Foi antes das seis horas da manhã de segunda-feira, sob o despontar dos primeiros raios de sol. Cassandra praticava a sua corrida matinal ao longo da Avenida Perimetral, em uma das poucas regiões da cidade que poderiam ser consideradas planas: o setor Mauro Bento. Ela sentia o ar fresco da alvorada interiorana invadindo seus pulmões e o oxigênio subindo para a cabeça, dando uma sensação de leveza sem igual, enquanto observava as construções simples presentes no bairro. Casas térreas, de alvenaria, muitas vezes sem o acabamento estético porque o dinheiro dos proprietários só deu para terminar de erguer o muro e colocar um portão. Alguns muros possuíam arames em seus cimos, como reforço de segurança profissional, enquanto os mais humildes contavam com espetos de aço, cacos de vidros cravados em cimento ou nada.
Vestida com calça legging e camiseta regata, calçando um discreto par de tênis de corrida e monitorando as suas estatísticas através de um smartwatch, a investigadora da polícia civil brasileira fazia um caminho diferente dos outros dias. Sempre variava, na verdade, pois gostava de fazer o reconhecimento de novas áreas. Deixou o carro estacionado algumas quadras antes e seguiu correndo naquela direção, até chegar ali, onde o vento suave e fresco soprava em seu rosto. Era a sua forma de mapear o território. Os únicos estabelecimentos abertos naquele horário eram as padarias e ela já tinha passado por todas as duas que existiam na região, sentindo da rua o aroma dos panificados frescos que saíam do forno. Na volta compraria alguns pães fofos e roscas besuntadas de melado.
A mulher passou por algumas pessoas paradas no ponto de ônibus, esperando pacientemente pelo transporte coletivo que tendia a demorar em sua rota cotidiana, principalmente porque a frota operava com o mínimo do mínimo que podia ofertar, tanto em número de veículos quanto em condições de conservação. Como mandam as normas sociais não expressas de maneira formal, lei goiana implícita, mas levada muito a sério, deve haver um cumprimento simpático toda vez que se faz contato visual com alguém que esteja de passagem. Foi o que aconteceu entre ela e o grupo. Ela ouviu os cumprimentos de senhoras segurando bolsas e guarda-chuvas, jovens com mochilas e uniformes escolares, e adultos, em seus uniformes de trabalho, enquanto observava as fisionomias por milésimos de segundos. Esboçou um grande sorriso perfeito em seu rosto e devolveu a gentileza dirigida a si.
Não era natural de Jataí, apesar de ser goiana. Sabia que em todo lugar as pessoas eram cordiais como eram por ali, então já estava preparada para responder gentilezas, parar para conversar amenidades aleatórias ou ouvir desabafos lançados sem pretensão alguma.
O cargo público exigia uma certa disposição com a população, postura para tecer teias de relações e informações. De toda maneira, ela não achava que era um fardo, divertia-se um bom tanto.
Virou na esquina da Avenida Perimetral com a Rua Trinta e Sete, na intenção de seguir até o Parque Ecológico José Gonçalves Brito, mais conhecido como Parque Brito, que podia ser avistado lá no final da rua. Enchendo os pulmões do mais fresco ar e usufruindo de puro prazer, Cassandra atravessou a última rua, a Avenida Perimetral do Bosque, antes de pisar na calçada do parque. Se escolhesse seguir para a direita, iria na direção do clube Cochabamba, mas preferiu ir para a esquerda, na direção do lago.
Havia um nevoeiro suave por ali, que desaparecia conforme o sol ascendia no céu.
Nos fones de ouvido, um trance dos anos dois mil tocou, animando ainda mais a mulher, que correu pela calçada em passadas largas, passando pela grama, onde havia uma quadra e árvores do cerrado, pela mata ciliar fechada, que não era tão vasta, porém era densa, e pelo lago de águas um pouco escuras. Ao lado do lago o clima estava um tanto gelado, fazendo seus pelos se eriçarem. Cassandra acelerou a marcha na subida pouco pronunciada, rumo à pista de skate. A vista do lago estava um pouco obstruída e causava leve receio, apesar de a mulher não ser medrosa.
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Assassinato no Parque Brito (postando)
Mystery / ThrillerTetragonisca Angustula é o nome científico - e branco - de um poderoso e belo inseto de cor dourada. Uma abelha sem ferrão, pequena, nativa de regiões latino-americanas, que produz um delicioso mel, cuja suavidade é incomparável. Não fosse o suficie...