Capítulo 38

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Ao despertar, Morgan notou que tudo havia sido real. Ao se encontrar dentro da carruagem e escutar todos os gritos do povo de SnowVille. A única coisa que os impedia de avançar e encontrar a família real, eram as tropas de SnowVille que foram ordenadas por Zion para que dessem suas vidas se fosse necessário, para que a família estivesse segura. Morgan olhou ao redor e se deparou com o rosto de seu pai, aconchegante e reconfortante, mas ela se lembrou das imagens fortes do corpo de Hazel e seus olhos se encheram de lágrimas novamente. O choro instantâneo aumentava a cada segundo, enquanto William a tomava nos braços e embalava como uma criança. Klaus que ouviu o choro de sua Rainha correu até a carruagem.

- " Despertou? " - perguntou a William.

- " Sim. Mas está histérica, não há possibilidade de sairmos de SnowVille com ela dessa forma, precisamos de um médico, ervas, algo que a faça dormir por mais tempo. " - disse William. Klaus bufou estressado e olhou ao redor e então franziu a testa.

- " Onde está Vossa Alteza, Sarah? " - perguntou Klaus. William olhou para o teto da carruagem buscando na mente onde poderia estar sua esposa. E se deu conta de que havia saído do palácio sem buscá-la no quarto.

- " Por Deus! Sarah ainda está dentro do palácio! " - disse William. Klaus arregalou os olhos e tomando a espada nas mãos correu para dentro do palácio mais uma vez, deixando Morgan sob a proteção de William e Audrey sob a de Zion.

O servente subia rápido as escadas, o palácio estava em uma situação deplorável. As bombas que haviam atingido as paredes do palácio haviam retirado pedaços grandes de sua arquitetura. Havia poeira em todos os lugares mais minuciosos do palácio, estava assustadoramente vazio, o restante dos serventes do palácio haviam desaparecido. A sensação de estar ali dentro era sufocante e desesperadora. Nada se ouvia, apenas o ruído estranho de que pessoas já haviam morrido diante daquele castelo, ansiando pela proteção das tropas de SnowVille que prezavam pelas vidas da família real.


Klaus caminhou por todo o percurso até os aposentos onde aparentemente Sarah estava.

- " Vossa Alteza? " - ele chamou, esperando que algo pudesse ser ouvido diante do barulho das bombas e gritos distantes que atravessavam as paredes do palácio. - " Sarah?" - tentou indignar a mulher para que ela saísse finalmente do quarto, mas nada funcionou. A única solução para acabar de vez com todas as dúvidas e preocupações, era empurrar a porta e descobrir o que havia através dela.

Era possível que aquela fosse uma das primeiras vezes em que Klaus Lancaster sentiu medo, nada se ouvia do outro lado da porta, nem mesmo o som de uma respiração fraca de alguém prestes a perder a vida, nada. O silêncio era desconfortável. Com as mãos trêmulas e com a espada em uma das mãos, empurrou as grandes portas dos aposentos da Rainha e olhou para dentro com os olhos apertados como se doesse observar a luz forte que adentrava pelas janelas abertas do recinto. Quando sua visão se estabilizou, ele soube que seria mais confortável se eles tivessem simplesmente fugido sem Sarah. O corpo da Rainha estava balançando de um lado para o outro enquanto era pendurada pelo pescoço ao teto. A corda presa ao seu pescoço com ignorância, seu rosto estava arroxeado e seus olhos estavam arregalados, expressando seu desespero e arrependimento ao lutar pela sua própria vida que a mesma tinha feito a questão de retirar por si mesma. Klaus sentiu seu estômago se embrulhar ao ver a cena terrível, a guerra ainda causaria muitas mortes, a menos que todos saíssem dali o quanto antes.

Lancaster correu para fora do quarto e desceu as escadas com as pernas trêmulas e a mão vacilante guardando a espada na bainha. Naquele momento outra grande bomba atingiu o palácio e ele começou a desmoronar, as pedras grandes caíam de um lado para o outro impedindo o caminho para a saída. Klaus olhou ao redor buscando uma janela, algo que o pudesse dar acesso ao lado de fora do palácio e o salvá-lo da morte.


Do lado de fora do palácio, onde estavam as carruagens e uma Rainha inconsolável naquele momento consciente, a visão do palácio caindo aos pedaços a deixou ainda mais histérica. Com a voz rouca e fraca ela se levantou.

