30.

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Lauren

Eu só me recordo do local onde os lorpas moram porque Fiona disse: "Cristo! Que bagunça! E bem debaixo da Blackfriars Bridge. Esta cidade foi para o inferno mesmo", quando estava me arrastando para o carro dela.

Não leva muito tempo para chegar a Blackfriars vindo de Hounslow. É dia de Natal e não há ninguém na rua. Estaciono o carro e abro caminho na neve até a dianteira da ponte.

Começo a me sentir levemente em pânico.

Sei que não deveria ter vindo sozinha, mas todos a quem eu poderia ter pedido ajuda teriam me arrastado para a questão mais premente: o fato de que minha família está agora magicamente sem teto. Nem Fiona teria me ouvido hoje.

Camila e Dinah voltaram à tarefa de salvar o dia. Ou destruí-lo. Talvez as duas coisas. Tudo bem, eu sempre soube em que pé me encontrava com Camila: logo abaixo do resto do mundo. E muito, muito abaixo do Mago.

Tudo bem. Está tudo bem.

Estou com medo, mas isso é razoável. Tente você voltar ao lugar onde foi mantida em um caixão até não conseguir mais se lembrar da aparência da luz.

Mas estou numa posição melhor do que estivera da última vez. Em primeiro lugar, estou consciente. Tenho minha varinha. E estou atenta ao mundo ao meu redor.

A porta para o covil dos lorpas é fácil de encontrar – basicamente, não passa de um buraco nas pilastras. Eu deslizo por um pouco de lama, meu estômago se revira com o cheiro. Papel molhado e podridão. Estou no lugar certo.

Está escuro demais aqui até para enxergar, então estendo a mão e acendo um fogo na palma, iluminando um círculo de nada ao meu redor.

Deixo as chamas crescerem... e vejo mais um monte de nada. Estou em uma câmara cheia de destroços. Nacos de asfalto. Pedras grandes. Nada disso é familiar; eu estava inconsciente quando fui trazida para cá, e praticamente inconsciente quando parti. Nem sei de fato como é a aparência dos lorpas.

Eu pigarreio. Nada acontece.

Pigarreio de novo.

– Meu nome é Lauren Pitch. – anuncio em voz alta. – Estou aqui para fazer uma pergunta a vocês.

Uma das grandes coisas pedregosas começa a tremer. Eu estendo o fogo em sua direção. E minha varinha.

A coisa pedregosa se desdobra como um Transformer numa coisa rochosa ainda maior que parece estar vestindo um suéter gigante cor de aveia.

Você. – a coisa ribomba numa voz que lembra um ronco de trator.

É um ribombar conhecido. Sinto as paredes se fechando ao meu redor, e sinto na boca o sabor de sangue velho. (O sangue é mais espesso quando envelhece; ele coagula.)

Você. – diz a coisa. – Você matou alguns de nós.

– Bem, vocês me sequestraram. – digo. – Se lembra?

Não te matamos. – o lorpa diz. Há mais dessas coisas agora, estalando ao meu redor. Não vejo de onde estão vindo, mas parece haver menos destroços largados no chão. Tento identificar seus rostos; tudo neles é amarelo-acinzentado sobre amarelo-acinzentado. São como montes de cimento úmido.

– Vocês estavam a meio caminho de me matar – digo –, mas não é por isso que estou aqui. Vim conversar com vocês.

Estou cercada. É como estar dentro de um círculo de pedras.

Não gostamos de conversa. – um deles ronca. Pode ter sido o de suéter de novo. Ou pode ter sido esse outro, logo ao meu lado, vestindo um cobertor elétrico, o plugue se arrastando no chão atrás dele.

Ascensão e queda de Camila CabelloOnde histórias criam vida. Descubra agora