Sorte

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"O que você faz me ajuda a cantar/ Põe um sorriso na minha cara/ Meu amor, você me dá sorte, sorte na vida"

Era quinta-feira e Pitel não teria aulas aquele dia, mas Fernanda teria um ensaio. Estava de carro novo, Laura estava em festa enquanto Marcelo muito feliz com a novidade. Fernanda conhecia Marcelo na palma da mão e sabia qualquer manifestação de sentimento dele. Após deixar eles na escola, resolveu passar na casa de sua mulher. 

Desde que havia ganhado o carro Fernanda sentia que deveria levar Pitel para todos os lugares que a morena queria ir. As duas haviam se aproximado muito e nos dias que Fernanda ficava mais em Niterói buscava a cacheada para ficar com ela e as crianças, que já identificavam em Pitel uma amiga.

Pitel se sentia inserida naquela rotina e isso a realizava por dentro. Na próxima semana teriam aula com a Luisa, Fernanda lamentou não poder ir mas os ensaios do musical eram completamente diferentes e o processo era intenso. 

Quando chegou segunda, Luisa entrou no galpão com novidades:

- Bom dia pessoal! Essa semana eu darei aula nos três dias, pois vamos fazer uma peça. Vocês terão suas aulas direcionadas para a peça e o papel de cada um, eu vou dirigir. Hoje vou realizar os testes com cada um de vocês.

A peça falava sobre um romance em uma comunidade do Rio e tinha como pano de fundo o tráfico de drogas. Eram três núcleos: O traficante principal, sua namorada uma mulher da comunidade, sendo ela protagonista deste núcleo e alguns moradores da zona sul que viviam a mesma situação de tráfico e usuários sendo que o foco era mostrar a diferença de tratamento para pessoas com o mesmo problema mas de classes sociais diferentes.

Os testes foram individuais e todos estavam nervosos, alguns desenvolviam melhor que os outros. Luisa anotou em seu caderno, colocando os mais inibidos na comunidade com textos reduzidos. Pitel seria uma garota de Copacabana e ela seria protagonista da zona sul, uma menina viciada que foi introduzida ao mundo das drogas por melhor amigo Lucas.

Lucas era carioca e residia na Maré, era de poucas palavras, conversava apenas com Rodriguinho. Todos ali o chamavam de Buda, apelido que ele havia se apresentado. O objetivo de Lucas era ser menos tímido. Ao saber do seu papel ficou muito feliz, pois era um papel de destaque e de todas meninas do galpão Giovanna Pitel pra ele era a mais bonita. Além do que ele havia sido informado que durante algumas abordagens dele na "amiga" existiriam momentos de beijos. A amizade dos dois seria bastante conflituosa, com Pitel correndo atrás dele para conseguir drogas e ele usando disso para aproveitar da garota.

Pitel ao ler o texto, ficou em estado de choque. O texto era enorme e muito pesado. Além do que, ela seria uma das protagonistas de um dos núcleos. Ficou com muito medo de não dar conta do recado. Ao sair do galpão encontrou Fernanda estacionada na rua. Despediu de todos dessa vez mais rápido, queria o conforto de sua mulher.

- E aí amor como foi seu dia? - Fernanda disse dando um beijo rápido nela antes de dar partida no carro.

- Foi bom... Nanda, vamos fazer uma peça - Pitel falou baixo.

- Que ótimo amor! Sobre o que? - Fernanda estava muito feliz com a novidade.

Pitel contou tudo, o papel de cada um, o enredo, quando chegou no seu papel e explicou a conexão com o Buda, sentiu Fernanda respirar mais fundo e fechar levemente o semblante. Fernanda não queria esboçar reação, queria passar naturalidade, mas não resistiu.

-Pô cara, com tanto papel logo você vai ter que sair beijando o cara lá?

- Não Nanda, não será sobre beijo, eu nem sei como vai ser. Mas a maioria dos meus textos são com ele.

- Tô brincando Pitel - Não, ela não estava. Mas não queria ser infantil - Teatro é assim mesmo, vamos passar muito por isso ao longo da nossa vida, se quisermos seguir carreira de atrizes, claro! Fico muito feliz por você, será um papel de destaque! Podemos passar o texto juntas!

As duas seguiram caladas. Desde que estava com o carro, muitas vezes Pitel dormia em Niterói. Fernanda sempre perguntava se tava tudo bem por ela, e ela sempre concordava porque não tinha vínculos para permanecer no Rio, sua prioridade era estar com Fernanda. Na verdade ela estava só esperando Fernanda chamar ela para mudar de vez, mas a mais velha parecia que nunca ia tomar aquela atitude.

Chegando em casa Fernanda fez um bolo para o café da tarde, um bolo simples de cenoura com cobertura de chocolate. Pitel estava inquieta, parecia criança. Ora ia na cozinha perguntando o que podia ajudar, se ia demorar, ora se entretinha em seus papéis. Ela estava sentada com eles apoiados em um balcão que dividia a sala da cozinha quando Marcelo chegou.

- Tia Pitel, me ajuda com o dever? - Seu coração amoleceu, sabia que a aproximação de Marcelo era difícil, se sentiu importante com o pedido do menino.

Fernanda que escutou a princípio assustou, ele só fazia isso com ela. Ela sorriu e sentiu que ele estava cada vez mais próximo de Pitel e era tudo que ela queria. 

Já era tarde quando colocou os meninos na cama, Pitel a esperava no sofá. Fernanda foi direto para cozinha, pegou duas taças um queijo que estava na geladeira, viu Pitel no sofá os cabelos cacheados caindo sob o rosto, foi em sua adega e pegou um vinho. 

- Amor vamos beber um vinho para comemorar o dia de hoje? - Fernanda disse com uma voz sexy, mais rouca, acompanhada de um sorriso.

- Vamos! Vou colocar uma música pra gente.

Fernanda abriu o vinho serviu as taças e antes de brindar deu um beijo que deixou Pitel sem fôlego, deixando ela levemente molhada e fazendo ela pensar que a noite ia ser longa. Brindaram à elas, beberam um pouco do vinho. Fernanda sempre encarando Pitel que corada mordia os lábios para controlar o desejo que estava de tirar a roupa de Fernanda naquele sofá mesmo.

As músicas iam tocando, elas cantavam olhando uma pra outra, sem conseguir terminar pois sempre terminavam beijando novamente. Os beijos cada vez mais quentes fez com que elas colocassem as taças no chão para poder ter as mãos livres e aproveitar mais do momento.

Tocou Sorte, na versão com Gal Costa e Caetano Veloso. Fernanda cantou para Pitel:

- Tudo de bom que você me fizer faz minha rima ficar mais rara. O que você faz me ajuda a cantar põe um sorriso na minha cara. Meu amor, você dá sorte - Pitel sorria, apaixonada e embriagada. - Pity você quer namorar comigo?

O sorriso de Pitel iluminou a sala. Ela abaixou os olhos sorrindo e Fernanda teve vontade de colocar Pitel em um potinho e carregar ela. "Ela era muito fofa, muito linda, muito sexy. Ahhh como eu amo essa mulher!" Fernanda pensava enquanto esperava aflita a resposta, olhando Pitel com olhar de interrogação apaixonada.

- Claro que aceito Nanda, eu quero te namorar desde o primeiro dia que te vi. 

Fernanda a beijou, o beijo era o mesmo mas dessa vez estava beijando sua namorada: a mulher que ela havia escolhido para ela. 


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