Patrícia Costa

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     A menina que entrou era bastante distinta. Sua pele era de um tom amarronzado. Seus óculos quadrados destacavam o rosto oval, emoldurados por curtos cachos castanhos. Seu semblante permaneceu neutro, se não minimamente apreensivo, mesmo com os olhares dirigidos a ela.

     Os cochichos começaram. Alguns comentavam da aparência da novata, cuja acne e bigode feminino tornaram-se mais evidentes de perto. Alguns rapazes da laia de José Carlos até se questionaram se ela era uma garota ou garoto, irônicos. Entretanto, a reação de estudantes aleatórios não é importante agora.

     Júlia logo se interessou pela garota. No mínimo, achara sua aparência intrigante. Intrigou-se ainda mais ao ver a menina se sentar diagonalmente a ela. Várias carteiras separavam-nas, mas que se dane. Não disfarçou os olhares.

     Melissa, por sua vez, visou disfarçar. Todavia, algo na menina atraiu seus olhos. Tentou retornar a atenção às amigas, porém era evidente o quão impressionada ela estava. Chegou até a enrusbecer ao notar o próprio comportamento.

     -- Tudo bem, amiga? -- perguntou Clara.

     -- Sim, sim. Só... estava pensando.

     Independentemente da reação, qualquer uma tensionava os músculos da novata. Ela não era do tipo que gostava de chamar muita atenção. Especialmente ao perceber que alguns sussurravam enquanto a fitavam.

     -- Não liga, mana -- o rapaz sentando a sua frente disse, virando seu rosto.

     Era um sujeito magrelo, cheio de acne e fiapos no queixo. Seu cabelo era um mullet repicado e modinha. Seus óculos pareciam grossos e seu apelido provavelmente era "Armadilha de urso" (ele usava aparelho). Contudo, seu sorriso parecia sincero.

     -- Eu diria que é fácil falar -- a novata foi honesta -- Mas duvido muito -- ela olhou de cima a baixo para o rapaz.

     -- Você é engraçada -- sorriu o menino -- Meu nome é Rafael. Aliás, meu sobrenome é Sanzio.

     -- Uau, temos um artista aqui! -- brincou a moça.

     -- Ou uma tartaruga.

     -- Você tem um ponto -- ela estendeu a mão -- Meu nome é Patrícia, mas pode me chamar de Pat.

     -- E o meu apelido é Rafa.

     Eles estavam se divertindo, porém José Carlos observava tudo de longe com um sorriso perverso.

     -- Parece que o Punheta fez amizade! -- então o apelido de Rafa não era "Armadilha de Urso".

     Seus amigos riram. Sua namorada, no entanto, permaneceu focada na jovem.

     -- Tudo bem, Mel? -- notou o modo estranho da companheira -- Não vai me dizer que quer pegar o Rafael.

     -- Ora, claro que não! -- vermelha, ofendeu-se -- É só que achei a menina meio estranha.

     -- Realmente, né? Ela parece um moleque.

     Melissa suspirou, sentindo as mãos grandes do parceiro em seus ombros. Algo mudou quando ela encontrou a novata, entretanto não sabia o quê.

     O professor de História, Álvaro, entrou na sala. Era um homem meio gordo e sorridente. Tinha cachos grisalhos ao mesmo tempo que picos de viúva. Vestia uma camiseta do Che Guevara. Era um estereótipo ambulante. Contudo, sendo o estereótipo de um professor de História, era igualmente legal. E comunista.

     -- Bom dia, jovens! -- cumprimentou. A maioria respondeu -- Como alguns já perceberam, temos uma novata -- apontou para Pat -- Levanta aí e vem se apresentar.

     Respirando fundo, Pat se levantou. Não era tão tímida normalmente, todavia já percebera que alguns alunos julgavam-na sem conhecer sua personalidade.

     Em frente a todas as carteiras, ela iniciou:

     -- Bom dia. Meu nome é Patrícia Costa. Vim de uma escola de outra cidade. Vim pra cá porque minha mãe se mudou e tal.

     Foi uma apresentação bunda, porém ela não ligava.

     -- Obrigado, Patrícia -- deu dois tapinhas nas costas da estudante -- Agora volta pra tua carteira que precisamos começar a aula.

     Pat retornou à própria mesa e Álvaro começou a escrever no quadro. Rafa deu seu feedback ao discurso: um joinha e uma piscadela. Isso arrancou uma risadinha dela.

     Durante toda a palhaçada, Júlia ficou vidrada na novata. Acompanhou cada movimento dela com um sorriso. A aparência mais andrógina e desleixada de Patrícia cantarolou uma doce melodia para os ouvidos normalmente acostumados a rock paulera e música clássica. Seu coração batia em um novo ritmo: uma canção romântica.

Mais Um Triângulo Amoroso Idiota (SAPPHIC EDITION!!!!!!!)Onde histórias criam vida. Descubra agora