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"Estou sozinha à meia noite
Tenho tentado com empenho não me meter em confusão, mas
Tenho uma guerra na minha cabeça."

Ride - Lana Del Rey

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Eu costumava gostar do verão, adorava assistir o nascer do sol nas praias, do cheiro salgado do mar, a sensação de calor queimando na pele.

Gostava até simplesmente não gostar mais, até acordar um dia e decidir que o raio do sol entrando pela janela estava me incomodando profundamente, me levantar e fechar as cortinas deixando o quarto em completa escuridão, depois dormir.

Dormir o dia inteiro.

James não estava em casa naquele dia, não esteve no outro, como não está agora, e isso deveria me incomodar, certo? Mas não incomoda. Não me incomoda quando ele chega em casa tarde da noite e vai direto para o banheiro, provavelmente para limpar o cheiro das prostitutas que ele diz não comer. Pelo contrário, eu prefiro estar sozinha.

Não vou mentir, na primeira vez em que descobri, doeu, doeu muito, eu havia acabado de perder meu pai, minha única família ainda viva. Eu acreditava que tínhamos algo mágico, que ainda seríamos uma família perfeita e feliz. Claro que ele pediu perdão, disse que estava em um momento difícil no trabalho, que a corregedoria estava investigando-o injustamente e não queria trazer mais problemas para dentro de casa.

Entendi ele e o perdoei... Como eu não o perdoaria?

Ele me trouxe flores todos os dias, disse que me amava e que tudo ficaria bem, que havia sido apenas uma vez em um momento de fraqueza, James até chorou pela primeira vez e como última tentativa, ele deu a cartada final: nós poderíamos começar a tentar ter um bebê.

Finalmente, foi o que pensei.

Íamos começar do zero, esquecer tudo que passou e tudo seria diferente, eu havia errado, ele também, mas aprendemos com os nossos erros, foi o que ele disse e eu acreditei.

Era isso, perdi meu pai, mas teria um filho, e seria a melhor mãe possível, era aquilo que eu queria, era o meu sonho.

Vivi o meu sonho, por alguns meses eu o tive comigo, até ele me deixar também.

Por seis meses tive esperança, por seis meses acreditei que tudo finalmente estava se encaixando, até eu acordar um dia, e não sentir ele se mexer, até eu enxergar tudo vermelho nos lençóis brancos. Ele se foi, e levou o resto de mim junto.

Me tornei um fantasma de mim mesma, me olhava no espelho e não via ninguém, apenas um reflexo vazio e triste, uma sombra do que um dia eu fui.

James voltou a me trair, se bem que, acho que ele nunca chegou a parar de verdade...

- Lise? - escuto James me chamar seguido pelo barulho da porta de entrada bater.

- Sim? - me sento na cama e logo ele entra no quarto acendendo a luz.

James nunca foi um cara lindo, ele era engraçado, me fazia rir sempre, eu gostava disso, e para mim, era mais do que suficiente. Observando-o agora, parado na porta de camiseta social preta com uma arma escondida na cintura e outra na perna por baixo da calça jeans, os olhos castanhos, o cabelo louro escuro... não sobrou mais nada que eu goste nele.

- Temos um jantar beneficente hoje, por favor, - ele olha para cima exasperado - só, se comporte - completa dando um sorriso amarelo.

- Claro - é o que eu respondo.

Levante.

Se arrume.

Sorria.

Acene.

All for Heart Parker.Onde histórias criam vida. Descubra agora