– Obedeça ao papai hein, Valentina! – Noemi conversava com a filha por chamada de vídeo.
– Eu queria ir com vocês – choramingou.
– Eu já falei que não sabemos como será aqui. Assim que tivermos certeza de que estamos seguros eu busco você. – Agora a mamãe vai ter que desligar, pra ajudar seu pai com as malas.
Ela desligou o telefone e foi ao encontro de seu marido. Arun tinha ido buscar as malas na esteira, enquanto Noemi atendia a chamada a filha. A viagem que era pra ter sido feita dois anos atrás só teve início agora, com o fim da pandemia. Arun, depois de muitos anos, finalmente colocava o pé em solo indiano mais uma vez, dessa vez preparado por Deus.
Eles conseguiram fazer contato com uma base missionária e estavam preste a encontrar um dos missionários que iria encontrá-los no aeroporto.
– Oi, amor – Arun se aproximou de sua esposa –, vamos lá pra frente, o irmão já deve estar nos esperando.
Juntos eles caminharam em direção a saída.
Noemi estava nervosa. Não era um nervosismo ruim, era apenas a ansiedade de não saber o que os esperavam no campo missionário. Os anos no sertão nordestino foram maravilhosos, cheios da presença de Deus. Ela sabia que podia confiar em Deus para aquela nova fase (e em todas a próximas) da vida, mas ainda assim ela considerava ser compreensível a sua preocupação. Ela tinha uma certeza muito grande em seu coração que o momento em que pisasse o pé em território indiano nunca mais veria seu país novamente – e mais tarde ela descobriria estar certa.
Quando chegaram do lado de fora, procuraram pelo missionário e seu carro. Foram cerca de uns 20 minutos até que o homem chegasse e assim que ele saiu do carro para os receber, Noemi viu seu esposo ficar pálido. Ela não sabia se devia se preocupar ou não. Seguiu os olhos do marido e viu um missionário com um grande sorriso estampado no rosto. Ele era um homem alto, com cabelos parecidos com os de seu marido. Ele não estava usando uma roupa típica indiana, apesar de estar evidente que ele era um. Noemi não conseguiu disfarçar o olhar quando viu a pele toda enrugada do esquerdo do homem. Aquilo eram queimaduras.
– O filho pródigo sempre volta, não é mesmo? – O homem falou, em hindi.
Arun começou a ensinar o idioma para sua esposa após um ano de casado, depois de muita insistência dela, o que a fez entender perfeitamente o que o rapaz disse. Ela olhou para seu marido e viu o rosto tomado por lágrimas, foi aí que ela se deu conta do que estava acontecendo.
– Meu Deus! – Ela pôs as mãos na boca. – Não é possível – falou em português.
Arun sabia que era ele desde que o viu de costas, quando ele se virou para eles só ficou confirmado que de fato seu amigo estava vivo. Como era possível? Ele se lembrava de não haver nenhum sobrevivente. Como Raj estava ali? Será que ele estava começando a alucinar?
– Não vai vir cumprimentar seu velho amigo, Arun?
Ele correu para abraçar o rapaz, em lágrimas.
– Como é possível?
– Deus tem seus mistérios, Arun, você já vai descobrir isso. – Ele olhou para Noemi pela primeira vez. – Não vai me apresentar sua esposa? – Dessa vez ele falou em inglês, imaginando que ela não sabia a língua materna.
Arun estava tão envolto no recente acontecimento, que demorou um tempo para a sua mente voltar para a realidade, por isso a própria Noemi caminhou até eles e se apresentou.
– Prazer, me chamo Noemi! – estendeu a mão para cumprimentá-lo.
– Prazer, eu sou o Raj. Sou o administrador da base missionária aqui da Índia, é um prazer recebê-los.
O caminho até a base missionária foi repleto de revelações e diversas surpresas. Eles descobriram que Raj conseguiu correr do galpão incendiado, mesmo com parte do corpo em chamas. O rapaz acabou desmaiando no meio do caminho e quando acordou estava na casa de um casal indiano que havia perdido o único filho anos atrás. Raj disse que foi Deus que os colocou no caminho dele e Ele também foi o responsável por fazê-los irem contra sua religião e costume ao aceitar o rapaz de casta inferior em sua casa. O casal ignorou as regras local e o adotou, mesmo já sendo de maior idade, e o mandou para o Estados Unidos, para que pudesse estudar, se qualificar e voltar com uma nova identidade, para que ninguém mais soubesse que ele era um dalet. E ele fez isso. Para as demais pessoas ele se chamava Ravi, somente os missionários da base sabiam seu verdadeiro nome.
– Noemi, eu tenho uma surpresa para você – disse Raj, recebendo olhares curiosos do casal. – O nome dela é Kali.
Noemi simplesmente não conseguiu acreditar no que ele disse – e você em breve conhecerá essa história.
O novo casal foi muito bem recebido no lugar e em semanas já estavam completamente adaptados a sua nova vida.
De fato, a vida na Índia não foi fácil, eles sofreram muitas perseguições, mas em todas eles passaram com uma fé ainda maior.
Eles de fato nunca mais pisaram em solo brasileiro, em nenhum outro. Ficaram naquele lugar até seus últimos dias de vida, cumprindo o chamado de Deus na vida dele. E, para a surpresa dois, eles realmente não passaram um dia só. Tiveram mais de cem filhos adotados, quando os resgataram do sistema de castas daquele país, mostrando um Deus justo e que ama a todos os seus filhos sem acepção de pessoas.
FIM
VOCÊ ESTÁ LENDO
Meu romance à moda antiga 1: além das fronteiras (COMPLETO)
RomanceAté seus 18 anos, Arun era um jovem dedicado à obra de Deus, com o sonho de viajar o mundo em missões e pregar o evangelho a todos que quisessem ouvir. No entanto, sua vida mudou drasticamente após uma viagem para sua terra natal, na Índia. Retornan...