- " Klaus... " - ela disse segurando a mão de seu pai e apontando para o castelo que caia. As torres estavam balançando mais do que antes. Mais gritos. Mais tiros. Mais espadas empunhadas. Mais mortes. Morgan se levantou do banco aconchegante da carruagem e olhou para o topo do palácio esperando ver o seu servente. - " Não, não de novo, por favor... " - ela disse para si mesma enquanto ainda buscava a feição familiar de Lancaster. As lágrimas ameaçavam voltar a rolar sobre seu rosto. Até que finalmente ela viu, aqueles olhos azuis que ela sempre admirou, seus cabelos louros voando ao vento, ele estava sujo e parecia assustado. William se posicionou ao lado de Morgan para evitar que ela corresse atrás dele. - " Klaus! " - ela gritou. Klaus olhou para ela e sorriu confortando sua Rainha.

- " Fique onde está! Desço já! " - ele disse. E então passou a sair janela a fora. Com cuidado ele escorregou sobre as torres do palácio até que estivesse seguro para pousar ao chão. E ele caiu ao lado de Morgan com um gemido dolorido.

- " Klaus... " - Morgan se agachou ao seu lado e o puxou para um abraço, se aconchegando no peitoral do servente que se assustou com a iniciativa. Ele acariciou os cabelos macios da Rainha e passou as mãos pelo seu rosto delicado enquanto sua respiração se regulava. De repente, ela o atacou o empurrando pelo peitoral e batendo com força em seu braço com a palma de sua mão. - " Por acaso enlouqueceu, Lancaster? O que diabos pensou que poderia fazer? " - ela perguntou e de repente toda a melancolia e depressão de seu rosto desapareceram, ela parecia preocupada. Era estranho para Klaus pensar que a princesa com quem ele havia convivido grande parte de seu tempo e era terrivelmente rude e fria, naquele momento estava preocupada com o fato de que ele poderia não ter escapado da queda do palácio. Era necessário um grande processo de conhecimento para entender a mente de Sua Majestade.

- " Eu precisava salvar Vossa Alteza. " - ele respondeu ofegante segurando o ombro que havia sido golpeado pelas mãos delicadas de Morgan.

- " Onde ela está? " - perguntou William. Naquele momento, Zion se posicionou ao lado de seu pai adotivo. Klaus baixou o olhar. Era terrivelmente doloroso para ele dar notícias tão tristes para uma família. Ainda mais considerando as relações familiares daquela em questão.

- " Eu não consegui chegar a tempo, Alteza... Sarah... Sarah também está morta, Alteza. " - disse Klaus. Ele pode notar o quão os olhos de William se tornaram obscuros ao ouvir aquilo. E embora ele não esboçasse qualquer tipo de emoção diante da morte de sua esposa, era claro que sua alma lutava pelo alívio da dor naquele momento. Zion permaneceu calado com os olhos baixos, ele estava tão calado quanto normalmente já era. As mortes de sua vida o estavam fazendo com que toda sua vida perdesse o sentido. Perder a irmã mais velha e a mãe adotiva que o havia amado com tanto afoito e prezado pelo seu futuro na corte por amor a ele e a William. Ela o havia criado para ser um príncipe mesmo tendo consciência da sua falta de capacidade, ela soube que Zion seria capaz de governar aquele povo tão bem quanto seu pai e que ele merecia um lugar ao lado da alta sociedade. Ela confiou nele mais do que em qualquer outra pessoa, e pela chegada de Morgan em sua vida, e de todos os problemas que ela trouxe consigo, sua mãe tinha sido incapaz de se manter viva, por ela mesma e por seu filho.

- " É sua culpa... " - ele disse de repente. Morgan olhou para ele com dúvida e percebeu o olhar furioso dele para ela. Ela se levantou deixando Klaus jogado ao chão ainda com o ombro dolorido.

- " Zion? " - ela disse. William se virou para Zion.

- " Que bobagem está falando? " - William perguntou.

- " Tudo isso. Todas as guerras, as mortes, os desastres, a queda de meu palácio, de meu trono e do meu povo, são sua culpa! " - ele disse, Morgan estava alguns centímetros distante dele. - " Desde que casei-me com você, toda a minha vida tem se resumido a tortura constante de não ser suficiente para você em qualquer situação nem mesmo para ser pai dos seus filhos, enquanto assumia para Deus e o mundo que Audrey era sua criança legítima. A guerra que está acontecendo, é pela sua vida que eles buscam, você é o ponto chave, Majestade. Minha mãe está morta por sua causa." - Morgan sentiu um nó dolorido na garganta, a tristeza pela morte de Hazel foi subitamente substituída pelo ódio da acusação sem fundamentos de Zion Miller.

