Desconforto e Propostas

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     No dia seguinte, durante o intervalo, Patrícia e Rafael lanchavam. Discutiam sobre... sobre qualquer coisa. Filmes, jogos, animes... sei lá. Não importa o que aqueles nerdolas estavam conversando sobre. O que importa é que José Carlos surgiu para encher o saco acompanhado de sua namorada, que não queria nem um pouco estar ali.

     Rafa ergueu a cabeça melancolicamente, deparando-se com o olhar maligno de José, já sabendo o que passaria em suas mãos. Ou melhor, em seus pés.

     -- 'Bora tocar uma bolinha, Punheta? Não vai trocar a ordem dos fatores, hein? -- sorriu largo demais, retorcendo os dedos tão largos quanto.

     Rafael preferiu ficar quieto. Péssima ideia, apesar de que, qualquer que fosse sua resposta, a consequência não mudaria muito.

     -- Quem cala, consente -- José deu de ombros antes de agarrar a manga da camiseta do pobre Rafinha e levantá-lo do banco.

     Rafael emitiu um ruído sôfrego ao ser arrastado até o ginásio pelo brutamontes que era José Carlos. Patrícia presenciou tudo passivamente, espantada com a imensa força física do sujeito e temendo ser a próxima. Olhou para a frente e lembrou de sua situação que não envolvia violência, mas ainda assim era terrível.

     Melissa cruzou os braços, incapaz de tirar os olhos dos igualmente nervosos da garota sentada. O tom castanho reluzia sob a luz solar, tentando a loira a se aproximar mais. Sem dar importância para a metade racional de seu cérebro, assim ela o fez. A ação causou uma reação quase que imediata em Patrícia, que corou e recuou bruscamente, chocando a cabeça contra a parede. O som do baque e do gemido de dor trouxeram Melissa de volta para a realidade. Portanto, ela logo se preocupou, afastando-se tão bruscamente quanto -- quase tropeçou com aquele tênis de plataforma que calçava -- e demonstrando sua preocupação em palavras:

     -- Meu Deus, desculpa! -- estendeu a mão aristocrática, seu rosto contorcido em arrependimento -- Machucou?

     -- Não, não! -- Patrícia empurrou a referida mão suavemente -- Eu tô bem... -- coçou o couro cabeludo -- mas... mas eu vou precisar ir, tá bom? Vou... pegar um negócio lá na sala! Que eu... esqueci! É... -- sorriu amarelado e ergueu-se do banco, distanciando-se de Melissa com passos rápidos.

     A loira, embora um pouco magoada com o corte inesperado de sua interação, compreendeu. Ficou perto demais e Patrícia temeu um segundo beijo. Melissa viu o quão gente boa ela era. Provavelmente não gostaria de beijá-la de novo sabendo que a Montenegro era comprometida. Desse modo, permaneceu no lugar, aproveitando para pegar seu celular e passar o resto do intervalo no Instagram, vendo roupas bonitas.

     Enquanto isso, Patrícia não se direcionou à sala de aula. Foi a pior mentira que contou em sua vida, nem se dando ao trabalho de torná-la crível. Ela queria apenas ficar longe de Melissa, de toda aquela tensão que surgia entre ambas. Não queria fazer parte daquilo, principalmente por Melissa já ter namorado e por perceber que, a cada dia que passava, Júlia se atraía ainda mais por ela. As últimas coisas que queria era arrumar confusão e entristecer sua "amiga" -- àquele ponto, a amizade delas estava meio estranha, uma espécie de brotheragem feminina rolando no ar.

     Falando na "amiga", Júlia apareceu em frente a Patrícia, felizmente. "Felizmente" para quem e por quê? Felizmente para Júlia, que tinha algo a dizer:

     -- Pat, que bom que te encontrei! -- seu sorriso estava estranhamente mais radiante -- Posso te pedir um negócio?

     -- Hã... claro, pede aí -- Pat intimidou-se um pouco com o sorriso tão genuíno da Watanabe, mais acostumada àquele afiado deboche. Entretanto, dispôs-se a escutar o que ela gostaria de dizer.

     -- Eu... eu queria saber se... -- okay, o rubor nas bochechas era raríssimo. Algo de errado não estava certo -- eu queria saber você quer tomar um sorvete comigo nesse sábado? -- Ou será que estava?

     Patrícia abriu a boca para responder. Nada saiu. Fechou a boca e abriu novamente. Mesmo problema. Repetiu a ação várias vezes até seu cérebro retornar ao lugar de origem e a voz sair:

     -- Como é que é?! -- gritou baixo, seu rosto tão vermelho que causaria inveja a Lula -- Você quer sair comigo?

     -- Bem, sim... não é tipo um encontro, sabe? -- Júlia desviou o olhar -- É... é mais como uma saída entre amigas, sabe? Mesmo que nossa amizade pareça meio... esquisita depois dos evento do sábado passado -- olhou para baixo rapidamente antes de retornar o olhar a Pat -- Enfim, eu gostaria muito que você fosse, sabe? A gente tomaria um sorvete, trocaria uma ideia... -- um pouco embaraçada, sorriu suplicante.

     Patrícia piscou uma, duas, três vezes. Bem, não faria mal aceitar. Assim, ela talvez pudesse esquecer toda a treta de Melissa. Ou, pelo menos, varrê-la para debaixo do tapete por um tempo. Sem falar que sorvete é sempre bom. Adorava especialmente Floresta Negra.

     -- Pode ser...! -- finalmente respondeu, o vermelho de sua face suavizando-se, tornando-se mais rosado -- Aonde vamos?

     -- Eu ainda não decidi, mas acho que pode ser na pracinha perto do nosso bairro. Daí a gente vai lá a pé, mesmo.

     -- Por mim, de boa. Só tenho que ver se minha mãe vai deixar, tá?

     -- Ela não te deixa sair sozinha? -- Júlia ergueu uma sobrancelha.

     -- Não mesmo. Ela é bastante preocupado e sempre me protegeu bastante. Mas eu e meu pai podemos tentar convencer ela. Ele é mais tranquilo com essas coisas.

     -- Espero que vocês consigam. Eu quero muito sair com você, Pat -- as bochechas de Júlia se aqueceram discretamente.

     Patrícia corou com o que lhe foi dito. Antes que pudesse dar qualquer reposta, todavia, a campainha soou, anunciando que os alunos deveriam voltar às suas respectivas salas de aula.

     -- Vamos? -- Júlia questionou, dando as costas para Pat. Estava prestes a retornar ao local de estudos antes de dar uma olhadinha para a outra garota. Seus olhos brilhavam alegremente, de um jeito incomum. Era bonito.

     -- ... vamos -- Patrícia seguiu Júlia, sentindo o rosto esquentar novamente. Caso seu rosto enrubescesse mais uma vez naquele dia, queimaria sua pele. Não que ela se importasse, visto que haviam coisas muito mais interessantes a pensar no momento, afinal.

Mais Um Triângulo Amoroso Idiota (SAPPHIC EDITION!!!!!!!)Onde histórias criam vida. Descubra agora