Pós-Treta

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     No pátio, Rafael e Patrícia não se conteram e passaram a fofocar, sentados em um banquinho enquanto comiam um pão de queijo e biscoitos, respectivamente:

     -- O que foi aquilo? -- a garota estava perplexa ainda.

     -- A Júlia estava te defendendo. Ela fica alterada assim, mesmo -- ele dizia com bastante propriedade.

     -- Tá, isso eu entendi -- retrucou -- Mas porque eu?

     -- Ela tá muito na sua -- afirmou Rafa, acenando com a cabeça.

     Pat sentiu o rosto enrusbecer ao mastigar a rosquinha amanteigada. Ela não podia negar que percebera o jeito que Júlia a olhava. Muito menos negar que ficou impressionada com a beleza da garota.

     -- Não vai me dizer que você... -- Rafael arregalou os olhos -- Por favor, Pat, não me diz que você também tá a fim dela! -- choramingou.

     -- Não, não! -- extasiada, Patrícia ergueu as mãos bem alto -- Eu acabei de ver o que aconteceu! A última coisa que eu quero é uma doida que as pessoas não podem falar um negócio sobre mim e a mina já começar a discutir, depois discutir com quem não tinha nada a ver... -- suspirou.

     -- Hum, que bom. Embora eu tenha notado que você ficou bem balançada segunda-feira... -- ergueu uma sobrancelha para a amiga, depois movendo a mão para baixo.

     -- Mais ou menos... -- Pat corou -- mais ou menos.

     -- Relaxa, ainda não somos tão próximos assim. Não precisa me contar sobre essas coisas agora.

     -- Ah, sim... apesar de que eu já sei algumas coisinhas sobre você...

     Fora a vez de Rafael corar.

     -- Meu Deus, tem como a gente se esquecer desse dia...? -- coçou a nuca, rindo de nervoso.

     -- Tá, tá... -- sorriu Patrícia -- mas e aí? -- repetiu aquele gesto de Rafa.

     -- ... totalmente -- deixou escapar um júbilo anasalado, terminando seu lanche.

     -- É, não é como se a voz não entregasse -- deu dois tapinhas no ombro do amigo.

     Sons de passos abordaram a dupla. Lá vinha Júlia, abanando-se com um papelzinho. Uma advertência.

     -- Aprendeu sua lição? -- Rafael ergueu uma sobrancelha.

     -- Talvez... -- ela girou os quadris.

     -- Precisava de tudo aquilo?

     -- José Carlos não sabe apreciar uma obra prima -- piscou para Patrícia, cujo sangue subiu às bochechas -- sem falar que foi Mel quem me deu um soco em primeiro lugar.

     -- Pode até ser, mas você sabe que iria se encrencar mais -- o rapaz pôs uma perna sobre a outra -- Quero dizer, Melissa é rica. O pai dela ajuda muito a escola. Já você... -- olhou de cima a baixo para a colega -- bem, não é como se tu fosses a aluna mais exemplar.

     -- Qual é, Rafinha? O fato d'eu ter pedido a sua ajuda para passar de ano ano passado não diz nada sobre o meu intelecto!

     -- Você me pediu ajuda na recuperação. Você tirou 4 -- cruzou os braços -- Em Geografia e Matemática. Passou raspando na maioria das matérias. Me coagiu a te ensinar a estudar.

     As pupilas de Pat encolheram um pouco. Estava claro que Júlia provavelmente não era lá essas coisas, porém não imaginava que aquele era o nível da menina. Como uma nerd, aquilo era quase que imprescindível para ela. Tirar 4 em Geografia? Porra, Geografia?!

     -- Claro que você é o sabichão em Matemática, Punhetinha -- audaciosa, a Watanabe sorriu -- Afinal, você tem que impressionar o Ulisses de alguma forma...

     Rafa se enrusbeceu, parecia um pimentão vermelho. Patrícia sentiu vontade de rir, contudo não o fez em respeito à dignidade do carinha.

