Capítulo 18

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Três dias... fazia três dias que eu não conseguia sentir minha própria sombra. E tudo por conta daqueles dois. Pedro e Miguel pareciam dois cães de guarda no meu cangote, tipo agora — Ahhhhh... Porra Miguel que susto — não pude evitar o grito, pois assim que abro a porta do banheiro, me deparo com aquela cabeleira loura oxigenada de fabrica — Você tava demorando, só vim ver se estava tudo bem, o carro já ta pronto. — eu ainda não tinha perdoado ele por completo, então minhas palavras eram secas, não que fizesse diferença pra ele, que como sempre apenas as ignorava — A pronto, vai monitorar meu tempo no banheiro também!? Quer que comece a contar quantos mls eu mijo?? Vê se me erra. E que fique claro, só to saindo com você porque meu Daddy pediu – torno a usar o apelido que havia abandonado por saber que ele não gosta. Posso sentir seu olhar em minhas costas e ouvir o ranger de dentes, e quer saber...Não me importo.

Me mantenho em silêncio no carro, mas meu corpo não colaborava, já que o perfume dele impregnava o espaço entre o painel e os bancos de couro. A porta do motorista se abre, e um pouco depois de sentar atrás do volante, ele se debruça sobre mim. Sinto meu coração acelerar e sem pensar fecho os olhos, entreabrindo os lábios e me impregnando naquela aroma amadeirado, meus pensamentos eram nublados, mas o click do sinto seguido por uma risada me faz abrir os olhos rapidamente, sentindo minhas bochechas pegarem fogo — Se queria me beijar era só pedir Kay — o sorriso presunçoso em seu rosto troca breve excitação por raiva — Não quero, fechei os olhos pra controlar a ânsia desse perfume barato do qual você tomou banho — aperto o botão, baixando todo o vidro e enfiando a cara pro lado de fora, na esperança de diminuir o calor nas minha bochechas, não só pela minha mancada, mas por que aquele sorriso convencido dele sempre me deixava com borboletas no estômago. O carro acelera, só não mais do que meu coração diante aquele homem irritantemente delicioso.

O compromisso de hoje, era um pedido de Arthur. Não sabia ao certo o que estava fazendo ali, mas não via a hora de ir embora. Aquele bando de velho que se reuniu na sala de conferência, falavam coisas que eu não entendia. Vários olhares caiam sobre mim, e não que eu os julga-se, eu não sabia nada sobre os negócios discutidos ali, não fazia parte do grupo de acionistas, não sabia nem onde ficava o café pra lhes oferecer alguma coisa, eu era basicamente um abajur da decoração. Mas o que me deixava inquieto e retorcido na cadeira era o fato daquela reunião estar durando uma eternidade e minha bexiga não tinha tanta paciência assim. Baixo a cabeça e aperto as pernas, torcendo pra não molhar o fino carpete daquela sala, eu queria ser um homem responsável, mas não estava suportando mais — Co-com licença eu... Me deem licença – não conseguia nem falar, mantinha toda minha concentração em segura as gotas que já sentia molhar a cueca. Deixo a sala, quase correndo, e me jogo na primeira porta com placa de sanitário que enxergo. E minha gente, que delícia fazer um xixizinho quando se esta apertado, a sensação de alivio quase me arranca um sorriso. Me sentido um dois litros mais leve, saio da cabine parando em frente ao enorme espelho sob as pias em mármore. Era loucura pensar que a um tempo atrás, algo tão chique assim, eu só via nas paredes de lojas de material de construção, e agora quase tudo que eu tocava era tão caro e chique quanto. Me olho no espelho enquanto pego um pouco de sabão líquido mais cheiroso que já tinha usado em toda minha vida. "Será que a tia da limpeza me passa a marca?" Penso comigo mesmo, quando vejo aquele ponto luminoso refletido no espelho — Merda isso estava assim??É por isso que todo mundo tava me cuidando droga — a enorme espinha a qual eu já tinha até batizado de Gertrudes, parecia acenar pra mim através do reflexo. Eu sabia que espremer ia deixar ela tão visível quanto, mas o pontinho amarelo sobre ela, me irritava ainda mais do que um tom vermelho tomate, por sorte podia achar alguma secretaria com um pouco de base na bolsa. Aproximo minhas mãos pra aperta-la, mas inteligentíssimo como sou, esqueço que estou com as mãos cheias de sabão, e além de meus dedos escorregarem contra a pele, o líquido escorre e invade meus olhos — Ahhhh arde, arde — aperto os olhos, sentindo como se tivesse jogado álcool em uma ferida. De olhos fechados e em agonia, lavo as mãos evitando piorar a situação. Encho minhas mãos de água e jogo sobre o rosto, uma mistura de água, sabão e lágrimas escorrem pelos meus braços e até meu nariz já escorria. Respirando pela boca, me encaro no espelho, agora o vermelho da espinha era nada se comparado ao dos meus olhos — Então meninas, pro look de hoje temos uma vibe Bob Marley — rio fraco comigo mesmo, fungando com o nariz remelento, quando escuto aquela voz me chamar — Kay você est — Miguel se interrompe quando vê meu estado. Estava esperando um risada daquelas debochadas que são a especialidade dele, ou algum comentário sobre minha amiga Gertrudes, mas tudo que recebo é um olhar preocupado e um apertar de dentes — Ah, oi eu já- sniff- ia voltar só — mas minhas frase também foi interrompida. Sua mão garra a minha me puxando pra fora do banheiro — Eii, Mi oque — seus passos eram apresados, que me sentia quase ser arrastado pelos corredores — Avise os diretores que a reunião acabou por hoje — sua frase foi quase cuspida a uma secretária que se curvou em respeito e antes que eu entendesse algo, já estavamos de volta ao carro — Coloca o sinto — foi tudo que ele disse. Eu queria perguntar o que tinha acontecido, talvez a reunião não tenha sido boa como ele esperava, ou algum acordo tenha sido cancelado, sei la. Mas seu humor não era dos melhores, então preferi me manter em silêncio. Meus olhos ainda ardiam e o nariz insistia em escorrer, teria que tomar um antialérgico — "Me desculpe devia ter percebido antes" — ele falou algo, mas eu não ouvi, porque bem na hora eu funguei fundo, sentindo meu nariz arder. Eu pensei em perguntar, mas ele apertou tão forte o volante do carro, que senti como se deve-se segurar até minha respiração. Saímos do carro e o silencio continuava, fui pro meu quarto enquanto ele se dirigiu pro escritório já fazendo uma ligação no meio do caminho. Não sei pra quem, e tão pouco me importava, precisava tomar um banho e um remédio.