- " Não seja insolente! Esse casamento aconteceu por sua causa! Você me quis e eu dei aquilo que você queria. Em momento nenhum aceitarei ser responsabilizada pela morte de Vossa Alteza quando eu claramente não fui. Afinal de contas não fui eu quem a obriguei a tirar a própria vida. " - respondeu Morgan. Zion franziu a testa e partiu para cima de Morgan sendo subitamente impedido por Klaus que o empurrou de volta empunhando a espada para ele.

- " Ponha-se em seu lugar, Miller. " - disse Klaus.

- " É Vossa Majestade para você, Lancaster. " - respondeu o Rei.

- " Talvez eu tenha realmente me enganado quando notei capacidade em você para governar o meu povo, Zion. Um Rei nunca acusa injustamente. " - disse William.

- " Como sabe que estou acusando injustamente, pai? Vamos lá, seja sincero consigo mesmo, está a defendendo por que sua consciência pesa ao se lembrar do quão irresponsável foi por plantar sua semente no ventre de uma mulher comprometida e agora... O que pretende fazer? Recompensar os 20 anos perdidos? " - disse Zion. Era claro que a amargura no coração de Zion Miller estava crescendo, a verdade que ele negava era que ele sentia falta de sua irmã e sentia mais do que qualquer pessoa a dor de tê-la perdido.

Embora a Rainha negasse sua culpa e se sentisse indignada com as acusações de seu antigo esposo, no fundo de sua alma ela se sentia culpada por todos os acontecimentos ruins em SnowVille. A morte de Hazel, a queda do palácio, a revolta do povo de SnowVille, tudo de ruim havia acontecido com aquele Reino depois de sua chegada. Zion balançou a cabeça negativamente e entrou novamente dentro da carruagem com Audrey que estava adormecida diante o caos que se instalava cada vez com mais força e violência.

Mas naquele momento era impossível fugir, o tempo que Klaus havia perdido em busca de Sarah dentro do palácio havia tomado um tempo precioso, era necessário que permanecessem ali e se juntassem a guarda real. Eles voltaram para dentro do palácio com cautela, pisando nos restos do palácio que estavam jogados ao chão e tossindo com a poeira.

- " Klaus e Zion, venham comigo, precisamos de armaduras. " - disse William. Morgan abraçou a criança em seu colo adormecida com força como se temesse que ela escorregasse pelos seus braços.

- " Morgan... Você precisa ficar aqui, cuidar de si mesma e da Audrey. Nós vamos lutar com as tropas em apoio da guarda real. Somos fortes, tudo ficará bem. " - disse Klaus. Morgan assentiu e sorriu levemente e falsamente para Lancaster para passar a ele a segurança que ele precisava que ela passasse. Ele precisava protegê-la e queria que ela aceitasse sua proteção, eram uma dupla, Audrey era a filha deles e ela precisava estar viva, mesmo que ele não estivesse.

Os rapazes tomaram as espadas enormes nas mãos e com armaduras pesadas e fortes eles avançaram junto as tropas. Com a chegada do Rei e do Príncipe, a guerra se intensificou, era possível ouvir os gritos furiosos das tropas de Goldenwood e o barulho das espadas ficando cada vez mais altos. Morgan olhava pela janela, todo aquele caos instalado em SnowVille, as casas dos camponeses pegavam fogo e muitos deles estavam jogados ao chão sem vida. Audrey ainda adormecia em seu colo, era possível ouvir sua respiração frágil e os seus batimentos cardíacos. Outra bomba atingiu as paredes do palácio que estremeceu fazendo Morgan pender para o lado com Audrey nos braços, protegendo a cabeça de sua filha com uma das mãos, Morgan foi atirada ao chão com ignorância e franziu a testa com a dor lancinante que tomava conta do seu tornozelo e pulso que havia usado para proteger Audrey. A pequena criança despertou e ficou de pé ao lado de sua mãe enquanto sorria e brincava com as pedras e poeira que haviam caído de todos os lados possíveis do palácio. Morgan sorriu para ela e tentou se levantar, e gritou alto quando a dor se intensificou. Audrey olhou para sua mãe com uma expressão neutra e então outra bomba atingiu o palácio que estremeceu ainda mais. Audrey que tinha pouca sustentação, caiu ao lado de sua mãe e começou a chorar. Morgan a puxou para perto e se arrastou até o canto mais seguro do palácio ficando ali, e esperando que finalmente tudo acabasse.


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