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Selena

Lembranças e saudade.

No passado, esses campos eram repletos de risada barulhenta e som alto, da caixa de som da pessoa que mais me deu dor de cabeça e me fez amá-lo com minha alma.

Caminho pelo campo de trigo com os olhos fechados, para lembrar de sua risada barulhenta preenchendo este lugar, para sentir sua mão me puxando para correr na direcção do sol, antes de desaparecer.

— Vem, eu quero que se sente ao meu lado. – diz Francisco animado, me sento como pediu ao seu lado.

— E agora? Vamos ficar sentados aqui? – pergunto.

— Sim, até o sol se pôr.

— Eu não posso ficar aqui o dia todo, tenho que procurar emprego.

— O sol morre e nasce todos dias, isso significa que o dia inicia e acaba. – diz Francisco, ignorando o que eu disse.

Nos últimos dias que estive ao seu lado, ele agia de forma estranha e falava muito sobre vida e morte usando metáforas. Eu já devia ter desconfiado o que vinha a seguir, mas não entendia na época.

— Por que isso de repente?

— Eu quero ver a morte do sol ao seu lado, nunca sabemos quando pode ser a última vez.

— Eu não estou gostando do rumo desta conversa, você anda falando coisas estranhas, não é mais o mesmo.

— Todos morremos um pouco à cada dia.

— Já chega disso, quero terminar.

Naquela época, eu estava ficando assustada.

Ele sorriu e disse:

— Tudo bem, eu só peço que antes de virar as costas e ir embora, veja o sol morrer ao meu lado. Como um último adeus.

Por mais estranho que aquilo parecesse, eu fiquei ao lado dele e vi o sol se pôr.

— Não importa o quão lindo seja o dia, ele sempre acaba. – ele se levanta e caminha na direcção onde o sol se põe.

O que não imaginava é que aquela era a última vez que eu o veria, antes dele se matar.

Abro os olhos, voltando ao presente, rodeada de um campo de milho, sem ele aqui e o sol ainda continua ali, mesmo que ele não esteja mais aqui.

Se eu não tivesse sido tão descuidada, poderia ter salvado ele, não pude impedi-lo de cortar os pulsos e sangrar até morrer.

A pessoa que me apresentou o amor, que me fez rir quando queria chorar, me fez lutar pelos meus sonhos e sair da minha zona de conforto, não está mais aqui.

...

— Bom dia, meninas. – digo sorridente para as galinhas no galinheiro.

Num sábado como esse, as pessoas devem estar se preparando para passar o dia com família e amigos, mas eu tenho que trabalhar, pois se eu não fizer isso, não poderei pagar meus estudos e realizar meus sonhos.

Eu prometi ao Francisco que nunca desistiria de lutar pelos meus sonhos e tenho que fazer isso por nós, aproveitar a vida ao máximo.

— Selena.

Me surpreendo ao ver a Zara na frente do galinheiro.

— O que faz aqui?

— Eu vi visitar o Davi, aí aproveitei para ver você e o José.

— Infelizmente, ele não está aqui.

É uma pena que logo neste sábado, José foi ajudar a Ana a colher frutas da plantação da avó dela e como sempre, passa o dia inteiro lá. Coitada da avó da Ana, aqueles dois implicando o dia inteiro, só Deus na causa.

Alguém pra mimOnde histórias criam vida. Descubra agora