Já tinha anoitecido quando acordei, aquele remédio era do bom. Bocejo, saindo do quarto ainda meio cambaleante, quando aquela voz sempre -nada delicada- pode ser ouvida — Temos que fazer algo, uma intervenção, internação, cárcere privado não importa, isso não vai acontecer de novo — não sabia o teor, mas o peso da conversa me chamou atenção. Me esgueiro até a porta do escritório, me chocando ao ver lá dentro aqueles dois, que nunca se deram e agora estão se bicando. Lá dentro Pedro e Miguel pareciam preocupados e de ânimos exaltados — Se for assim como descreveu, realmente é pior do que achei que seria — Pedro estava encostado na mesa, com os braços firmes cruzados sobre o peito. Já Miguel andava de um lado pro outro balançando os gelos em um copo de whisky em suas mãos. Eu ainda não entendi o que eles tinham em comum pra conversar, mas logo me choquei quando descobri — Não vou me perdoar por hoje. Ele devia estar apavorado, ele parecia tão bem, por isso não achei que seria difícil pra ele estar em meio a outros homens, mas ver como ele estava solução escondido no banheiro... O trauma de ser assediado deve ter sido muito pior do que supomos... Não podemos deixa-lo sozinho de jeito nenhum...Odeio falar isso mas talvez você tenha que ficar mais tempo na mansão, vou viajar em breve, mas não consigo nem pensar em deixar ele sozinho... Não que deixá-lo com você seja a melhor opção, mas ao que parece ele confia em você, e se for pra evitar que ele tenha esse tipo de crise, você é um mal aceitável — a voz seria de Miguel me deixa um pouco tocado, mas o choque do que ele dizia era absurdo demais pra que eu me acalmasse. Pedro estava preste a concordar, ou provocar Miguel, eu não sabia, mas também não dei tempo pra descobrir. Espalmei a mão sobre a madeira abrindo a porta em um solavanco — Mas de que merda vocês estão falando — entro na sala soltando fogo pelas ventas. Então era por essa besteiras que os dois não me deixavam nem peidar sozinho? — Eu não to acreditando que você tramaram algo assim pelas minhas costas, ai mais com um suposição tão absurda dessa...É sério, que machismo ridículo. Só porque sou o de baixo, tenho que ser frágil e depende? Não to em depressão ou ansiedade pelo que aconteceu, fiquei sim chocado por causa da audácia daquele porco, mas já passou. Não sou bobo o suficiente pra achar que todos os homens são iguais. Mas o que me deixa chocado e estarem juntos pelas minhas costas, sério, eu to tão..tão

— Duro — a frase foi tao fora de contexto que tenho certeza que minha cara devia estar muito contorcida em confusão, mas ao encarar diretamente os dois, percebo em seus rostos, as bochechas coradas, os olhos brilhantes, em Miguel um pouco de baba no canto da boca aberta, e em Pedro um sorriso cafajeste, fazendo um esforcinho, percebo o porquê daquelas reações. O efeito do antialérgico foi tão bom, que ao levantar ainda meio embriagado pelo medicamento, não percebi estar só de camiseta e cueca. E uma no mínimo inconveniente ereção se fazia bem marcada em minha cueca branca. Sinto meu rosto queimar, e me viro rapidamente de costas, puxando as camisa totalmente pra baixo — Não olhem...Sério, devia ter mais medo de vocês do que dos tarados ai fora. 

Malditas Entre LinhasOnde histórias criam vida. Descubra agora