pessoas ao redor a necessidade de agradá-lo, de merecer a atenção e respeito do capitão. Ponderando sobre isso, Ava pensou no quanto ela mesmo não estava sendo uma dessas pessoas, buscando a aprovação de Mäkelä de modo inconsciente, apenas porque ele a olhara com desdém. Principalmente após a confissão do capitão, sobre a ignorar de propósito para conseguir sua atenção.

– Não estava no gelo, nem na arena. – Petri denunciou e Ava deixou seu raciocínio para acompanhar a conversa dos dois, sentindo que estavam prestes a serem desmascarados.

Brad estreitou um pouco mais os olhos e seu lábios, por uma fração de segundos, quase tremeram em um sorriso fechado. Muito, muito sutilmente.

– Houve uma urgência. – Respondeu, como se de algum modo se divertisse com o questionamento do treinador.
– Urgência? – Petri arqueou uma sobrancelha, desconfiado.
– Não era como se eu pudesse adivinhar o que ia acontecer, ou que pudesse fazer alguma coisa.

O treinador analisou Brad meticulosamente, depois expirou convencido.

– Mesmo fora do gelo, é bom para o time que o capitão esteja presente. Mas acho que não preciso te lembrar dessas coisas.
– Não precisa. – Bradley respondeu sem baixar a guarda.
– E você, Bekker? Também resolveu ver o jogo em casa? – Petri mudou seu alvo e Ava engoliu o folego rapidamente, mas fora encorajada pelo olhar de Bradley.
– Eu estive aqui. – Respondeu rápido.
– É, eu vi. – Petri cruzou os braços sobre o peito. – Perguntei sobre o jogo?
– Sou uma pessoa muita ansiosa, não consegui terminar de assistir quando as coisas ficaram ruins. – Ava mentiu, sorrindo fraco. Não era uma mentira total.
– Queria ter feito o mesmo, pouparia a vergonha. – Petri relaxou os ombros. – Eles deviam ir para um banho de gelo, para acordarem para o próximo jogo.
– Vamos trabalhar duro. – Bekker assentiu com um sorriso otimista e Petri assentiu de volta.
– Vamos trabalhar mesmo. – O treinador bateu duas palmas. – Tenho uma reunião agora e vocês precisam se juntar aos outros. Vão, podem ir. – Ordenou.
– Claro. – Ava sorriu e deu as costas ao finlandês, seguida por Brad. – Até mais.

Os dois deixaram a sala de reunião e tomaram o corredor até os elevadores. Estavam em silêncio, não um silêncio constrangedor, apenas o silêncio de quando não se tem o que dizer.

– Eu não tenho psicológico para ser desmascarada duas vezes em menos de uma semana. – Ava respirou fundo, a caminho do elevador e Bradley assentiu sorrindo fechado e arqueando as sobrancelhas, como se dissesse que fora um susto e tanto.

Mäkelä chamou o elevador apertando o botão, enquanto assistia a conversa com o treinador em looping em sua cabeça. Estava envergonhado, Petri tinha toda razão, era o capitão do time e não podia simplesmente deixar o grupo e sair no meio do jogo, mesmo que por causa de Ava. Se orgulhava e fazia o possível e impossível para honrar a posição de capitão do time e deixar um jogo quando o time levava uma virada no primeiro jogo ausente por lesão não parecia ser a postura esperada de um capitão.
Mäkelä não entendia porque estava tão emocionado e entregue a terapeuta inglesa, mas por mais que amasse o que estava acontecendo, não podia permitir que aquilo interferisse em seu trabalho. Sentia vergonha de si mesmo pela postura e ainda mais por ter sua atenção chamada pelo treinador em algo que sempre se dedicara a cumprir, algo que para o capitão era tão fundamental. Estava frustrado e irritado consigo mesmo.
Quando o elevador apareceu e a terapeuta e o jogador enfim entraram na caixa metálica, Ava se permitiu matar o que a estava matando: sua curiosidade. Desde que percebera a postura do central diante o treinador e o silêncio de Bradley após a conversa, mil coisas se interligavam em sua cabeça e precisava dar vazão a tudo aquilo.

– O que você acha o Petri? – Perguntou de repente, apertando o botão do andar para qual estavam indo.
– Hã? – Brad murmurou, direcionando a ela um olhar confuso.
– Petri. O que acha dele? – Ela repetiu.
– Ele é bom. – Mäkelä deu de ombros, não queria falar de Petri ou dar qualquer brecha para que a inglesa tocasse no assunto abordado pelo treinador anteriormente. – É um treinador bom, as vezes não concordamos, mas ele tem mais experiência que eu. Sei meu lugar e o respeito, não temos problema.
– Isso é a opinião profissional? – Ela perguntou e o jogador assentiu. – E a pessoal?
– Onde quer chegar? – Brad a encarou, com o olhar analítico e incerto.
– Quero saber sua opinião. É só. – Ava sorriu, tentando não alarmá-lo, mas já notando diferença na postura e humor do capitão, como se repentinamente Bradley estivesse na defensiva com ela.

Brad a analisou por alguns instantes, depois voltou seu olhar para frente, para as portas do elevador, que logo se abririam.

– Minha opinião pessoal é a mesma, não sou amigo dele, não convivo. Ele é bom e eu o respeito, é isso.

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