Shhh

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  Naquela manhã, dois envelopes vermelhos chegaram ao salão principal:

  Berradores; um deles pousou na mesa da Grifinoria, o outro, na corvinal, destinados aos irmãos Black.

  - VOCÊS DOIS SÃO DESSERVIÇOS PARA ESSA FAMÍLIA! ONDE FOI QUE ERREI? EM TODOS ESSES ANOS! TOUJOURS POURS! CRIANÇAS IMPRESTÁVEIS E NOJENTAS! NÃO SERÃO MAIS TOLERADAS COMO ANTES, AO VOLTAREM, TERÃO DE ARCAR COM AS CONSEQUÊNCIAS DE SEUS ATOS! DESPREZÍVEIS! DESPREZÍVEIS!- Gritava a voz de Walburga Black, a mãe dos meninos.

  Sirius largou sua torrada com apenas uma mordida e saiu do salão, de cara amarrada, com as mãos no bolso e postura ereta, evitando ao máximo encarar os olhares curiosos, provavelmente para não chorar. Regulus tampava os ouvidos e fazia uma careta; o garoto tremia como se tivesse acabado de levar um choque, balançava a cabeça em negação, enquanto Pandora tentava acalmá-lo e outros lançavam olhares maldosos e risonhos. Remus pegou a torrada do prato de Sirius e juntou às suas.

  - Fico preocupado com ele, quase não come, ainda mais quando acontece algo em relação à família- Disse o garoto, enquanto comia, a cicatriz no canto de sua boca entortava para baixo.

  - Ele vai ficar bem, só tá assim por conta do irmão, Regulus parece ser bem sensível pra idade. Sirius quer proteger ele, meu irmão também é assim, fica nervoso quando eu tô doente.- Tranquilizou Marlene, limpando seu bigode de leite com a manga da camisa e se levantando.- Eu vou atrás dele, alguém?

  James se levantou imediatamente, óbvio, visto que ele e Black eram grudados, quase como gêmeos siameses. Peter levantou um pouco depois, para acompanhar. Remus apenas assentiu, mas não se levantou; o garoto continuou comendo. Os três saíram do salão a procura de Sirius.

  - Por quê não foi?- Perguntou Lily.

  - Não fui porquê não quero.- Remus olhou para trás, Pandora e Rosalina tentavam acalmar Regulus.- Prefiro não me meter em assuntos de família, são coisas delicadas.

  - É tipo quando alguém fala do seu pai né? Porque tipo, até metade do ano passado você jurava de pés juntos que era trouxa só pra não falar del...- Alice começou e se interrompeu, após um olhar melancólico do garoto e tosses falsas de Mary e Lily. As vezes a garota não tinha muita noção do que falava, mas não fazia por mal.

    ****

  Naquele mesmo dia, na aula de poções, Snape estava cortando os ingredientes enquanto Lily preparava a solução. Tudo estava quieto, e para a surpresa da menina, o garoto foi quem começou o assunto.

  - Aquele garoto, Regulus, é todo esquisitinho não é mesmo?- ele cochichava, para que apenas Lily escutasse- Ele ficou o café todo tremendo, chorando e tampando os ouvidos, depois saiu imóvel, sem falar nada, olhando pro nada, nem agradeceu as duas garotas que tentaram ajudar ele. Tinha que ser irmão do Sirius. Pelo visto a maluquice é de família.

  - Ele estava com medo Sev, chocado. É normal, você também ficaria assim, eu também. Receber um berrador da própria mãe... Na frente da escola toda... No seu segundo dia! Deve ser aterrorizante. Me sinto mal por ele.

  - Olhando por esse lado...- Severus deu de ombros e voltou a cortar as ervas e colocá-las na balança para pesar.

  Sirius inrrompeu a porta e entrou com passos pesados, sem nem mesmo pedir licença. Seu rosto pálido estava inchado, com o nariz e as olheiras vermelhas, seus olhos azuis brilhavam enlouquecidos, sua pupila quase inexistente tremia, indo rapidamente de um lado para o outro, nunca parando em um ponto fixo, assim também faziam seus dedos; ele andou devagar até Slughorn, sendo escoltado por James, Marlene e Peter.

  - S...Senhor S... Slugh...Horn.- Black gagueijou baixinho, com a voz chorosa e fraca.

  - Sim?- O professor se virou, com uma expressão serena.- Posso saber por quê os quatro estão aqui agora e somente agora?

  - Estávamos acompanhando Sirius na enfermaria!- explicou James, e os outros dois assentiram.

