CONEXÕES

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Todos os pedreiros combinaram de chegar atrasados na construção. Exaustos, indignados, não suportavam mais o fato de que o pagamento não estava em dia. Se não havia urgência em pagar o salário, também não haveria urgência em ter a obra pronta.

Maurício estacionou seu Monza prata na frente do prédio inacabado. Conjecturava em silêncio, com ar de tristeza, sobre as agruras da vida, porque quando saiu de casa precisou dizer para o filho pequeno que não tinha dinheiro para comprar um pacote de bolacha recheada. Não tinha sequer para o arroz e o feijão. Aquilo doeu em si. Estava com ódio e por isso concordou em fazer birra para aquela construtora da família ricaça. Com calma, picou o fumo de corda com seu canivete, depositando o material sobre o capô com uma mancha de descascado da tinta; o carro velho ficou demais no sol. Quando terminou, enrolou o fumo na palha seca e acendeu com seu isqueiro verde, após riscar duas vezes. Tragou como se fosse um néctar dos deuses. O fumo ajudava a enganar a fome jà que ele não tinha tomado café-da-manhã e seu estômago roncava mais do que motor de trator velho. Aos poucos o organismo deu trégua. Podia comer a marmita, mas depois ficaria sem nada. E seria pior.

Jurandir e Maxilânio também chegaram. Todos traziam cara de enterro. Maurício não perguntou nada. Na selva da pobreza e do trabalho, era cada um com seus problemas.

Jurandir já cheirava à cachaça mais barata e estava com os botões da camisa desalinhados, colocados nas casas erradas. E com o peito branco, avermelhado pelo exercício.

Se cumprimentaram. Fizeram uma ou duas piadas e foram pegar os materiais de trabalho que ficavam trancados. Todos odiavam trabalhar ali porque era o último bairro da cidade, na última rua, longe de tudo. Mal passava gente para que eles se distraíssem observando.

Maxilânio ligou seu rádio a pilha. As estações tocavam mais propagandas do que músicas, mas o rádio era como o whisky: um hábito adquirido do consumo. Ajudava a controlar a ansiedade e acalmar os pensamentos.

Maxilânio pegou o carrinho de mão e entrou na construção para tirar alguns lixos. Andou calmamente, empurrando a carriola.

Parou o carrinho e se agachou para catar uma tábua quebrada, quando viu o sangue fresco e vermelho escorrer um pouco pastoso.

A respiração do homem ficou irregular, o coração acelerou e começou a bater forte no peito, aumentando a pulsação na garganta. Lutando contra o medo e segurando a tábua como uma arma, Maxilânio se adiantou e deixou seus olhos verem a verdade no chão de terra batida no cômodo seguinte.

Saiu correndo depois de ver e vomitou o café puro do lado de fora.

— Chama a polícia! — Disse para os companheiros. — Chama a polícia!

— O quê...? — Jurandir disse ao ir olhar.

Maurício acompanhou.

Maurício desmaiou e Jurandir discou o número da polícia com dedos trêmulos. Era, seguramente, o pior dia de sua vida.

*****

Cassandra se amaldiçoou mentalmente ao ver as fotos da família. Investigou a mãe primeiro, encontrando apenas postagens sobre a importância da família, citações bíblicas e convites para a igreja, mas nenhuma foto. Algumas campanhas de caridade também estavam em seu portfólio de senhora modelo. O marido tinha perfil com baixa manutenção. Citações bíblicas, marcações, duas fotos com a esposa e algumas de eventos importantes ao longo dos anos. Havia uma foto com os quatro membros da família em um acampamento noturno no lago Bonsucesso. Mal iluminada, porém com marcações dos perfis.

Cassandra abriu primeiro o da menina, e arregalou os olhos enquanto via as fotos da moça. Uma face conhecida para si, que trouxe sentimentos perturbadores. Cassandra fez capturas de tela e salvou as fotos.

Assassinato no Parque Brito (postando)Onde histórias criam vida. Descubra agora