     -- I-Isso não vem ao caso! -- berrou baixinho -- Estamos discutindo a sua inteligência aqui, Júlia!

     -- Ah, sim, sim... -- Júlia sorria como uma hiena -- o que posso fazer se Matemática é difícil e a professora de Geografia é horrível? -- deu de ombros.

     Pat se lembrou da tutora da matéria. Professora Karla, um pé no saco. Só escrevia algo no quadro e mandava os alunos lerem o livro. Como se não bastasse fazer o trabalho mal feito, ainda era grosseira e irredutível ao extremo. Não se podia ir ao banheiro? Nem mesmo depois da explicação -- embora não houvesse uma aula propriamente dita -- nem mesmo depois de executar os deveres? Lamentável.

     -- Sem falar que o sistema é falho, pequeno gafanhoto -- piscou para os adolescentes sentados -- Só se avaliam as provas, embora seja de conhecimento atual que há diversos tipos de inteligência.

     Tudo bem, Júlia Watanabe possuía uma massa cinzenta bem utilizada.

     -- De qualquer forma, Júlia... -- a voz de Patrícia era pequena como um grão de arroz -- acho que não é muito legal você ficar arrumando briga aqui na escola. Não é mesmo, Rafa? -- o garoto acenou com a cabeça.

     Júlia riu, sentindo o coração derreter. Com a jovem pedindo assim... -- e importante mencionar que o imperativo da Costa foi o mais neutro possível. Nem disse "por favor". A gótica estava realmente atraída pela novata.

     -- Ah, eu até poderia tentar... -- rodeou o ambiente com os olhos -- mas como o Rafa concordou, não acho que seja uma boa ideia.

     A diversão de Pat fora externalizada, assim como a da garota em pé. Rafael franziu o cenho e bufou. Impressionante como gostavam de tirar uma com a cara dele.

     -- Ah, vão se catar!

     ...

     -- Caramba, Mel, por que que você fez isso, hein? -- Nina fazia o máximo para parecer indignada, todavia seu tom dizia outra coisa. Deboche, sem dúvidas.

     -- Aquela garota estava indo loge demais -- Melissa limpou o lábios ensanguentados com um paninho pela quarta vez  -- Onde já se viu, insinuar que eu sou uma piranha!

     -- Isso não é verdade, né? -- Clara parecia preocupada. A loira a encarou com ódio como resposta -- Desculpa... -- encolheu-se.

     -- É, amor -- José Carlos franziu o cenho -- O que Júlia falou não é verdade não, né?

     -- Vocês são idiotas, por acaso? É claro que não! -- esbravejou Melissa -- Mas você também, hein, José? Precisava falar aquilo lá?

     -- Ele só tava brincando, Mel. Mesmo que não fosse exatamente mentira -- afirmou Nina. O rapaz concordou -- Por quê? Tá defendendo a novata?

     -- É, Melissa, tá defendendo ela? -- José Carlos estava desconfiado. Por desconfiado, leia-se "maria-vai-com-as-outras".

     -- Claro que não! -- com o rosto vermelho, talvez ela estivesse -- É que... vocês sabem como a Júlia é, gente! Fica irritadinha com qualquer coisa e é melhor que a gente não dê corda.

     -- Ué, mas foi você que...

     -- Quem mandou chamar ela de "gostosa", José Carlos? -- apertou fortemente a bochecha do namorado, que gemeu de dor.

     Suas amigas riram quando Melissa soltou José. Passando o braço forte por trás dos ombros da namorada, até ele riu. No entanto, mal perceberam a expressão cansada da loira, deslizando os dedos pela ferida no lábio superior. A atitude de Júlia, de fato, não fora nada racional. Contudo, era inegável que o rapaz acompanhando as moças estava enganado. Mesmo com aquela aparência distinta, Patrícia tinha sua beleza. E Melissa queria ignorar aquela verdade a todo custo.

Mais Um Triângulo Amoroso Idiota (SAPPHIC EDITION!!!!!!!)Onde histórias criam vida. Descubra agora