  - Imagino que tudo isso seja devido aos ocorridos de hoje, certo? Não me leve a mal, mas recebi muitos Berradores na época da escola. Se a cada um deles eu tivesse um surto, estaria morto. Um berrador não faz mal a ninguém, sua mãe está certa em te educar garoto. Ninguém aguenta crianças mimadas. Agora vão se sentar vocês quatro, mas não se acostumem, essa será a primeira e última vez.- O professor disse isso como algo comum que dissesse todos os dias para uma criança de doze anos, como se estivesse dizendo "o almoço está pronto, te amo filho!" Lily viu pela primeira vez, Sirius encolher os ombros e abaixar a cabeça. Ele se sentia diminuído. A garota sabia que o professor não havia dito por mal, ele vivera em uma geração diferente, é verdade, mas haviam maneiras melhores de se dar aquele conselho. Melhor do que ninguém, Lily sabia oque era ter seus sentimentos menosprezados; ela passava por isso o tempo todo, com seu pai, sua irmã e até mesmo com seu melhor amigo. A aula continuou em completo silêncio, algo raro quando se juntavam Grifinoria e Sonserina em uma mesma sala.

    ****

  Regulus se encontrava sentado no chão do corredor de pedra, encolhido e abraçando as pernas, na porta da enfermaria. Ele se recusava a entrar. Lily e as garotas passavam por ali em direção ao salão principal para o almoço e escutaram uma vozinha fina dizendo:

  - Regulus por favor!- A menina pedia, abaixada ao lado dele. Regulus levava as mãos a cabeça e puxava os cabelos, como se fosse arrancá-los. A garota tirava as mãos de sua cabeça e as segurava.- Não faça isso! Você tem que entrar! Madame Pomfray é legal! Ela cuidou do seu irmão você não viu?

  Lily e as meninas foram até ela.

  - Ei, está tudo bem aí?- Mary perguntou.

  - É Regulus, ele está em uma espécie de greve do silêncio desde o... você sabe. A única coisa que ele faz é "shhhh" quando alguém fala muito alto.

  Lily olhou para Regulus, que olhou para ela novamente, mas não em seus olhos, e sim em seu todo. Ela pensou e pensou, até que teve uma ideia.

  - Regulus, você não quer falar ou não consegue falar?- o garoto de de ombros, como se nem ele soubesse a resposta.- Você gostaria de escrever?- os olhos dele brilharam com a ideia. Quando Lily não conseguia se expressar com palavras, ela escrevia. Era disso que Regulus precisava, mas talvez fosse tão oprimido e forçado a se comunicar, que nunca havia pensado nisso. Lily entregou a ele papel e pena, logo o garoto começou a escrever.

  Ele mostrou o bilhete às garotas, com os seguintes dizeres:

  "Estou assustado, desapontei a mamãe e agora ela está triste e brava. Eu odeio esse lugar e quero ir embora. Todo mundo ri de mim, todo mundo me olha, eu não gosto disso, não gosto que me encarem, são muitas pessoas. Minha voz não sai, não consigo falar e não sei porquê. Mas mesmo se saísse, eu não falaria, porquê não quero. Isso acontece as vezes, passa depois de um tempo, normalmente. Não vou à enfermaria."

  - Okay, então oque fazemos pra você voltar ao normal?- Questionou Mary. O garoto voltou a escrever.

  " em casa, eu costumava pedir a Monstro que juntasse fiapos de lã. Eu trançava eles, isso me acalmava e eu voltava a querer falar. Oferecia as peças a ele, mas Monstro nunca aceitava, ele ficava bem ofendido, na verdade."

  - Então você só precisa de lã?!- Mary pareceu surpresa

  - Quem é Monstro?- Perguntou Pandora, curiosa

  - Você faz crochê?- Marlene questionou, com um tom de riso. Regulus fez cara feia e ela logo se conteve.

  - Bom, eu tenho muitos novelos e agulhas no meu baú, minha avó quem me deu! Eu posso te emprestar alguns, se quiser.- Mary ofereceu e o garoto assentiu, se levantando com as mãos no bolso, já com um semblante mais agradável.

  Após voltarem para o salão principal para finalmente almoçarem, Regulus já falava algumas poucas palavras, mas o suficiente para agradecer. Ele ainda parecia nervoso, porém menos que antes.

Mexeu com uma, mexeu com todas! (Juro solenemente não fazer nada de bom)Onde histórias criam vida. Descubra agora