Meu romance à moda antiga 1: além das fronteiras (COMPLETO)

Capítulo 14

                                  Fevereiro de 2019

Noemi já estava há um mês no Brasil e, estranhamente, começou a se sentir deslocada. Quando tinha chegado aqui para o casamento de sua amiga, tinha se sentido em casa, mas agora era estranho. Talvez fosse porque tinha passado muito tempo fora e agora estava com saudades da sua casa em Boston. Ou talvez fosse por Valentina não estar lá, ela nunca ficou tanto tempo assim longe da filha. Mas seja lá qual fosse o motivo, ela já não se sentia mais em casa.

Toda vez que descia para o café da manhã e via Solange à mesa ainda era estranho. Não era tão ruim quanto no início, mas ainda assim, lá no fundo, ela sentia que alguém estava ocupando o lugar de sua mãe. Ela tentava não demonstrar seus sentimentos, tentava ser o mais gentil e amigável com sua madrasta. Mas sabia que eles percebiam seu desconforto ao ver que as fotos do casamento de seu pai com a sua mãe foram substituídas pelo casamento dele com Solange. Era por isso que eles evitavam as demonstrações de afeto na frente dela – e ela começou a se sentir um estorvo naquela casa, como se estivesse atrapalhando-os.

Foi mediante a tudo isso que ela decidiu que encontraria um apartamento em breve. Não precisava ser um espaço muito grande, apenas um lugar que ela poderia chamar de seu novo lar. Queria um lugar pequeno, precisava apenas de dois quartos, para ela e sua filha, e um escritório, para poder trabalhar.

Mas, bem, para não dizer que o último mês só teve pontos negativos, tinha um lugar em especial que Noemi se sentia bem à vontade: sua antiga – e agora atual – igreja.  

Poder voltar a cultuar da maneira típica que sua igreja cultuava era bom demais. Apesar de fazer parte do mesmo tipo de denominação, a igreja do Brasil era completamente diferente da dos Estados Unidos. Lá em Boston tinha uma pega mais worship – o que ela gostava muito –, mas sua igreja do Rio era mais pentecostal, o que ela gostava demais. Sentiu saudades de cantar os hinos da harpa cristã – hinário oficial de sua igreja – e das oportunidades distribuídas aos irmãos ao longo dos cultos. O carisma dos cristãos brasileiros era também uma das coisas que mais sentiu falta. a simpatia, simplicidade, prontidão e afeto, não tão característico de sua antiga cidade, mas fazia parte da personalidade dos irmãos em Cristo brasileiros.

Ficou triste em saber que muitos jovens haviam se desviado dos caminhos do Senhor nesses últimos dois anos que ela estivera fora, mas também muito feliz por ver rostos novos e poder conhecer cada um deles. Alguns tinham até se oferecido para estar com ela no projeto das comunidades, o que a deixou muito contente, pois se fosse embora o projeto não seria tão prejudicado assim, então quanto mais pessoas ajudando melhor.

Boa parte dos irmãos da igreja se moveram em favor das crianças das comunidades, contribuindo com ajuda financeira ou doando seus serviços. Essa ajuda foi crucial para o andamento da obra. Com o dinheiro arrecadado – e amis algumas colaborações mensais de empresários locais –, eles conseguiram alugar um espaço, na entrada de uma favela bastante conhecida em sua cidade. Ela sabia o quanto aquele lugar costumava ter fama de perigoso e foi justamente por isso que ela escolheu lá. Sabia que o projeto poderia dar uma nova oportunidade para aquelas crianças não seguirem mais aquelas vidas.

A ideia do projeto contava com cursos profissionalizantes para adolescentes, aulas de dança, música, artes e reforços escolares para todas as idades, e alfabetização para adultos e aula de corte de costura, para as mulheres poderem ter uma renda extra, tudo de uma forma gratuita, com professores voluntários. Eles ainda não tinham achado todos os professores necessários, mas Noemi resolveu assumir o posto de professora para a alfabetização e artes, enquanto seu melhor amigo – e também estilista – daria as aulas de corte e costura. Os demais professores, Noemi tinha fé que Deus os enviaria.