Melissa, Tome Consciência de Seus Sentimentos!

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     No dia seguinte, Melissa estava a conversar com seu namorado sobre os mais variados assuntos durante o recreio. E, por conversar, quero dizer que ela comentava sobre determinado assunto -- geralmente moda -- e José Carlos apenas concordava com um acenar de cabeça.

     -- Assim, daqui a pouco, já é o Carnaval -- comentou a garota -- Devíamos encontrar uma roupa para vestir.

     -- Vamo' com qualquer coisa, amor -- resmungou José Carlos -- Tipo, não é como se a gente fosse vestir um negócio super elaborado. Se pá eu vou vestir uma roupa normal e você vai se vestir que nem uma piranha.

     -- "Piranha", José Carlos? -- Melissa posicionou as mãos nos quadris, já irritada.

     -- Tu entendeu o que eu quis dizer. Aquelas blusas curtas, minissaia...

     -- Que seja. Mas eu não quero vestir algo simples, você sabe disso -- sentou-se em um banquinho e cruzou as pernas -- Só acho que a gente poderia vestir algo bem chique.

     -- Não precisa -- o rapaz enxotou uma muriçoca iminente -- Capaz deles [equipe pedagógica] nem quererem que a gente venha de fantasia.

     -- Em todos os outros anos viemos de fantasia. Dessa vez, quero vestir algo fabuloso de verdade -- deu um selinho na bochecha do namorado -- E você vai me acompanhar.

     José Carlos revirou os olhos. Queria estar jogando bola com os amigos, contudo não recusaria trocar uma ideia com sua namorada gatinha. No entanto, ele esquecera que o assunto de Melissa não era nem um pouco interessante para ele. Ficou por lá só para admirar a beleza da namorada, mas correr atrás de bolas com um monte de caras suados lhe parecia muito mais legal.

     De repente, a salvação do garoto surgiu, para o prazer de José Carlos e o desprazer do dito cujo.

     Rafael caminhava pelo corredor, comendo um pastel. Patrícia o acompanhava, comendo outro pastel. Naquele dia, ela decidira comer o lanche da escola.

     Ao reparar no olhar maléfico de José, Rafa apertou o passo assim como seu toque na refeição. Todavia, ele não era páreo para o maior superpoder de todos: facilitação do roteiro.

     Simplesmente, surpreendendo as pessoas no perímetro, José Carlos esticou seu braço de modo sobrehumano. Melissa sabia que seu namorada fazia exercícios a fim de aprimorar sua flexibilidade, porém sequer pensava que aqueles fossem os resultados. Os dedos do rapaz mais alto puxaram a gola da camiseta do coitadinho do Rafael, aproximando-os em um estalar de dedos -- ou ossos.

     -- Vamo' bater uma bolinha -- sussurrou para o homônimo ao pintor renascentista.

     Rafa nem sabia o que dizer. Uma gota de suor deslizou por sua testa. Olhou para Patrícia, mas a jovem estava tão perplexa tanto. Olhou para Melissa, mas ela parecia muito mais interessada no TikTok. Olhou para o resto da área, mas, aparentemente, todo mundo preferiu ignorar a baixaria -- para não irritar o Sr. Fantástico 2.0, talvez. O jeito era encarar José, que portava um sorriso cruel.

     O moço só lembrou de engolir seu pastel em uma só bocada e de ser arrastado até a quadra. Rafael era um dos garotos mais magros de sua turma, entretanto levando a essência de José Carlos em conta, capaz dele ter virado a bola durante o jogo. O que houve é um mistério até os dias de hoje, no entanto.

     Pat quase deixou o pedaço de pastel cair da própria boca. Botou pra dentro novamente e limpou os lábios, desviando sua atenção dos carinhas se afastando de seu campo de visão para Melissa.

     -- O que aconteceu aqui?

     -- Você se acostuma -- bancou a esperta. Na realidade, nem a loira entendeu o que houve.

     Os dentes de Patrícia se chocaram. Reparou em Melissa cruzando as pernas e repousando a mão no banco. A linguagem corporal era... clara? Quem sabe? Ficou pior ainda com um olhar sugestivo da patricinha e batidinhas da palma da mão no ferro.

     -- Quer que eu... me sente aí? -- Pat apontou discretamente para o banco.

     A loira percebeu os próprios gestos e puxou a mão para o colo, deixando um leve rubor invadir seu rosto enquanto cerrava o cenho.

     -- Quer que eu me sente aí? -- repetiu a novata, muito mais confiante.

     Antes que Melissa pudesse responder, Júlia surgiu em cena, com as mãos na cintura e feições levemente desinteressadas. Disfarçou os ciúmes muito bem, devo dizer.

     -- E aí, Patrícia? -- a gótica ergueu o olhar para seu objeto de futura afeição -- A Mel tá te incomodando?

     -- Não mesmo -- apertando os lábios, a loira se levantou rapidamente -- Não quero atrapalhar o casal -- seu tom era condescendente ao se afastar das outras meninas.

     Pat corou instantaneamente. A cor mais rosada era notável nas bochechas de Júlia, porém não tanto quanto a da outra moça.

     -- Ignora ela. Pode crer que a patricinha não faz nada -- sorrindo com a mente trabalhando, acenou com a cabeça -- Cadê o Punheta?

     -- Foi... foi jogar futebol -- pigarreiou Patrícia.

     -- É, foi sequestrado -- Júlia balançou a cabeça com um sorriso conformado -- Esse Rafael... quer dar uma volta pela escola?

     -- Eu... eu tô bem. Obrigada.

     Embora um pouco frustrada, Júlia deu de ombros e se distanciou da jovem.

     -- Outro dia a gente dá uma voltinha por aí, então. De preferência, quando o Rafa estiver "jogando bola" -- riu baixinho.

     Pat respirou fundo, prendendo o ar nos pulmões por uns momentos antes de liberar. Isso foi um flerte? Ela era incapaz de dizer. Até porque ninguém nunca dissera algo assim antes a ela. Sem dúvidas, Júlia seria uma adição interessante a sua vida.

     ...

     Reclinada contra uma parede qualquer, Melissa suspirou. Não fazia ideia do que estava acontecendo consigo. Digo, tinha uma ideia, sim: paixão. Contudo, seria impossível. Ela sempre fora atraída por homens. Tinha um namorado.

     Ah, sim. Seu namorado. Seu namorado de cabeça fechada. Seu namorado homofóbico. Melissa teria de se livrar desse empecilho caso... não! No que ela estava pensando? José Carlos não era um problema para o desenvolvimento de sua relação com Patrícia, uma vez que tal relação não existiria, em primeiro lugar!

     Suspirou pela segunda vez. Emergiu o ruído da campainha da escola. Hora de voltar para a sala de aula.

     Pisando fundo, Melissa caminhou até o cômodo. De perto, mais passos acompanharam a usual cacofonia e o próprio movimento dos pés da loira. Olhando para o lado, avistou Patrícia.

     Os olhos azuis se cruzaram com os tons castanhos protegidos por lentes. A cor fria se perdeu na esclera, acompanhada do rubor nas bochechas. Pat não podia dizer que não notou os olhos arregalados e o tom avermelhado da face de Melissa, todavia achou que não era nada demais. Muito por conta da própria atitude da loira, que virou a cara, franzindo toda e qualquer característica facial, e entrou na sala de aula sem dizer uma única palavra.

Mais Um Triângulo Amoroso Idiota (SAPPHIC EDITION!!!!!!!)Onde histórias criam vida. Descubra agora